domingo, 13 de setembro de 2009

Milhões para celebrar Kadhafi

A Líbia preparou uma festa de milhões para celebrar o líder líbio Muammar Kadhafi, com grande pompa para comemorar os 40 anos no poder em grande estilo. Muitos convidados não compareceram, mas o presidente da República Bolivariana da Venezuela, Hugo Chávez, estava lá.
Esteja onde estiver em Trípoli, ninguém escapa ao olhar do "guia dos povos". Por todo lado há imensos cartazes, telões de grandes dimensões, mosaicos e néons com a figura de Kadhafi. Com ou sem armas, com ou sem os densos óculos escuros, o estilo e a pose do coronel tem sempre o mesmo traço: olhos postos no infinito. Quarenta anos depois de ter chegado ao poder, até parece que o pai da revolução está pronto para ser o grande timoneiro por mais décadas.
Este rei dos reis da África, como ele próprio se define, ascendeu ao poder como o líder de uma revolução que, imagine-se, pretendeu apear o regime anterior monárquico. A diferença está entre uma monarquia e uma república monárquica, que já conta com 40 anos de poder com o mesmo líder, que parece não reconhecer o que significa a palavra democracia e o que ela implica.
Para além do passado não muito longínquo de apoio ao terrorismo, os direitos, liberdades e garantias de seu povo parecem coisas desconhecidas por aqueles lados. Ademais, existe uma diplomacia de países tidos como democráticos, que insiste em fazer prevalecerem os interesses à margem de outra diplomacia: a dos ideais e valores humanistas.
Kadhafi colocou a turma numa saia justa, pois vem revelando o embaraço das nações européias, preocupadas em normalizar relações com uma Líbia rica em petróleo, mas incomodadas em demonstrar sua proximidade com um ex-pária da comunidade internacional.
Podemos destacar aqui apenas três episódios do extenso rol de atividades terroristas de Kadhafi. Foi o financiador do "Movimento Setembro Negro", que perpetrou o massacre em Munique, nos Jogos Olímpicos de 1972. Kadhafi também está ligado ao ataque ao voo da Pan American sobre Lockerbie, na Escócia, em 1988, (com 270 mortos), recusando-se a entregar os dois terroristas que colocaram a bomba no avião. Está ligado ao atentado contra um avião francês, voo 772 UTA, em 1989, (com 170 mortos).
As celebrações foram realizadas em meio a uma polêmica, após as críticas suscitadas pela recepção triunfal de Abdelbaset Ali Mohamed al-Megrahi, condenado pelo atentado de Lockerbie e libertado pela Escócia por motivos médicos - ele é portador de um câncer em fase terminal. O ministro britânico da Justiça, Jack Straw, desmentiu reportagem do "Sunday Times" segundo a qual Londres negociou a libertação do líbio em troca de fornecimento de petróleo.
Já se percebeu: num país rico em petróleo e gás natural, dinheiro não falta. Mas tanto espetáculo para quem? Em primeiro lugar, para consumo doméstico. Kadhafi quer sedimentar a sua posição interna. Mais do que isso, quer afirmar a Líbia no plano regional, ao mesmo tempo em que tenta "passar" para o mundo uma imagem do país na arena internacional.
Dias antes da cerimônia, havia ainda muita confusão sobre a participação de dirigentes ocidentais; com rumores, anúncios e desmentidos se sucedendo. Trípoli afirmou que o presidente Nocolas Sarkozy e o presidente e primeiro-ministro russos, Dimitri Medvedev e Vladimir Putin, eram esperados na cerimônia. Mas as assessorias logo desmentiram. O mesmo aconteceu com o casal real espanhol, que teve a participação anunciada inicialmente pelos líbios.
A Líbia ocupa a presidência rotativa da União Africana e é membro não permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Kadhafi acusa o Conselho de Segurança de ser uma ditadura (que tal?) que impõe aos restantes Estados-membros a sua visão do mundo. O líder líbio exigiu a atribuição de mais competência à Assembléia Geral.
A ONU "é o parlamento do mundo e todas as nações deveriam estar representadas, mas nem todas têm poder". Por isso, quando "meia dúzia de pessoas decidem o futuro do mundo, uns reagem com palavras, outros com explosivos e outro com Kamikazes". Kadhafi não perde a pose, continua o mesmo, um ditadorzinho de terceira.

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SERGIO BARRA é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com

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