quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Dever de fiscalizar obras


O fato é notório: a geografia predial de Belém está passando por uma acelerada transformação. Da noite para o dia, a paisagem se verticaliza diante dos nossos olhos. Sem ainda compreender bem o fator econômico propulsor desse ritmo, ficamos nos perguntando se essa produção febril vem acompanhada do dever de fiscalizar, a cargo de determinados órgãos públicos. Perguntamos aqui se o Crea e a Prefeitura estão devidamente aparelhados para dar suporte a esse mundo de arranha-céus que se ergue em Belém.
O jornalista Jorge Calderaro, que mora ao lado do edifício Blumenau, agora em risco de desabamento na Três de Maio, enfrenta uma longa batalha judicial com a construtora desse prédio. Em sua página na internet (www.acordapara.com.br), ele expõe itens que não teriam sido observados, inclusive a distância mínima de 1,5 metro entre as construções, o que a legislação exige.
Na edição de domingo deste jornal, lemos também o depoimento de um morador prejudicado com a construção do edifício que desabou no dia 29. Segundo ele, dois dias antes da tragédia, a Justiça negou-lhe o direito de perícia em seu imóvel. Perícia que agora se impõe, pois o prédio impugnado já veio abaixo, não suportando seu próprio peso, muito menos a carga da moradia de sessenta famílias.
Não obstante a responsabilidade civil dos construtores - quando isto fica provado -, o Estado deve ser demandado também, seja em nível federal, estadual ou municipal. E deve porque ao Poder Público cabe o dever de fiscalizar, de adentrar onde pessoas comuns não adentram, de periciar, de aferir a qualificação técnica de profissionais, de registrar a obra, de embargar, de exercer o posto de atalaia em prol da coletividade.
Ao que me parece, não temos desses órgãos fiscalizadores o devido serviço. A alguns metros da casa de um amigo, começaram a construção de um enorme depósito. Veio a primeira laje, a segunda, a terceira, a quinta. Preocupado com a segurança de todos, ele procurou a Secretaria de Obras da Prefeitura para se informar a respeito. Querem saber o resultado? Não houve nenhuma providência!
Esse ritmo louco de construção em Belém tem-se transformado num inferno para muita gente. Pessoas de bem, que moram em suas casas há décadas, de uma hora para outra, passaram a ser perturbadas, adoecem pelo abuso dos que constroem ao arrepio da lei. Adoecem porque não encontram no poder público o devido amparo, na qualidade de cidadãos honrados que pagam seus tributos.
Não é possível que Belém continue sendo a capital do descaso público. De políticos ausentes. De fiscais que não fiscalizam. Do lugar onde manda quem tem dinheiro e influência, ainda que isto represente a morte e a desgraça financeira de pessoas que investem suas economias no sonho de morar bem. Não é possível que a cidade continue se esticando para cima sem ordem, sem a segurança da moderna engenharia, sem o olhar sério de quem deve fiscalizar. Não é possível!
A acelerada edificação de Belém exige um aparelhamento melhor do Estado. Os órgãos que exercem o poder de fiscalizar precisam ser modernizados, contar com mais profissionais, infraestrutura suficiente para atender à demanda. Se não têm isto, o ente público deve ser responsabilizado. Se têm, mas falham no atendimento, a responsabilidade persiste.
Belém está cansada de ser manchete de desgraças. É curra pública de menores nas cadeias, é mortandade infantil na Santa Casa, é agora a queda de um prédio de 34 andares. Não dá para seguir assim! Está na hora de nossas autoridades acordarem. Tem muita coisa errada acontecendo!

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RUI RAIOL é escritor (www.ruiraiol.com.br)

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