terça-feira, 24 de novembro de 2009

O pária entre nós

Por SÉRGIO MALBERGIER

Meu bisavô, inquieto com o antissemitismo e a pobreza, deixou sua pequena cidade do sul da Polônia rumo à América no início do século passado. Como muitos outros patrícios, arrumou um emprego em Nova York, numa fábrica de roupas.
Judeu religioso, porém, não aceitou trabalhar aos sábados, dia de descanso do judaísmo, e voltou para a Polônia.
"Voltou pra Hitler matar", repetia sempre minha avó Pessel (Paulina), no jardim da casa de Niterói, onde contava e recontava essa história dezenas de vezes numa tristeza sem fim.
Meu bisavô é o barbudo da foto nesta página, minha avó, a menor das duas meninas de pé. Tirando as duas, a irmã no colo e o filho, que tiveram a sorte de fugir da Europa antes da barbárie nazista, os outros retratados foram mortos nos campos de extermínio alemães durante a Segunda Guerra Mundial (1939-45).
Dói imaginar o que minha avó (se estivesse viva) sentiria se visse o país que lhe deu abrigo e onde criou com a alegria que lhe restou filhos, netos e bisnetos estender o tapete vermelho ao ditador iraniano Mahmoud Ahmadinejad, pária internacional que nega e promove a negação do Holocausto (o extermínio de 6 milhões de judeus indefesos pela Alemanha nazista), uma negação da própria história da humanidade e, numa escala próxima, da minha avó e de seu imenso sofrimento.
Dela, meu, de dezenas de milhares de brasileiros judeus e de milhões de brasileiros de outras religiões que se compadecem com as atrocidades nazistas e também com as atrocidades da teocracia islâmica iraniana contra seus próprios cidadãos.
O presidente Lula e sua diplomacia são no mínimo ingênuos ao argumentar que a visita de Ahmadinejad elevará a projeção da diplomacia brasileira.
O pária de Teerã é barrado nas capitais ocidentais onde se pratica política externa responsável dada a sua extensa ficha criminal: tortura e morte de centenas de opositores do regime; vencedor de eleições contestadas (provavelmente roubadas), cujos protestos oposicionistas, reprimidos a balas, Lula chamou irresponsavelmente de briga de torcidas; promoção do terrorismo internacional; opressão sangrenta a minorias religiosas; perseguição de homossexuais (executados em praça pública) e de partidos políticos, especialmente os de esquerda.
Mas o governo Lula, mal aconselhado pela banda cada vez mais aloprada que comanda sua política externa, argumenta que dar honras de Estado e palanque a esse opressor, apoiador de terroristas e negador do mal absoluto promovido pelos nazistas, pode fazer com que Ahmadinejad modere sua posição.
Primeiro, os aloprados externos de Lula mentiram ao dizer que Washington apoiava sua intermediação com o Irã para tentar fazer com que o país abandone seu programa nuclear clandestino e ilegal.
Os EUA, na verdade, e as outras potências ocidentais legitimamente preocupadas com a perspectiva de o beligerante regime iraniano (que ameaça destruir Israel e busca os meios, nucleares, para esse novo Holocausto) obter a bomba atômica, consideram a visita apenas uma ação legitimadora do regime iraniano.
E o apelo de Lula para que o mundo negocie com o Irã na verdade já está sendo praticado desde que Obama assumiu a Casa Branca. As negociações, conduzidas com EUA, China, Reino Unido, Rússia, França e Alemanha, não vão a lugar nenhum justamente porque Teerã quer a bomba atômica, e só Lula e o Itamaraty fingem não perceber.
No Ocidente, Ahmadinejad só é recebido pelo neocaudilho Hugo Chávez e seus regimes satélites. Barrado alhures, busca alianças na América do Sul e onde o recebam.
O que Ahmadinejad tem a ganhar com a visita ao Brasil está claro para todos: 1) Legitimidade de uma potência emergente que ainda não sabe direito o que fazer desse novo poder internacional conquistado, sobretudo, por sua economia pujante e também pela liderança e o carisma do próprio Lula. 2) Um palanque precioso para discorrer livre e cinicamente sobre suas intenções "pacíficas" e "humanitárias", que na verdade são exatamente o contrário. E ainda bater em aliados históricos do Brasil, como os EUA.
Já o Brasil só tem a perder na formação de sua imagem global de país tolerante, defensor dos direitos humanos e da democracia.
Minha avó hoje não é só uma fotografia amarelada como a que acompanha este texto. É uma parte grande em mim, que chora de tristeza ao ver o país que a abrigou e me pariu estender o tapete vermelho a um ditador que nega o maior sofrimento da vida dela e de milhões de pessoas e a maior iniquidade cometida pela humanidade.
Lula manchou o Brasil ao receber Ahmadinejad e me deixa com vergonha de ser brasileiro.

E ainda tem o pior
E se já não bastasse o apoio deslavado ao iraniano, o governo brasileiro ainda viu necessidade de retaliar a liderança judaica brasileira que, corajosamente, protestou em público contra a visita do déspota, deixando de convidá-la a almoço com o presidente de Israel, Shimon Peres, durante sua recente visita ao Brasil.
Para o governo Lula e seus assessores, a comunidade judaica deveria ficar calada enquanto se tripudia sobre sua memória. O que não é nada democrático.

4 comentários:

vanessa disse...

É triste pensar que um país como o Brasil que se diz liberal deixa uma pessoa desta pisar em nosso solo.
Certo que pela nossa imagem internacional de ouvir sempre o que os outros tem a dizer é comum. Mas o que de bom podemos esperar de um lider que não ouvi o que os outros tem a dizer e só olha para seu ideial? Não sei no que o senhor Luiz Inacio pensava quando convidou este homem para cá.
Em nossas diplomacias ele jamais ajudara, pelo contrario só prejudicara nossa imagem. Que apesar de não querermos dependemos em parte dos EUA (no meu ponto de vista) e isso nos rebaixa perante eles...enfraquecendo nossos poderes e fechando mais portas em nossa jornada. Como alguêm no mundo aceitara um lider que da ouvidos a um insano como o Ahmadinejad.

Sou só um jovem independente de religiões, mas que sabe ouvir e respeitar o ponto de vista de cada uma. Não sou ateo. Só estou aberto a conhecimentos novos da historia de nossos povos em geral.

Anônimo disse...

Mas também, PB, o que se pode esperar de um presidente que afirma que, se o mundo fosse quadrado, não haveria aquecimento global? E que, no caso específico do Irã, que a repressão ao povo nas ruas de Teerã não passou de um casinho menor, algo como uma briga de torcidas?

O articulista acerta quando diz que o Brasil não sabe o que fazer com sua liderança internacional. Aliás, sabe, sim - alia-se aos inimigos dos EUA na tola expectativa de liderá-los na construção de uma nova ordem mundial.
Mas, pergunto, dá para construir uma nova ordem mundial tendo como aliados Hugo Chávez, Robert Mugabe e esse governante maluco do Irã?

Eu, hein!! Bato na madeira três vezes - toc, toc, toc!!!

Anônimo disse...

Cara fico Passado com tanta mediocridade.EUA,aliado histórico ?
Não seria explorador histórico.
Os europeus tem um apreço filho da mãe pelos africanos.latinos,asiatics etc.Preconceito Velado Velho. Nazismo Puro.
Tu quer ler uma Coisa Os polacos odeiam negros.os alemães idem.
Todos adoram os brasileiros: Para explorar; turismo sexual ; biopiratear...etc.
Então esse ódio se espalhou, chegou até os extremistas. Eles por "natureza" São do jeito que são. Imagina ser escrachado,e tudo que é ado pela comunidade europeia. Ai mano é bala trocada. todos morrem e acabam no Inferno.
Quanto a politica externa, nós recebemos aqui o melhor e o pior dos Governantes Mundiais. Por que não ao Presidente do Irã ?
Reagan,Bush "filho". De Goulle que ainda tirou sarro,entre outras "Sumidades".
Eu também fiquei passado quando li uma entrevista desse "louco" Iraniano. Mas independente dele o 'Povo' Iraniano merece respeito. E ele é o Presidente do Irã, assim como Lula é o presidente do Brasil.

vanessa disse...

Bem, por mais que seja de por interesse em nossa biodiversidade, nossas mulheres. Não deixa de ser um aliado... Todos merecem respeito eu concordo...mas darmos respeito a um LIDER que não respeita os outros?? é dificil...não vejo diplomacia a quem não ouve os outros.