domingo, 22 de março de 2009
Faltou sabedoria
A atitude do arcebispo de Olinda e Recife, dom José Cardoso Sobrinho, ao excomungar em nome da Igreja, a mãe e a equipe médica que realizou o aborto da menina de 9 anos, portadora de gestação gemelar de 15 semanas e que fora violentada pelo padrasto em Alagoinhas (PE), repercutiu não só em solo paraense, como obteve repercussão internacional. O padrasto confessou à polícia ter abusado também da enteada mais velha - deficiente física de 14 anos - está preso e foi deixado de fora da condenação do bispo.
Infelizmente, é raro o dia em que o jornal não registra miséria parecida aos crescentes casos de estupro e pedofilia no noticiário. Nesse caso em particular, o aborto foi feito na Maternidade Cisam, vinculada à Universidade de Pernambuco. A Igreja Católica tentou impedir o aborto. "Os fins não justificam os meios, e a lei humana contraria a lei de Deus. Devemos salvar vidas", disse o arcebispo em entrevista ao Jornal do Commercio.
O bispo Cardoso excomungou quem participou e apoiou o aborto e o advogado da arquidiocese ameaçava denunciar a mãe da garota por homicídio. O médico que realizou o procedimento, Olímpio de Moraes, rebateu: "Ainda bem que vivemos num Estado laico e nossa Constituição não é a Bíblia". Todo médico sabe perfeitamente que uma criança de 9 anos, gestante de gêmeos, oferecia riscos, pois não tem todos os órgãos formados, principalmente sua estrutura óssea, que ainda não está adequada para suportar um parto.
Sabe-se que a excomunhão é uma penalidade aplicada aos fiéis que cometerem grave delito religioso. Ela é adequada aos casos de aborto, mas não se aplica a quem comete o estupro. Na realidade, os católicos vivem desafios. Na prática, a doutrina é outra. O que se tem observado é que cada vez mais católicos adotam comportamentos contrários às leis da Igreja. É uma rebeldia que preocupava já nos idos de 1980 por bispos reunidos em Roma, ao detectar "uma perigosa defasagem entre o que o magistério diz e o que grande parte do povo cristão pensa e vive".
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“Todo médico sabe perfeitamente que uma criança de 9 anos, gestante de gêmeos, oferecia riscos, pois não tem todos os órgãos formados, principalmente sua estrutura óssea, que ainda não está adequada para suportar um parto.”
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Estudiosos em Ciências da Religião analisaram o ato da excomunhão à luz da encíclica de João XXIII Mater et Magistra (Mãe e Mestra). "O ato esquece o estado de necessidade previsto pelo Direito Canônico e as circunstâncias dramáticas do caso em si". Esse deveria ser o critério pastoral primeiro para uma atitude de um bispo enquanto homem público.
Sabe-se pela mídia que a Igreja Católica recuou em relação à excomunhão da mãe da menina de 9 anos estuprada pelo padrasto em Pernambuco e grávida de gêmeos. A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) anunciou na quinta-feira, 12, que ninguém foi excomungado. "Na verdade, o arcebispo não excomungou ninguém. Ele disse que esse tipo de ato traz consigo tal possibilidade e fez isso movido por sua sensibilidade. Às vezes, a pena da excomunhão é colocada para chamar a atenção não só da pessoa, mas da comunidade eclesial da gravidade do ato" afirmou o presidente da entidade, dom Geraldo Lyrio Rocha.
Na Igreja Católica, não há como negar, existe uma clara e nítida divisão entre a ala conservadora e a progressista. Mas, quando a solução é respaldada no conhecimento científico e na Ética, não há lugar para discussões inúteis ou polêmicas desnecessárias. Todavia, podem abrir espaço para diálogos fecundos, sem a necessidade de escantear assuntos que já deveriam começar a ser tratados mais seriamente como: a Aids, o uso de preservativos, o homossexualismo, o celibato, células tronco e a situação dos divorciados.
A complexidade do fato exigia providência imediata. Neste caso, a decisão da mãe foi a mais prudente. O aborto seria inevitável, pois o caso estava previsto nos dois incisos do artigo 128 do Código Penal, que dão permissão ao aborto: quando a gestante corre risco de morte e quando há estupro. O procedimento da equipe médica foi corretíssimo.
Aqui mesmo, no Espaço Aberto, foi postado no domingo, 15, "[...] Antes de pensar em excomunhões, seria necessário e urgente salvaguardar sua vida inocente, devolvendo a ela um nível de humanidade", disse monsenhor Salvatore Rino Fisichela, presidente da Pontifícia Academia para a Vida, em artigo publicado pelo jornal vaticano L‘Osservatore Romano, no qual reconhece que não era necessário excomungar.
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SERGIO BARRA é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com
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3 comentários:
Poque esse bispo não vem até Belém e inclui na sua lista o Dr. Seffer, o Dr. Duciomar e tantos outros que fazem muito mais mal a sociedade do que o ato praticado para salvar um vida...
Ricardo Charone
Espaço,
É por causa de artigos como este das "gêmeas...", que vou, e recomendo, na noite de autógrafos do Sérgio Barra, dia 31/03 na sede social da AP.Imperdivel. Sérgio Noronha.
É verdade, Sérgio.
O Sergio, o Barra, merece toda a nossa distinção.
Vamos lá.
Abs.
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