domingo, 13 de julho de 2008

Uso abusivo de algemas fere a lei

Sob o título acima, Luiz Flávio Borges D'Urso escreveu o seguinte artigo, publicado na Folha de S.Paulo:

-----------------------------------

TODA OPERAÇÃO policial ou militar deve se restringir aos ditames da lei -constitucional ou infraconstitucional-, evitando lesões aos direitos e às garantias dos cidadãos que estejam na condição de suspeitos ou acusados. Todos são amparados pelo princípio constitucional da presunção de inocência e devem ter sua dignidade preservada.
As recentes prisões pela Polícia Federal do banqueiro Daniel Dantas, do investidor Naji Nahas e do ex-prefeito Celso Pitta reabrem a discussão sobre a execração pública à qual os suspeitos são submetidos neste país.
Não se contesta o papel que a Polícia Federal tem dentro da democracia, principalmente no combate à corrupção. O que se contesta são os excessos que permeiam os métodos empregados por agentes públicos. O abusivo -e meramente espetaculoso- uso de algemas durante o cumprimento dos mandados de prisão tem se cristalizado como regra e, na maioria das vezes, se mostra desnecessário.
Lamentavelmente, estamos assistindo também à banalização da decretação de prisões processuais. A comprovação disso é a costumeira revogação dessas prisões quando se recorre aos tribunais superiores. O artigo 1º da Constituição Cidadã de 1988, que está completando 20 anos, proclama que a República brasileira é um Estado democrático de Direito, e não um Estado policial. Assim, a dignidade do cidadão deve ser inteiramente respeitada, como determina o artigo 5º, inciso III, da Constituição. Por isso, devemos estar sempre alertas diante das arbitrariedades perpetradas por policiais contra "a", "b" ou "c", impondo constrangimentos e humilhações desnecessários.
São demagógicos e pífios quaisquer discursos em defesa da utilização indiscriminada de algemas, trazendo a questão para um contexto de luta de classes, na qual o pobre pode ser algemado, e o rico, jamais.
Não é nada disso. Nem o pobre, nem o rico, nem o negro, nem o branco, nem o amarelo, nem o homem, nem a mulher podem ser algemados exclusivamente para sua execração pública.
O uso indiscriminado, e quase sempre vexatório, de algemas constitui um excesso, uma punição infundada que foge aos limites da lei brasileira e serve apenas para "espetacularizar" a diligência policial, conquistar visibilidade e humilhar o cidadão, que, embora detido, deve ter sua dignidade preservada.
Se já está detido, significa que foi alcançado pelos tentáculos policiais do Estado. Logo, este tem o dever de zelar pela sua integridade física e moral.
O Código de Processo Penal, em seu artigo 284, estabelece que "não será permitido o emprego de força, salvo a indispensável no caso de resistência ou de tentativa de fuga do preso". E, no artigo 292, esclarece que somente no caso em que houver resistência à prisão em flagrante ou determinada por autoridade competente os executores da ordem de prisão podem sacar desse meio para vencer a resistência.
O código é muito claro, mas muitas vezes violado pela não-observância dos seus primados. Por sua vez, o Código de Processo Penal Militar se mostra ainda mais explícito. No artigo 234, parágrafo 1º, estabelece que o emprego de algemas deve ser evitado, desde que não haja perigo de fuga ou de agressão da parte do preso.
Portanto, é preciso definir balizas para as condutas dos agentes policiais do Estado por esses dois códigos, uma vez que o artigo 199 da Lei de Execução Penal (lei 7.210/84) prevê que o emprego de algemas deverá ser disciplinado por decreto federal, fato que ainda não ocorreu passados 24 anos da promulgação da legislação.
Ainda é preciso destacar que, quando o agente do Estado não cumpre o que estabelecem as normas jurídicas nacionais e os tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, o abuso -inclusive na utilização de algemas- deve, em tese, constituir crime.
Está previsto na Lei de Abuso de Autoridade (lei 4.898/65), artigo 4º, que submeter pessoa sob sua guarda ou custódia a vexame ou a constrangimento não autorizado em lei pode levar o seu autor às sanções administrativa, civis e penais. Ou seja, normas nós temos muitas.
Agora, precisamos colocá-las em prática em nome do fortalecimento do Estado democrático de Direito.

----------------------------------
LUIZ FLÁVIO BORGES D'URSO 48, advogado criminalista, mestre e doutor em direito penal pela USP, é o presidente da OAB-SP (seccional paulista do Ordem dos Advogados do Brasil).

2 comentários:

Anônimo disse...

defendem essa nova lei, apenas os que não imaginam a situação de quem está em contato direto com os suspeitos/detentos. Por que, quem vive esse dia a dia, sabe como é. Vide o que ocorreu hj no Rj, onde um PM morreu após um suspeito se roubar sua arma e alvejá-lo com 3 tiros.
isso, não usemos mais algemas, vamos lá...

Unknown disse...

Pelo amor de Deus... É lógico que TODO o preso DEVE ser algemado, seja Rico, Pobre, Preto, branco, azul, amarelo, etc... É uma questão de segurança para o Polical, Sociedade e o próprio preso. A reação de um preso é imprevisível, deve ser regra sim o uso da algema. Vc pode muito bem prender um traficante e o conduzir sem reação alguma e ao mesmo temo prender um playboy rico e o mesmo ofecer uma reação a prisão. Já chega desse papo idiota protegendo bandido.