quinta-feira, 6 de março de 2008

O fim do quinto constitucional nos tribunais



Recente recusa pelo STJ de lista sêxtupla, encaminhada pela OAB, indicando membros da classe dos advogados para nomeação ao cargo de ministro daquela Corte, reacendeu velha discussão acerca do chamado "quinto constitucional".
O "quinto constitucional" ou "acesso lateral" ao Poder Judiciário é sistema que remonta ao Estado Novo da década de 30, estabelecido por Getúlio Vargas, mantido até a Constituição atual no art. 94, que prevê que 20% das vagas dos tribunais brasileiros sejam preenchidas por membros do Ministério Público ou por advogados, sem a necessidade de concurso para o cargo, após elaboração de listas sêxtuplas, encaminhadas aos tribunais, que, por sua vez, encaminham lista tríplice ao chefe do Executivo, para final escolha e nomeação de um dos candidatos.
A composição dos tribunais do Poder Judiciário brasileiro, portanto, se faz por duas vias: a da promoção dos magistrados de carreira, que nela ingressam através do critério objetivo do concurso público de provas e títulos, e a do já mencionado quinto constitucional.
O sistema existente, contudo, se mostra anacrônico por diversas razões. De início, entre as garantias da magistratura está a independência, significando que o juiz, no exercício de suas funções, deve se preservar imune a injunções externas, inclusive de ordem política.
O candidato a juiz pelo quinto constitucional, contudo, precisa necessariamente submeter sua candidatura aos seus pares, ao tribunal que pretende compor e, por fim, ao chefe do Executivo, em verdadeira via crucis política, exercício que se mostra no mínimo desconfortável, ante a necessária postura independente da futura função judicante.
A existência do quinto, ademais, pode enfraquecer a atuação profícua dos membros do MP e da advocacia, na medida em que a perspectiva próxima de acesso a um tribunal pode vir a arrefecer um espírito mais combativo no exercício independente daquelas funções, postura essencial ao ideal funcionamento da Justiça.
Outro aspecto a ser ressaltado refere-se ao fato de que, como qualquer trabalho humano, o exercício da magistratura não prescinde de especialização. O exercício da judicatura resulta da prática cotidiana, diuturna e permanente do árduo ato de decidir, da realização de audiências, do recebimento de partes e procuradores, disso resultando o amoldamento do espírito de imparcialidade, essencial ao magistrado. "O magistrado se faz com o tempo".
O juiz oriundo do quinto, ao contrário, teve, no mínimo, em face de exigência constitucional, dez anos de necessária militância parcial, seja no Ministério Público, seja na advocacia, não estando habituado às vicissitudes do ato de decidir, não se vislumbrando como, de uma ora para outra, pelo simples fato de passar a vestir uma toga, irá se despir da postura parcial de postulante para compreender, com a profundidade necessária, a postura imparcial do magistrado.
O sistema, ademais, é sujeito a subjetividades excessivas, na medida em que os critérios de escolha estabelecidos pelo Texto Constitucional, consistentes "no notório saber jurídico e na reputação ilibada" podem redundar em personalismo indesejável, em detrimento da capacitação para o exercício do cargo, ante a ausência de objetividade concreta para a real aferição daqueles fatores.
O quinto serve, ainda, como fator de desestímulo aos magistrados de carreira, que se vêem preteridos no acesso ao tribunal por membros oriundos do acesso lateral, desprezando-se anos de experiência e dedicação.
O argumento corrente, de que a figura do quinto serve para o arejamento da carreira e seu controle externo, é vazio de conteúdo. O referido arejamento se dá com a exigência constitucional, trazida com a reforma do Judiciário, de que o candidato ao cargo de juiz possua, no mínimo, três anos de atividade jurídica, tendo o magistrado, portanto, necessariamente a visão do advogado militante ao ingressar na carreira.
Em ralação ao controle externo, após a Emenda Constitucional nº 45, passou a ser realizado pelo Conselho Nacional de Justiça, órgão em cuja composição se incluem advogados e membros do ministério público, tornando-se despicienda, portanto, a presença de representantes daquelas classes nos tribunais.
A existência do quinto significa, por fim, ingerência despropositada do Poder Executivo no âmbito do Poder Judiciário, em postura que resvala o sistema de independência entre os poderes. O Estado brasileiro ressente-se, portanto, da manutenção do quinto constitucional, que não encontra mais fundamento histórico ou ideológico, exigindo-se, atualmente, sua extirpação do Texto Constitucional, de forma a garantir a concretização de um modelo ideal de divisão dos poderes da República, fator essencial para a preservação da democracia.
Arthur Pinheiro Chaves é juiz federal substituto da 1ª Vara da Seção Judiciária do Pará

Um comentário:

Anônimo disse...

Muito bem juiz é de comentáros assim que precisamos, nas ruas , nos bares, nas igrejas, ABAIXO O QUINTO.
ADOREI, COPIEI E GUARDEI PARA EMPUNHAR QUANDO NECESSÁRIO.