segunda-feira, 9 de junho de 2014

Os pormenores da eleição



Quem perde a credibilidade por precipitação ou porque quer se utilizar de “sabedoria”, começa a perder o bonde da História. Quanta “gente boa” com suspeita de envolvimento em falcatruas. Por esse ângulo, se não fosse por falta de chuvas (no sudeste, principalmente), toda essa história continuaria submersa. Às vezes, a gente quer dar passagem e nos tornamos mais sensitivos. Essa turma acostumada com maracutaia não tem a democracia e a liberdade como um valor fundamental que deve ser preservado e difundido a qualquer custo. Antes de “democratas esclarecidos”, estão mais para “fascistas recauchutados”. Alguém duvida?
Os pormenores da eleição deste ano são de fato estranhas, a mais parada desde o fim da ditadura. Na verdade, há uma insatisfação generalizada no País. As manifestações (algumas nefastas) foram um fenômeno viral. Há, com certeza, o despertar de uma nova consciência política principalmente entre os mais jovens. Caminhamos um bom pedaço e a eleição de outubro está a apenas quatro meses. Como a Copa do Mundo vai durar 60 dias (o período de realização somada a uma quinzena antes e outra depois), chegaremos a ela antes de nos darmos conta. As últimas pesquisas têm mostrado que a presidente Dilma Rousseff já não tem aquela margem generosa que a separava dos outros candidatos oponentes. A presidente busca a reeleição e seu trabalho é escrutinado diariamente pelo eleitorado, que deve decidir se ela merece ou não permanecer no cargo.
Além da insatisfação, o mau humor do brasileiro piora alimentado por causas evidentes e pelo acirramento da disputa eleitoral. Quando a presidente vai a alguma inauguração e circula entre políticos, cartolas e operários, do lado de fora, como sempre, os protestos são inevitáveis. Lula recomenda à sucessora: “Fale mais”. A força do pessimismo viceja quanto ao futuro dos cidadãos, parte provida por más escolhas no âmbito administrativo do governo, parte pelas mudanças impostas pelos efeitos da crise mundial. Para citar algumas: O crescimento anual caiu pela metade em relação ao período de Lula; a inflação, na casa de mais de 6%, atingiu um patamar desconfortável; o encarecimento da vida das grandes cidades e a péssima qualidade dos serviços públicos aumentaram o descontentamento com a classe política e levaram à explosão das manifestações em junho do ano passado. O poder público foi inábil em produzir respostas à altura.
Na Copa das tropas e das empreiteiras. São fatos. Inegáveis. Nesse mesmo canteiro das insatisfações brota, porém, um tipo de pessimismo interessado, cínico até, segundo a situação, alimentada pelos boatos e pela tática eleitoral e econômica do “quanto pior, melhor”. Nesse tempo real, tem ficado mais difícil definir os limites entre os dois: fatos e boatos. Robustecidos por uma nova piora dos índices de confiança no governo e nas intenções de voto da presidente, a oposição partidária, o mercado financeiro e boa parte da mídia inflam o mau humor.
A gente lembra que antes das manifestações de junho de 2013 parecia que tudo ia muito bem, que nada havia de errado e que tudo corria às mil maravilhas; de repente tudo muda e estamos às vésperas dos últimos dias de Pompéia. Nessa avalanche de escândalos de corrupção por todos os lados, têm tirado o sono do governo. O baixo desempenho do governo deixa a população insegura: estão insatisfeitos com a situação de insegurança pública, repudiam os serviços de saúde, acham a educação ruim, desaprovam os sistemas de transportes, estão contra as preparações para a Copa do Mundo, revoltam-se com a pobreza, estão em desacordo com a situação da economia.
Interessante à questão dos limites do humor. Não me surpreende saber que o humor foi censurado, ou usado pelo próprio governo para transmitir um discurso político, pois nada é mais persuasivo do que o humor inteligente. Como toda forma de expressão, sempre carrega um discurso e cabe a nós interpretá-lo.

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SERGIO BARRA é médico e professor

Um comentário:

Anônimo disse...

"As pessoas estão contra as preparações para a copa do mundo" ? Contra as obras em aeroportos ? contra as obras em sistemas viários ? Contra a reforma das rodoviárias ? Contra os empregos gerados em rede hoteleira, bares, restaurantes , na construção civil, no comércio informal ? Contra a renda decorrente da venda de produtos vinculados à copa ? Contra os milhares de turistas que já chegaram e chegarão dispostos a gastar no país ? Nada pior que jogar fora a criança junto coma água do banho, critique-se sim erros e má fé em obras nos estádios, mas é impossível fechar os olhos aos efeitos benéficos de um evento deste porte. Foi correta a decisão de trazer a copa para Brasil, apesar da minoria do quanto pior melhor, que torceu pelo caos inexistente nos aeroportos, pelo racionamento de energia que não haverá. Vai ter copa sim e da boa.