quarta-feira, 7 de março de 2012

Crivella, o poder e as minhocas


Semana passada, o senador Marcelo Crivella tornou-se o novo ministro da Pesca. Sua elevação ao poder foi interpretada pela imprensa como uma tentativa do Planalto aproximar-se da bancada evangélica, o que foi desmentido por alguns de seus membros, porquanto essa base não teria sido consultada antes da escolha. Crivella, pastor do alto escalão da Igreja Universal, seria uma peça importante de Dilma em sua tentativa de lançar o petista Fernando Haddad à prefeitura de São Paulo. Só para lembrar, em sua passagem pelo Ministério da Educação, Haddad foi duramente criticado pelo seu kit anti-homofobia. Mas não é só isso. A indicação de Crivella revela outros aspectos, que consideramos aqui.
O primeiro aspecto diz mesmo respeito a essa propalada aproximação. Bem, se havia essa intenção, a aliança nasceu quebrada. Em política, nada acontece sem análise de perdas e ganhos. Reuniões a portas fechadas, telefonemas e jantares são itens indispensáveis na composição do poder. Não há decisão vertical do Executivo. A nomeação do alto escalão resulta de muito debate na faixa horizontal. Logo, se a nomeação veio como raio, inevitável que tenha ferido quem ficou de fora.
Por outro lado, não vejo como a nomeação de religiosos de altos escalões eclesiásticos possa ajudar o governo. Na verdade, igrejas precisam aprender muito com o Estado sobre o mínimo de transparência. Apesar da corrupção endêmica de algumas nações, igrejas nelas estabelecidas estão há anos-luz do avanço de cidadania alcançada por esses povos. Publicidade e moralidade são princípios que nunca adentraram algumas denominações religiosas. Isonomia, equidade e justiça são valores eclesiásticos teóricos, incapazes de impedir privilégios fiscais, prestação de contas fantasiosas e vultosas prebendas. Portanto, se a nomeação de Crivella vem para o governo se aproximar dos evangélicos, leia-se: aproximação de políticos. Políticos que, se bem pensassem - num Estado laico - rejeitariam esse título.
A escolha de Crivella, que, respondendo ao chamamento, afirmou não saber colocar “nem uma minhoca no anzol”, revela também quanto de técnico temos nessas nomeações do Executivo. Nada. Então, o que se pode esperar de quem nada domina do assunto? Nada. É certo que o ministro vai lidar com aspectos estatísticos, orçamentos, administração etc. Porém, nem a minhoca? É demais, não? O que Crivella conhece de nossa riqueza aquática? Sabe, por exemplo, o que é fauna acompanhante? Sabe quantos navios estrangeiros estão agora na costa do Amapá e do Maranhão dizimando nossos camarões, utilizando a melhor tecnologia para isso? Bem, não crucifiquemos o pastor. Crivella não é um caso único. Muitos ministros também carregam pastas vazias: sem minhoca, sem livro, sem estetoscópio, sem fertilizante. Só a pasta.
A nomeação súbita de Crivella, mais uma vez, expõe a instabilidade do governo Dilma. O alto escalão da presidenta virou uma espécie de carrossel: não para. Não para de rodar. A troca de lugares acontece em pleno giro. É como se um pai, observando o filho se divertir, de repente fosse surpreendido por outro rosto no assento. Cadê o ministro da Pesca? - pergunta o povo. Há pouquinho, estava ali... Rodou. Não deu tempo nem para gente gravar a cara. Também, o que importa - diríamos para nosso consolo - ele não sabia nem colocar “uma minhoca no anzol”!

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RUI RAIOL é escritor
www.ruiraiol.com.br

Um comentário:

Anônimo disse...

Excelente a nomeação desse ministro.
As demais instituições serão premiadas com o segundo escalão.