sábado, 10 de maio de 2008

Caso Nardoni - prisão indevida





Ao tratar sobre a prisão preventiva e o estado de inocência nesta coluna, na sexta-feira passada, afirmamos que a correta aplicação dos direitos fundamentais de caráter processual permite distinguir Estado de Direito de Estado Policial.
A prisão preventiva decretada contra o casal Nardoni mostra quanto o Brasil está inclinado para o Estado Policial, no qual tem razão quem vence, que difere do Estado Democrático de Direito, onde vence quem tem razão.
Segundo o jornal a "Folha de S.Paulo", o decreto prisional foi lavrado porque o juiz reconheceu a existência da materialidade do crime e indícios "concretos" da autoria delitiva. Concordamos com isso, exceção à expressão "concretos", porque dá ares definitivos para algo que ainda não ostenta tal condição.
Aquele magistrado também teria afirmado que, na sua visão, "a prisão processual dos acusados se mostra necessária para garantia da ordem pública, objetivando acautelar a credibilidade da Justiça em razão da gravidade e intensidade do dolo com que o crime descrito na denúncia foi praticado e a repercussão que o delito causou no meio social".
Mas qual credibilidade se reporta o juiz? A que condena antes de julgar? A que primeiro manda prender sem justificativa na lei para depois soltar?
A melhor trilha que o juiz deve seguir é a da norma interpretada, exclusivamente, com isenção de ânimo e sem se render à pressão das circunstâncias.
Por mais que haja prova da materialidade e indícios suficientes da autoria delitiva, a conferir estrutura para a condenação definitiva, isso não basta para decretar a custódia preventiva. Mesmo que flagrante o delito (que se dá quando ocorre a certeza visual do crime), se não preenchidos os requisitos para a custódia preventiva dispostos na lei (e não os criados pela mente do juiz, do promotor ou do delegado), todos temos o direito de responder ao processo em liberdade.
Ainda bem que em nosso sistema processual vige o direito de recurso, por meio do qual as partes inconformadas têm o sagrado direito de obter do Judiciário, por órgão superior àquele em que a decisão foi inicialmente proferida, nova manifestação a respeito da questão.
No Brasil, a cultura dominante é voltada para condenar pessoas antes mesmo que o juiz assim o faça, e o caso Nardoni infelizmente não fugiu a essa regra. Ao contrário, revelou a face do Estado Policial dentro do Poder de Estado (Judiciário) que deveria ser o primeiro a repudiá-lo de maneira exemplar.
Ninguém quer a impunidade. O culpado deve, sim, ser condenado, cumprir pena e se ressocializar. Não vamos proclamar nada que inverta a idéia da presunção de inocência. Contudo, a credibilidade da Justiça, que o juiz de maneira tão imperfeita disse que estaria assegurada com a prisão do casal, cairá por terra quando os tribunais superiores forem provocados a se manifestar a respeito. E ai é que virá a sensação da perda de confiabilidade, já que não haverá espaço para entender o porquê do prende-solta-prende-solta da Justiça.
Foi para evitar a materialização do ódio ou da vingança contra os que cometeram delitos, bem como para não permitir o surgimento de outros criminosos em decorrência da represália àqueles, que foi transferido para o Estado o poder de julgar. Entretanto, essa tarefa só vai inspirar profunda veneração por todos, e, conseqüente, dar credibilidade à Justiça, quando feita dentro dos parâmetros imposto pela norma.
Lembre-se que o Estado Policial garante apenas duas coisas ao indivíduo e que podem ser consideradas iguais: a primeira, que ele é culpado; a segunda, que ele não é inocente.

Roberto da Paixão Júnior é especialista em Direito do Estado
imcpaixao@superig.com.br

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