domingo, 5 de abril de 2009

Mau hábito insanável


Gastos sem controle, pagamentos de horas extras nas férias, uso de funcionários em benefício próprio - eis o retrato do Senado de José Sarney e de Renan Calheiros e sua tropa de choque. O Senado perde a compostura. A eleição do senador Sarney para a presidência do Congresso Nacional deu novo impulso à, digamos assim, carreira política de Renan. O senador, que renunciou à presidência da Casa em meio a uma avalanche de denúncias de corrupção, ressurgiu das cinzas - e, juntamente com sua turma do PMDB, está ocupando todos os espaços disponíveis de poder. Alguém dúvida?
O processo de severinização que o líder do PMDB, Calheiros, impõe ao Senado já é mais do que evidente. Líder da maior bancada da Casa, ele usa os instrumentos de poder recém-readquiridos com precisão cirúrgica para distribuir testas de ferro no comando de comissões por onde transitam interesses cruciais: Infraestrutura, Orçamento e Constituição e Justiça.
Só não é patente, por ora, a existência no Senado de homem ou mulher com coragem para pôr os pingos nos is com todos os efes e erres. Prepondera na Casa a consciência de que Renan não tem mais nada a perder, nome a zelar e nem imagem a preservar.
O Brasil é mesmo um País alheio ao meio. Aqui é bom deixar como está, para que tudo fique como antes. O País torna-se caricato e fantasticamente risível ou seria melhor chamá-lo fantasmagórico, com direito a castelo e figuras felinianas. A casa mais respeitosa da Corte, hoje plena de figuras caricatas, com um cenário interior de noite, de pesados amuletos entalhados que pendem e flutuam pelo salão às escuras, iluminado por velas que bruxuleiam e mais se parece com o ambiente lúgubre dos Alpes da Transilvânia.
É como andar na contramão do tempo. Cara, isso é muito nojento e bote nojento nisso e talvez ainda seja pouco. E ainda temos o agravante de que os amigos de José Sarney acrescentam a preocupação de que a associação reserve percalços que venham a impedi-lo de levar a bom termo o mandato de dois anos na presidência do Senado. Em certas ocasiões, é preciso olhar para fora e buscar termos de comparação entre a realidade brasileira e a do resto do mundo. O viés não é alentador, a turba não está nem aí. Negócio de limites da legalidade e da decência normalmente é com deputado ou senador. Mas desculpe, como tudo é farinha do mesmo saco, concordar não tem perigo.
O que o povo não aguenta mais é a sequencia de escândalos, da falta de escrúpulos e da canalhice que tomou conta do Congresso Nacional. A bandalheira não está na quantidade de diretores ou qualquer tipo de denominação para as atribuições que foram cometidas. Está nos gastos, e gastos com o nosso dinheirinho, com dinheiro público, do contribuinte para sustentar a luxúria "romana" e inadmissíveis privilégios que concede a seus funcionários.
No País dos escândalos, mais um vem à tona: o da construtora Camargo Corrêa, em que a Polícia Federal investiga suposto esquema entre empreiteira e partidos, deflagrada na quarta-feira, 25, abril passado, lançou estilhaços na cúpula da construtora, no Congresso Nacional e até na Federação das Indústrias de São Paulo, a Fiesp. Quatro diretores e duas secretárias da empreiteira e mais dois doleiros foram presos. São suspeitos de envolvimento num esquema que - diz a PF - começava com licitações fraudulentas e superfaturamento de obras públicas, passava por remessa ilegal de dólares, lavagem de dinheiro e terminava em doações ilícitas a partidos políticos. Segundo o Ministério Público Federal, a quadrilha desviou, desde janeiro de 2008, cerca de R$ 30 milhões. Em troca de propinas, políticos favoreciam negócios da empreiteira.
O juiz Fausto de Sanctis - o mesmo da Operação Satiagraha - assinalou trechos de escutas telefônicas que fazem "menção a divisão de valores, em tese, doados para partidos políticos". O relatório da PF cita PSDB, DEM, PPS, PDT, PP e PMDB. "Estamos diante de um repeteco do chamado mensalão, desta vez no lado oposto do espectro partidário" escreveu Luciano Martins Costa no Observatório da Imprensa.
Pois é, mais um escândalo típico que envolve caixa 2.
Valha-nos quem?

-------------------------------------------

Sergio Barra é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com

Nenhum comentário: