domingo, 16 de março de 2008

Vestígios do cotidiano


Há momentos mágicos de grande cansaço físico e intensa excitação motora, em que acredito já estar precisando de férias. Aí começam a surgir visões de um ajuntamento de pessoas conhecidas. Pensando bem, bastante escassas eram as razões que pudessem inclinar-me a descrever três episódios, em três tempos e num só texto. Tudo neste mundo é relativo e deve ser visto com os olhos da compreensão e da boa vontade. Portanto, tenhamos nossas queixas na conta das alucinações. Não sei exatamente por que me decidi e criei coragem. Provavelmente, um modo de libertar-me de numerosas e antigas obsessões. Concluindo, estou cheio de dúvidas.

1º Episódio
O senhor Luiz Inácio Lula da Silva parece esquecer que está investido no cargo de presidente da República e em determinados momentos, nos seus arroubos, resolve fazer confronto verbal com o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Marco Aurélio Mello, que também exerce as funções de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), venha ter repercussões entre os poderes, deflagrando uma crise. Não acredito, mesmo. Acho o presidente do TSE um homem ponderado, equilibrado e observo em suas alocuções que nada fez para que o presidente Lula, neste pequeno entrevero, desse o tom da veemência, a mesma que utilizava quando subia em caminhões no ABC paulista. Agora, o PT representa contra o presidente Marco Aurélio, que está no centro do ciclone de retaliações da agremiação partidária por ter criticado o governo. Observo atentamente quando um ministro do STF se manifesta, e entre estes o que mais fala é o presidente do TSE, com bom senso, inteligência e conhecimento de causa. Marco Aurélio diz que falou no âmbito do Tribunal.Pergunta-se: por que magistrados não podem falar? Por que o povo não pode saber de assuntos que são de seu interesse? O presidente se diz democrático, então por que silenciar o ministro? É bom que se saiba que ele nada fez de errado, defendeu claramente com sua postura de autoridade judiciária, com respaldo na legislação eleitoral em vigor. Seria bom se o presidente Lula saísse do palanque algum dia. Democracia é para ser exercitada.

2º Episódio
O barraco que o Nosso Guia e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso fazem questão de protagonizar já não é de hoje. Na primeira semana de março, os jornais noticiaram: "Governo cede e oposição ganha a presidência da mais nova Comissão Parlamentar de Inquérito, a dos cartões corporativos. Suspeita-se que houve acordo espúrio". Tudo isso com o pretexto de preservar o Nosso Guia e FHC. Fernando Henrique diz que não tem a mínima idéia sobre acordo algum. Ademais, a CPI dos cartões corporativos brotou no terreno fértil das denúncias de despesas indefensáveis de ministros e secretários para pagar contas de free shops, tapioquinhas e até aluguel de carro de luxo blindado, com motorista para passear em dias de folga. Tudo isso com o meu, o seu, o nosso dinheirinho. Além disso, não há interesse em apurar nada, e sim apagar o incêndio que uma CPI provoca. Não é segredo: "Todos os documentos pertinentes, deste e de governos anteriores, estão nas mãos do próprio governo. Bastaria investigar, denunciar, punir e pronto" disse seu antecessor. Nosso Guia tem uma embirração com seu inimigo número 1, que já começa a extrapolar, atingindo até outros poderes.

3º Episódio
O picadeiro armado no Aeroporto de Barajas, em Madri, na Espanha. Lá, armaram um circo, humilhando 30 brasileiros, alguns iam visitar aquele país da Península Ibérica, outros apenas iam fazer conexão para outros países. Enquanto o Itamaraty fica falando bonito para disfarçar o acontecido, a Polícia Federal, na semana passada, expulsou sete espanhóis no Aeroporto de Salvador; claro, foi uma forma de retaliação. A relação entre o tratamento dado aos espanhóis no Brasil e o que os brasileiros receberam na Espanha foi confirmada por integrantes do governo, no Itamaraty e no Palácio do Planalto. O Ministério das Relações Exteriores confirmou que, se a Espanha e outros países da União Européia não mudarem o tratamento dado aos viajantes brasileiros, o governo adotará as rigorosas regras de Schengen para aceitar a entrada de europeus no Brasil, usando o princípio da reciprocidade. É isso aí. Bateu, levou. Acorda Espanha, a Inquisição acabou. O Inquisidor-Geral Tomás de Torquemada é morto.

Sergio Barra é médico e professor

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