Feriadões costumam deixar redações de jornais em polvorosa.
Às vezes, a coisa fica tão vasqueira, a pauta fica tão deserta que bate nos editores aquela sensação de que não vai dar pra fechar a edição do dia seguinte.
Por isso é que, nessas ocasiões, dá-se relevância a tudo – ou a quase tudo. Não é nem preciso o homem morder o cachorro para a notícia ganhar as manchetes. Como não tem nada, até mesmo se o latido de um cachorro for um pouquinho mais forte, já emplaca um bom destaque na página. Sempre foi assim.
Pois foi assim também na última sexta-feira. Num jornal de Belém, a Editoria de Polícia era um Saara de ocorrências. Não pintava nada. Nem um assaltozinho sequer, nem um furto – daqueles básicos -, nem uma briga entre vizinhos alcoolizados. Nada. Era ligar para as delegacias de polícia e ouvir do investigador ou do delegado de plantão: “Por aqui, tudo calmo” – para a desolação do repórter e muito mais do editor, com seis páginas em branco por fechar.
Eis que na sexta-feira mesmo pintou uma matéria. Aliás, uma matéria não: era a ma-té-ria. Era a salvação da pátria. Era preciso investir nela com todas as forças.
E quem telefonou para a redação do jornal foi um de seus 25 editores de polícia, cara bonachão, vozeirão capaz de fazer cristal trincar-se apenas com um “bom dia”, sotaque carregado daquele baianês característico e inconfundível. E bom amigo, desses que quando o encontram vai logo perguntando: “Como vai sua mãezinha, meu amorzinho?” Assim é o editor.
Eram 23h30. O editor, que já saíra do jornal, encontrava-se num bar e soube que havia um corpo estendido no chão, às proximidades. Não contou conversa: preocupado com a possibilidade de que o veículo em que trabalha tomasse um “furo” dos concorrentes, levantou-se e foi ao local pessoalmente, para conferir se o presunto era mesmo um presunto.
E era. Ele tinha certeza que era. Como era um cadáver, passou a mão no telefone e ligou para a redação. A repórter de polícia atendeu:
- Minha filhinha, sou eu – disse o editor, o vozeirão mal disfarçando o prazer da notícia num final de noite, em pleno feriado. – Tem um cadáver estirado aqui perto.
- Mas é um corpo mesmo? – indagou a repórter.
- Claro que é, meu amorzinho. Claro que é. Estou a 20 metros do local. É um corpo, sim, tem muita gente. Tem até velas, mas até agora nada de polícia para isolar à área. Vem pra cá. O corpo está aqui às margens da rodovia Augusto Montenegro, em frente à invasão Carmelândia.
Repórter e fotógrafo se abalaram até o local. A jato.
Quando chegaram, estava lá o “corpo” - de forrado de jornal, manchado de molho de tomate (para simular o sangue) e velado por vários amigos, todos alcoolizados.
Não era um corpo. Ou era. Mas era o corpo de um Judas. Um Judas “em pessoa”, digamos assim. - Dona. Aqui no Carmelândia também malhamos o Judas! – provocou, diante da repórter e do fotógrafo, um dos gaiatos, um dos amigos do “morto”.
Pelo sim, pelo não, o registro fotográfico foi feito. E está aí em cima, na foto de Elivaldo Pamplona, para que não pensem que é invenção. Na foto, aparecem o Judas morto e seus amigos, que, como se vê, não parecem muito consternados.
Consternados ficaram repórter e fotógrafo, que voltaram para a modorra, para o insosso que é uma redação de jornal em noite de feriado.
E o editor? O editor, da mesa de bar, ligou depois para o jornal para confirmar o “furo”.
- Não era um corpo. Era um Judas malhado. Era só uma gozação dos gaiatos de lá do Carmelândia – respondeu a repórter.
- Pôxa, minha filhinha. Ainda bem. Então vou continuar a beber para festejar que era só um Judas. É preciso festejar, meu amozinho. A violência está horrível.
Às vezes, a coisa fica tão vasqueira, a pauta fica tão deserta que bate nos editores aquela sensação de que não vai dar pra fechar a edição do dia seguinte.
Por isso é que, nessas ocasiões, dá-se relevância a tudo – ou a quase tudo. Não é nem preciso o homem morder o cachorro para a notícia ganhar as manchetes. Como não tem nada, até mesmo se o latido de um cachorro for um pouquinho mais forte, já emplaca um bom destaque na página. Sempre foi assim.
Pois foi assim também na última sexta-feira. Num jornal de Belém, a Editoria de Polícia era um Saara de ocorrências. Não pintava nada. Nem um assaltozinho sequer, nem um furto – daqueles básicos -, nem uma briga entre vizinhos alcoolizados. Nada. Era ligar para as delegacias de polícia e ouvir do investigador ou do delegado de plantão: “Por aqui, tudo calmo” – para a desolação do repórter e muito mais do editor, com seis páginas em branco por fechar.
Eis que na sexta-feira mesmo pintou uma matéria. Aliás, uma matéria não: era a ma-té-ria. Era a salvação da pátria. Era preciso investir nela com todas as forças.
E quem telefonou para a redação do jornal foi um de seus 25 editores de polícia, cara bonachão, vozeirão capaz de fazer cristal trincar-se apenas com um “bom dia”, sotaque carregado daquele baianês característico e inconfundível. E bom amigo, desses que quando o encontram vai logo perguntando: “Como vai sua mãezinha, meu amorzinho?” Assim é o editor.
Eram 23h30. O editor, que já saíra do jornal, encontrava-se num bar e soube que havia um corpo estendido no chão, às proximidades. Não contou conversa: preocupado com a possibilidade de que o veículo em que trabalha tomasse um “furo” dos concorrentes, levantou-se e foi ao local pessoalmente, para conferir se o presunto era mesmo um presunto.
E era. Ele tinha certeza que era. Como era um cadáver, passou a mão no telefone e ligou para a redação. A repórter de polícia atendeu:
- Minha filhinha, sou eu – disse o editor, o vozeirão mal disfarçando o prazer da notícia num final de noite, em pleno feriado. – Tem um cadáver estirado aqui perto.
- Mas é um corpo mesmo? – indagou a repórter.
- Claro que é, meu amorzinho. Claro que é. Estou a 20 metros do local. É um corpo, sim, tem muita gente. Tem até velas, mas até agora nada de polícia para isolar à área. Vem pra cá. O corpo está aqui às margens da rodovia Augusto Montenegro, em frente à invasão Carmelândia.
Repórter e fotógrafo se abalaram até o local. A jato.
Quando chegaram, estava lá o “corpo” - de forrado de jornal, manchado de molho de tomate (para simular o sangue) e velado por vários amigos, todos alcoolizados.
Não era um corpo. Ou era. Mas era o corpo de um Judas. Um Judas “em pessoa”, digamos assim. - Dona. Aqui no Carmelândia também malhamos o Judas! – provocou, diante da repórter e do fotógrafo, um dos gaiatos, um dos amigos do “morto”.
Pelo sim, pelo não, o registro fotográfico foi feito. E está aí em cima, na foto de Elivaldo Pamplona, para que não pensem que é invenção. Na foto, aparecem o Judas morto e seus amigos, que, como se vê, não parecem muito consternados.
Consternados ficaram repórter e fotógrafo, que voltaram para a modorra, para o insosso que é uma redação de jornal em noite de feriado.
E o editor? O editor, da mesa de bar, ligou depois para o jornal para confirmar o “furo”.
- Não era um corpo. Era um Judas malhado. Era só uma gozação dos gaiatos de lá do Carmelândia – respondeu a repórter.
- Pôxa, minha filhinha. Ainda bem. Então vou continuar a beber para festejar que era só um Judas. É preciso festejar, meu amozinho. A violência está horrível.
Um comentário:
COMO SE DEFENDER DOS BANDIDOS
CONHECENDO A SUA LINGUAGAEM
Publicado pela Editora Protexto de Curtiba ( PR), já se encontra nas principais livrarias do País, o DICIONÁRIO LINGUAGEM MARGINAL, de autoria de Abinael Morais Leal, livro de termos e expressões correntes no submundo do crime. O autor, escritor consagrado e ex-policial militar, cataloga elementos da gíria usada na linguagem do dia-a-dia dos marginais e, como bom pesquisador, valendo-se ainda de outras fontes, habilmente os reúne numa obra destinada, pela sua natureza, a consultas de profissionais da área de combate ao crime – policiais, promotores, advogados, juízes, jornalistas, bem como estudantes de Direito e demais ciências sociais - e que pelo “engenho e arte”, propicia-nos uma leitura muito interessante, cujos verbetes vamos seguindo num fôlego, como se fosse um livro de crônicas leves e até hilariantes, embora sirva, também, de alerta aos indefesos, através do conhecimento do linguajar marginal contido no dicionário, que ao se debaterem com esses grupos poderão se esquivar ao detectar os seus códigos de linguagem para uma possível investida.
Contato: Tel (41) 3672-2612. Clique:http://www.protexto.com.br/autor.php?cod_autor=100
E-mails: leaniba@hotmail.com ou protexto@protexto.com.br
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