segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Emerge a semente


Observem com isenção e constatem se, nestes últimos cinco anos, a Europa vive uma onda de racismo e de ataques a emigrantes. Lembranças do período da ascensão do fascismo com governos estimulando agressões. Na realidade, existe hoje mais preconceito racial do que cinco anos atrás. Aflora a semente da xenofobia no continente europeu.
Na França, os confrontos na periferia de Paris em 2006 foram um prelúdio. Mas, em 2005, o encanador polonês virou o símbolo da mão-de-obra barata na campanha da esquerda contra a Carta Européia. São criticados desde a integração de seu país à União Européia.
Após serem discriminados anos a fio, os poloneses estão voltando para seu país por causa da crise econômica e de uma Polônia em melhor condição financeira. Hoje, as remessas que fazem aos seus familiares na Polônia são 30% inferiores às do período anterior à crise.
Notre-Dame de Lorette, abril de 2008: no cemitério militar próximo a Arras, norte da França, vândalos profanam 148 túmulos de soldados muçulmanos arregimentados nas então colônias francesas da Argélia e Tunísia durante a Primeira Guerra Mundial. A cabeça de um porco é pendurada em uma lápide de sepultura. Pesquisa realizada em novembro de 2005, pelo Institut CSA, revelou que um terço dos franceses se declara racista. Ainda segundo a mesma enquete, divulgada pelo diário "Le Monde", 63% dos cerca de mil entrevistados consideram que "certos comportamentos podem justificar reações racistas"; durma-se com um barulho desses.

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“Existe hoje mais preconceito racial do que cinco anos atrás. Aflora a semente da xenofobia no continente europeu.”
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Por motivo torpe, em Milão, setembro de 2008, região do norte da Itália: o jovem Abdul Wiliam Guibre, 19 anos, de Burkina Fasso, é morto a cacetadas pelos proprietários do bar onde trabalhava. Fausto e Daniele Cristofoli, pai e filho, suspeitaram que o rapaz estivesse roubando dinheiro. Pego em flagrante com um pacote de bolachas, o africano foi agredido até a morte pelos Cristofoli, que o chamaram de "negro sujo".
A que se deve essa onda de racismo, responsável por duas devastadoras guerras mundiais no século passado, ambas iniciadas neste continente? A globalização, que em tese iria tornar as economias desenvolvidas e emergentes mais iguais, provocou efeitos contrários.
O resultado é que uma nova leva de imigrantes empobrecidos invadiu a Europa, ao mesmo tempo que o continente atravessava um período de baixo crescimento e pequena geração de empregos. Os estrangeiros, antes bem-vindos em países como a Espanha, passaram a ser vistos como aqueles que vieram roubar o trabalho dos nativos.
As políticas antiimigratórias adotadas pela União Européia, e por diferentes líderes europeus, não ajudam a imagem do imigrante. E os discursos antiimigratórios e xenófobos de extremistas, como Jean-Marie Le Pen, que, ao liderar o Frente Nacional chegou ao segundo turno das eleições presidenciais de 2002, foram adotados por direitistas como o presidente francês Nicolas Sarkozy e até por líderes de centro-esquerda, como o premier britânico Gordon Brown.
Na França, por exemplo, são realizados testes de DNA em estrangeiros que aqui vêm viver com suas famílias. Mais: Sarkozy, filho de húngaro com uma judeo-grega, pretende neste ano expulsar 25 mil clandestinos. Leis para impedir a entrada de pessoas com baixa qualificação profissional têm sido reforçadas. Em busca da paz, quase 3 mil judeus deixaram a França e migraram para Israel em 2007, por causa das constantes agressões cometidas por neonazistas - novamente o ovo da serpente?
O premier italiano, Silvio Berlusconi, também aprecia os testes de DNA, mas só para os ciganos. Berlusconi alega que as impressões digitais dos "roma" (com inspiração na ideologia fascista dos anos 30) são necessárias para o recenseamento da população. Detalhe: os "roma" são legalmente reconhecidos como habitantes da União Européia.
Um negro italiano é uma novidade. O negro Guibre foi morto a cacetadas em Milão por ter "roubado" um saco de bolachas, um homem de Gana apanhou em Parma num confronto com a polícia, um chinês foi espancado por uma gangue de jovens em Roma, outros seis africanos foram assassinados pela Camorra. Para o ministro do Interior, Roberto Maroni, "foram casos isolados". Trata-se de uma de uma seqüência de eventos preocupantes, sim. E o mesmo vale para toda a Europa.

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SERGIO BARRA é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com

3 comentários:

Anônimo disse...

E no Brasil?. É mais facil migrar no Brasil ou na Europa?. E ter nacionalidade, onde é mais facil?. Os migrantes clandestinos sao melhor tratados no Brasil ou na Europa?. Onde o governo, os partidos, a midia e grande parte da populaçâo sempre usan a desculpa do estrangeiro pra falar mal de qualer coisa?.

Anônimo disse...

Caro anônimo,
Primeiro quero agradecer-lhe por ter lido o artigo. Seus questionamentos são pertinentes. Apenas acho que no Brasil é mais fácil migrar do que na Europa. Os próprios migrantes quando aqui chegam, não querem mais sair de nosso país e raros são os casos de repatriamento. No geral, acho o povo brasileiro mais receptivo do que o europeu. Ademais, aqui conseguem refazer
suas vidas e dar a volta por cima mais facilmente do que em situação contrária (vide os mais variados tipos de imigração feitas com sucesso encontrados em nosso país). Minha visão é humanista.
Contudo, sua opinião é válida.

Anônimo disse...

Eu discordo completamente de voçé. Migrar no Brasil pra trabalhar legalmente é hoje uma tarefa muito dificil. Na pratica grande parte de pedido de vistos nao sao aceitos pela PF. Por outro lado é vedada a legalização da estada de clandestino e de irregular ao contrario do que acontece na Europa. Igualmente ter nacionalidade no Brasil e muito mais dificil e demorado que na Europa.
Outro tema é o tratamento dispensado ao inmigrante irregular. Só o caso vergonhoso do tratamento que receven os bolivianos em Sao Paulo é muito pior que o que receben na Europa. A receptividade do povo brasileiro eu acho um mito, ainda que a nivel pessoal nao tenha queixa, o que eu tenho vivido é uma sociedade onde se utiliza a desculpa do "estrangeiro" pra demonizar qualquer coisa, isso por parte da midia, do governo e de grande parte da opiniâo publica. Issa presunta receptividade do brasileiro maior do que outras sociedades desapareceu faz muito tempo se é que alguma vez existiu. A verdade é que ser estrangeiro hoje no Brasil nao é nada fácil. Um exemplo, menor mas que é ilustrativo. No mes de agosto eu assisti uma propaganda das havaianas na qual um par de brasileiros ficavan bravos com um estrangeiro que simplesmente repetia o que eles dizian sobre os problemas do Brasil. Era uma propaganda totalmente xenofoba, o cara era fortemente criticado nao pelo que dizia mas sim pelo que era: estrangeiro. E essa propaganda era vehiculada a toda hora na TV. Eu achava inacreditavel, mas lembrava que a propaganda brasileira é uma das melhores do mundo. Eles simplesmente reflectem o que hoje sente grande parte da sociedade brasileira. Apavorante. O troco é que hoje pode se assistir num canal de TV europea uma propaganda na qual um cara tambem estrangeiro (tem até a mesma nacionalidade) sai criticando ao pais. Mas nesse caso o tratamento é totalmente positivo: a opiniâo do estrangeiro nao só e positiva é que pode observar com mais objetividade as coisas criticaveis. O estrangeiro e utilizado como exemplo e nao como pessoa a xingar. Eu tenho claro que é melhor.