segunda-feira, 12 de maio de 2014

Trágico e absurdo



Muitas vezes, a polícia que deve zelar pela vida do cidadão, peca sob o ângulo da razoabilidade. E isso tem um caráter residual muito forte. Mágoas vão se acumulando e um sentimento de revolta toma conta do cidadão comum. Estamos observando que muitas mortes são trágicas; como o princípio básico da segurança pública está corrompido pelo despreparo de seus agentes. As pessoas estão morrendo, uma parte sai ferida, numa troca de tiros em que não há dois lados. Matar, o ato mais extremo que alguém pode cometer numa sociedade civilizada, está sendo banalizado, é um risco assumido com indiferença cotidiana por homens que, por princípio profissional, deveriam zelar pela vida.
Você não pode competir com o sol. O outro lado também deve ser olhado. Agentes de segurança pública são expostos diuturnamente a um ambiente incerto e violento. Assistem às piores barbáries e são alvo permanente de bandidos. É responsabilidade do Estado evitar que esse ambiente hostil torne os policiais insensíveis e sejam vistos como brinquedos com defeito. Chega de muita conversa e improvisação. Conhecer a dor produzida por suas armas ajudaria os policiais brasileiros a pensar e dialogar mais, é muito mais produtivo deixar a violência como último recurso. O fogo cerrado a que são submetidos está limitada pela viseira de interesses e eles precisam reconquistar a confiança da população. E mais, muitas mortes precisam ser esclarecidas.
A arbitrariedade e a obsolescência da Justiça nacional vêm legitimando a prática da barbárie Brasil afora, posto que a sociedade, saturada de respostas atrasadas e incompletas, perdeu a confiança nos aparatos de segurança e nos códigos de Justiça da Nação. Desse modo, utilizando armas de preconceito, de intolerância e fazendo apologia à brutalidade, os “justiceiros” continuam a acreditar que a força seja o único e exclusivo meio de fazer justiça em pleno século XXI. Evidenciando mais tragédias e mais manobras.
Com intensidade, são tantas instâncias e tantos recursos são “necessários” que, a propósito desse famoso “vezo tardança”, passa a ser a geradora de prescrições das pretensões punitivas e executórias que entre muitos fatos, vamos recorrer a três que são recentes. Todos eles capazes de envergonhar, simultaneamente, a Têmis, deusa grega da Justiça, e, portanto, apta a intuir ter a Justiça criminal por meta não deixar impunes os crimes que incomodam a sociedade e não punir os inocentes.
O primeiro fato, ocorreu em 2 de outubro de 1992, na Casa de Detenção Professor Flaminio Favero, no bairro paulistano do Carandiru, com o massacre de 111 presos custodiados pelo Estado e rebelados naquela penitenciária. Após 21 anos, o Tribunal do Júri de São Paulo concluiu o julgamento do massacre do Carandiru, onde nenhum policial militar foi morto. De permeio, em setembro de 2006, o coronel Ubiratan Guimarães, comandante da ação foi assassinado em seu apartamento. Apenas a etapa inicial do processo restou concluída nesses 21 anos. O segundo fato, vale lembrar: só neste final de abril, depois de seis anos da tragédia com 199 passageiros mortos, a justiça federal de primeiro grau deverá apreciar, no caso do Voo 3054 da TAM, as eventuais responsabilidades. E, finalmente, o mensalão do DEM? Vai? A 7ª Vara Criminal de Brasília aceitou a denúncia do Ministério Público do Distrito Federal contra os ex-governadores José Roberto Arruda e Paulo Octávio, além de outros 17 acusados de participação nos crimes do chamado “mensalão do DEM”. A promotoria pede a condenação dos réus por corrupção, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. E a devolução de R$ 739,5 milhões aos cofres públicos.
Pois é, o grau de insatisfação dos brasileiros começou a ser escancarado em julho do ano passado, quando milhares de pessoas foram às ruas gritar contra as coisas erradas do País. Mas tudo não aconteceu de repente. De certo modo, o desencanto, ter a ver com o despertar dos brasileiros.

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SERGIO BARRA é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com

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