Sachsenhausen assusta.
Mais do que isso, Sachsenhausen aterroriza.
E por que visitantes - aos milhares - passam por lá todos os dias?
Porque o reencontro com as tintas vivas e os ecos ainda bem presentes de histórias horrorosas podem nos ajudar a rejeitar com mais vigor os princípios, valores e condições que levaram a hecatombes.
Mas essa pretensão, creiam, não se faz impunemente para quem visita Sachsenhauser.
Há uma semana, o poster visitou este local que se encontra a cerca de 40 minutos do centro de Berlim, acessível facilmente de metrô, na linha que tem ponto final a bela, aprazível e sossegada cidadezinha de Oranienburg, que curiosamente contrasta com um centro de horrores como esse.
Sachsenhausen serviu como campo de concentração onde o regime nazista barbarizou mais de 200 mil pessoas - predominantemente judeus - no auge do II Guerra Mundial.
Nas trilhas de Sachsenhausen, o repórter e trocentos outros visitantes que na mesma ocasião estavam por lá depararam-se com cena pungente.
Sentado no chão, um jovem de aparentes 20 anos chorava.
Chorava convulsivamente.
Em pé, no seu entorno, três moças - não se sabe se familiares ou amigas do rapaz.
Elas nada falavam.
Apenas o olhavam - compungidas, como todo mundo que via a cena - e esperavam que ele parasse de chorar, o que de fato aconteceu depois de uns dez minutos.
O rapaz teve algum ancestral direto barbarizado ali?
O rapaz, independentemente disso, foi lancinado na alma ao tomar contato com a frigidez da selvageria humana que ceifou milhares de vidas apenas naquele campo de concentração e em outras instalações idênticas, onde milhões morreram de doenças ou foram mortos em câmaras de gás?
O rapaz não suportou a repulsa de constatar que ali, naquele campo de concentração de Sachsenhausen, a racionalidade humana deslizou para uma degradação talvez sem precedentes na longa, e fascinante, história da aventura humana?
O rapaz que se desfez em lágrimas talvez tenha perdido, por momentos, as forças para intuir que é missão sua, é papel seu disseminar valores que jamais permitam que outras barbáries semelhantes aconteçam?
Todos os que, naquele momento, visitávamos Sachsenhausen, éramos um pouco aquele rapaz e seus sentimentos.
Éramos um pouco ele e suas lágrimas. Ele e seus desabafos.
Ele chorou mesmo pelos que não choraram. Deixou rolar as lágrimas de sua repulsa extrema no lugar de tantos que, pelo menos na ocasião, não tiveram condições de dimensionar ao certo seus sentimentos diante daquilo que viam.
Sachsenhausen mantém parte de suas instalações intactas.
Acompanhem nas fotos do Espaço Aberto que ilustram esta postagem.
Na foto do alto, a entrada do campo, a chamada Torre A, perfeitamente preservada. O relógio parou - por todo o sempre - exatamente no horário em que foi determinada a evacuação do campo, em 1945, pelos soviéticos em marcha rumo a Berlim. No portão de ferro original, a inscrição "Arbeit Macht Frei" ("O trabalho te fará livre").
Na entrada, dois barracões - o 38 e o 39 - mostram como eram os banheiros dos prisioneiros e exibem uma exposição permanente com resquícios de objetos das pessoas que passaram por lá, sobretudo calçados (fotos abaixo).
No chamado Edifício das Celas de Castigo, que menos não era do que uma sala de suplícios animalescos impostos a quem infringisse as rígidas normas do campo de concentração, veem-se as celas (em uma delas há uma cama) onde também eram encarcerados personagens proeminentes, tidos como ameaças ao regime nazista e que foram segregados em Sachsenhausen, onde acabaram mortos. Na parte externa, ainda estão três pedaços de pau onde eram aplicados os castigos mais violentos a presos que, em sua grande maioria, não resistiram (fotos abaixo).
Ao fundo do campo - em cujas imediações o rapaz, mencionado no início da da postagem, teve uma crise de choro -, a chamada Estação Z, que os nazistas, numa sádica ironia, assim nominaram como uma forma de sinalizar, pela última letra do alfabeto, que ali era o fim, era a última escala, era a derradeira passagem.
Ali era a estação da morte.
Na Estação Z, os que visitam Sachsenhausen deparam-se com a visão arrepiante do fosso de fuzilamento, onde milhares de pessoas foram executadas, 13 mil delas de uma só vez, em certa ocasião. No mesmo local, as instalações dos fornos crematórios e um memorial, lembrando os que foram cremados ali (fotos abaixo).
Mais adiante, no outro extremo do semicírculo de Sachsenhausen, à esquerda de quem entra, a sala de autópsias, com prédio e instalações internas inteiramente preservados (fotos abaixo). E ao final, em imagem capturada do Google, uma visão aérea do campo de concentração, que, mesmo depois de 1945, continuou a ser usado por soviéticos para encarcerar ex-nazistas, entre outros.
Para quem for a Berlim e estiver interessado em visitar Sachsenhausen, basta pega o metrô, linha S1, e descer em Oranienburg. Bem na frente da estação, pegue os ônibus 804 (em direção a “Malz”) ou a linha de ônibus 821 (em direção a “Tiergarten”) para o memorial Sachsenhausen. O bilhete custa aproximadamente 1,40 euro. Se preferir, vá a pé mesmo. A caminhada por Oranienburg é agradabilíssima e não dura mais que 15 ou 20 minutos.
O ingresso ao campo é gratuito. Quem quiser audioguia, disponível em alemão, inglês, francês, italiano e espanhol, pagará apenas 3 euros. Alguns atendentes falam, inclusive, português.
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