CÁSSIO ANDRADE
A cada ano os círios se renovam na cidade. Interpretar a oração múltipla presente na multidão, mais que
a hermenêutica da vida, implica inscrever-se no território heterodoxo da escatologia mariana. Maria concebida no ritual simbólico da ópera sagrada. Cirianos sentidos simbólicos, polissêmicos, distantes dos carnavais devotos e próximos ao universo teológico da fé.
No ritual sem festa, o profano cede lugar ao sagrado. Não há mediações na manifestação da fé. Somente se crê e se realiza na promessa e nos lugares onde deístas, agnósticos e ateus se confraternizam pela energia esparrada da teogonia. As diversas dimensões temporais se erguem na multiplicidade sob a unidade do tempo salvífico.
Assim caminha sob o fenômeno das multidões a imagem encarnada, morfema antropológico expresso no signo da imagética. E nos cantos simples dos arrastos místicos, na corda umbilical metaforizada na dor, a evocação do desejo além-humano da revelação não dogmatizada da palavra. A revelação comunitária da divindade presente no sacrifício, sagrado ofício de cumprir a promessa.
E assim se renova a memória. Cirianos tempos de atualizações redivivas das lembranças, das profissões de fé. Mariana escatologia da revelação divina, no rosto feminino da teologia.
E assim o verbo se encarna na manifestação coletiva da parusia. Na esperança renovada do filho que virá anunciado por novos tempos cirianos. Em séculos e séculos.
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CÁSSIO ANDRADE é professor
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