ROGÉRIO SCHMITT
Com um título provocativo desses, já imagino que esta minha coluna irá despertar muita polêmica entre os meus leitores. Imagino também que receberei uma maioria de comentários bastante críticos. Também, quem me mandou escolher justamente esse assunto entre todos aqueles sobre os quais poderia ter escrito nesta semana pós-primeiro turno? Mas resolvi nadar contra a corrente!
Não posso ignorar os relatos de que o lançamento da candidatura do Tiririca fez parte de uma elaboradíssima estratégia eleitoral dos partidos reunidos na coligação que o lançou. Mas pretendo explorar o assunto a partir de um outro ângulo.
Antes de tudo, posso assegurar aos internautas que não votei no Tiririca. Aliás, sequer cogitei a possibilidade de votar no Tiririca. Nunca conheci o Tiririca pessoalmente, e nem ao menos conheço alguém que já tenha privado da sua companhia. Em compensação, confesso que me diverti bastante nas últimas semanas com as imitações do Tiririca feitas lá em casa pelo meu enteado de sete anos.
O fato é que o Tiririca despontou como a maior atração dessa campanha eleitoral, pelo menos no estado de São Paulo. Foi candidato a deputado federal e obteve nada menos do que 1 milhão e 353 mil 820 votos. Em outras palavras, um em cada 16 eleitores paulistas (considerando os votos válidos para deputado federal) escolheram o Tiririca como seu representante na Câmara. Ele será o deputado mais votado do país na próxima legislatura. A votação obtida pelo Tiririca elegeu ainda mais três deputados da sua coligação partidária.
Esse resultado já vinha sendo antecipado desde agosto, quanto teve início a campanha eleitoral na televisão. A imprensa noticiou que as pesquisas de intenção de voto para deputado feitas pelo Ibope em São Paulo apontavam que o Tiririca seria o recordista de votos nesta eleição. Os analistas especializados também advertiram precocemente que o Tiririca ajudaria a eleger outros candidatos da mesma coligação partidária. De fato, todas essas previsões se consumaram.
Nesse tempo todo, o Tiririca foi objeto de inúmeras reportagens jornalísticas, editoriais e colunas de opinião. Quase sempre, o tom dessas matérias era negativo. Em alguns casos, a própria candidatura do Tiririca foi apresentada como uma desmoralização da democracia. Em outros casos, o voto no Tiririca foi reduzido a um simples voto de protesto. Essas análises sempre me incomodaram. Algumas vezes, pelo seu indisfaçável viés elitista e/ou autoritário. Outras vezes, pela total falta de comprovação empírica das hipóteses levantadas.
O fato de figuras como o Tiririca disputarem eleições absolutamente não coloca em risco a nossa democracia. Artistas de televisão, ex-jogadores de futebol e palhaços têm o mesmo direito de serem candidatos que qualquer um de nós. Eles sempre estiveram presentes nas campanhas eleitorais desde o fim do regime militar. A grande maioria deles simplesmente não consegue se eleger. E os que conseguem, quase sempre acabam integrando o chamado "baixo clero" parlamentar.
No caso específico do Tiririca, duvido que a maoria dos seus eleitores sejam jovens abastados de classe média que encontraram uma forma bem-humorada de protestar contra a nossa classe política. Será que ninguém parou para pensar no fato de que a região metropolitana de São Paulo concentra a maior população nordestina do país fora do Nordeste? No meu entender, o voto no Tiririca foi predominantemente um voto "sociológico". Os eleitores pobres de origem nordestina radicados na terra da garoa simplesmente se viram refletidos num candidato com o mesmo perfil social que eles. Não vejo problema algum em escolher um candidato a deputado com base nesses critérios. Ainda por cima, o cara é engraçado!
Alguns de nós podem não gostar da ideia de ter o Tiririca como nosso representante, mas ele merece ser deixado em paz. Pensando bem, vou procurar no You Tube o clássico clip de "Florentina" para mostrar ao meu enteado. Acho que ambos iremos nos divertir muito juntos!
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ROGÉRIO SCHMITT é consultor político, com doutorado em Ciência Política pelo Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj). Foi professor da Universidade de São Paulo (USP), da PUC-SP e da Fesp-SP. Publicou o livro Partidos políticos do Brasil: 1945-2000 (Jorge Zahar Editor, 2000) e co-organizou a coletânea Partidos e coligações eleitorais no Brasil (Unesp/Fundação Konrad Adenauer, 2005).
Artigo disponível no site Congresso em Foco.
5 comentários:
O articulista praticamente sentenciou que o Titirica será parte do "baixo clero".
Os mensaleiros faziam parte do alto clero, inclusive com dois presidentes de partidos.
Os sanguessugas, também.
Os aloprados, idem.
Que o diga José Dirceu, ex-parlamentar e ex-ministro de Estado, padrinho do Waldomiro 1%.
Doutor, ainda bem que o senhor tem a seu favor o título em Ciência. Mas o senhor tem certeza que os títulos do mundo garantem honestidade frente às ações políticas?
Mais de um milhão e meio de paulistas entenderam que não e votaram no comediante.
Fora mensaleiros, fora sanguessugas, fora o alto clero. Viva o Tiririca e o que ele representa.
É por isso que o Brasil não vai pra frente.
Pra ficar no nível desse defensor do Tiririca.
Os comentaristas não entenderam o artigo. Leiam de novo, com atençao.
Deixem o palhaço trabalhar!!
Quando o Lula em uma das sua lutas para chegar ao cargo de presidente foi indagado a respeito de sua profissão de torneiro mecânico, ele respondeu: talvez o Brasil esteja precisando mais de um torneiro mecânico do que de um intelectual. E de fato estava.
Agora podemos conjeturar que o Brasil esteja precise mais de um palhaço do que de "homens sérios"
Saúde!
Ana.
Anônimo das 15:20,
Li com atenção e tem razão o comentário que descortinou a imputação de que o Tiririca fará parte do "baixo clero".
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