quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Há candidatos e candidatos. Por quê?

A psicóloga Ana Lúcia da Silva, mestranda em Psicologia pela Universidade Federal do Pará (UFPA), remeteu ao blog um questionamentos dos mais oportunos.
Uma eleição, observa a leitora, é um processo seletivo.
Um concurso público para médico, gari, engenheiro ou qualquer outro, também é um processo seletivo.
Mas por que os requisitos para um candidato a cargo eletivo são mais, digamos, amenos, são mais maneiros, são mais acessíveis em relação a um processo seletivo para admitir no serviço público profissionais de múltiplas outras categorias?
Um e outro – o servidor admitido por um concurso e o político selecionado através do “concurso das urnas” – não são pagos com o dinheiro público.
Por que um tem que ser diferente do outro?
Leia, abaixo, a manifestação da mestranda em Psicologia.

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Pelos meus parcos conhecimentos, o ingresso no setor público para qualquer cidadão se dá através de concurso público, mediante edital de convocação, seja para efetivo seja para contrato temporário (que não necessariamente atende a um edital, mas pelo menos uma seleção é realizada, no caso do temporário).
Se o sujeito vai ingressar no Estado como servidor público por 4, 8, 12 e até 25, 30 anos, como ocorre com alguns candidatos que não sabem fazer outra coisa a não ser "ser político", por que cargas d água ele não passa por uma seleção ao invés de uma votação?
No Brasil para os cargos eletivos o candidatar só precisa respeitar as seguintes condições:
a) tenha nacionalidade brasileira ou condição de português equiparado;
b) esteja com pleno exercício dos seus direitos políticos;
c) tenha sido alistado;
d) domicílio eleitoral na circunscrição de pelo menos 1 (um) ano antes do pleito;
e) seja filiado a um partido político a pelo menos 1 (um) ano antes da eleição;
f) possuir a idade mínima requerida para o cargo até a data da posse
Já para provimento de vagas para professor, médico, gari, merendeira, promotor, fiscal do Ibama etc. há de se passar por uma peleja (cursinhos, exames médicos e psiquiátricos, antecedentes criminais etc), sem a garantia de assumir a tão almejada vaga, como tem sido comum em alguns Estados, onde o candidato tem que se associar um órgão representativo ou mesmo entrar com um a ação judicial, não sei se é esse o termo.
Mas o fato é que, além dessas despesas e gastos, o candidato “apto ao exercício do cargo” tem que reservar um dinheiro para despesas extras, que possam garantir o seu ingresso no serviço público.
Por que tem que ser diferente para “candidato a político”? Afinal, trata-se de um servidor pago com o dinheiro dos cofres públicos e deveria (deve) ingressar mediante concurso público como todos os mortais!

6 comentários:

Ismael Moraes disse...

É porque, preenchidos aqueles requisitos citados por vc, ninguém pode ser discriminado para concorrer à ocupação dos cargos de agentes políticos eletivos. Desse modo, caso um gari, um engraxate ou um torneiro mecânico queira se candidatar a presidente da República, ele não precisa ter a mesma cultura ou ter se dedicado aos estudos tanto quanto qualquer outra pessoa que ostente um título de PhD em qualquer área. A Constituição não faz esse discrimen e a lei não poderia fazê-lo, pois "todos são iguais perante" ela.
O ponto nodal da questão foi tangenciado por vc: ao fim e ao cabo quem escolhe os candidatos são os partidos políticos. De certa forma, vivemos sob uma ditadura deles. Mas, enquanto não encontrarem (aliás, são eles mesmos, os partidos, que poderiam permitir qualquer mudança) outra fórmula melhor, isso continuará fazendo parte das regras do jogo democrático.

Anônimo disse...

Bobagem. Não cabe a comparação. O deputado, senador etc. não é um servidor público, mas um agente político. A função que exerce não é técnica, é política, representativa. E pra representar ou defender os interesses de determinada classe, setor, ou categoria, não é necessário ter capacitação técnica. Além disso, caso fosse exigido qualquer tipo de qualificação técnica, deixaríamos de ser uma democracia. Voltaríamos aos tempos do império, em que, para ser candidato, era necessário ter renda. Mas neste caso, a renda seria substituída pela qualificação técnica. Esse discurso de comparar eleição a concurso público é bobo e demagógico.

VP

Anônimo disse...

É evidente que a representação política funciona melhor quando é constituía de homens letrados ou cultos. Mas aí - sem que muitos percebam, inclusive a mestranda - reside um grave perigo e que remonta à filosofia política de Platão, a saber: democracia não pode ser conduzida somente pelos letrados, pelos mais cultos ou inteligentes.

Platão, como sabemos, defendia que o governo fosse tocado pelo chamado Rei-Filósofo, ou seja, preconizava um tipo de governo no qual os menos letrados seriam excluídos do comando. E isso não é, a toda evidência, um critério que conduza à democracia, que tem como um de seus pressupostos a idéia de igualdade política, a idéia de que qualquer um possa chegar ao comando dos negócios políticos desde que cumpridas certas condições mínimas fixadas pela lei.

A História assinala que Platão foi um inimigo da ágora, foi, enfim, um inimigo da democracia ateniense; e, quando lemos "A República", espantamo-nos com o programa político que ele sugere (não foi falta, por exemplo, sequer a sugestão de manipulação dos mitos, tudo com a intenção deliberada de inocular nas crianças um programa político totalitário).

O acesso aos cargos públicos tem, portanto, que ser aberto a todos; pretender que só os letrados tenham acesso aos cargos políticos apresenta um forte viés platônico, o que significa que deve ser rejeitado sob pena de violar o princípio da igualdade política entre todos.

Antes, devemos pensar como Péricles que, na Oração Fúnebre, disse que todos eram capazes de entender os negócios políticos.

Anônimo disse...

Caro Ismael Moras,

Obrigada pelos esclarecimentos sobre o "ponto nodal da questão" muito bem apontado por você, quando afirma que: "ao fim e ao cabo quem escolhe os candidatos são os partidos políticos. De certa forma, vivemos sob uma ditadura deles"

Esse é um bom debate!

Saúde!!

Ana Lúcia.

Ismael Moraes disse...

Obrigado, Ana Lúcia, mas agradeça ao nosso anfitrião Paulo Bemerguy.
Apenas complementando, os partidos políticos são um mau necessário.

Abç

Anônimo disse...

"aliás, são eles mesmos, os partidos, que poderiam permitir qualquer mudança"?

Então vamos esperar que eles façam a revolução!!!