sábado, 27 de setembro de 2008

Pelo voto facultativo



Em entrevista concedida em 20 de setembro pela internet (Globo.com), o ministro Carlos Ayres Britto, presidente do Tribunal Superior Eleitoral, respondendo indagação acerca do motivo pelo qual no Brasil o voto ainda é obrigatório, disse: "Se o voto fosse espontâneo, voluntário, os candidatos e os eleitores compareceriam às urnas com muito mais entusiasmo, com muito mais envolvimento pessoal. Acho que caminhamos para isso, porque o futuro é o voto facultativo."
Concordamos em gênero, número e grau com o ministro. Por meio de artigo publicado neste jornal em 19 de abril deste ano, sustentamos que o fim da obrigatoriedade do voto representaria para o Brasil a criação de um novo direito político.
Direitos políticos são as prerrogativas de que se investem os cidadãos para exercer a liberdade de participar dos negócios políticos do Estado. O artigo 1º, parágrafo único, da Constituição Federal (CF), diz que é a permissão dada para intervir, direta ou indiretamente, no governo de nosso País.
Apesar da existência de outros direitos políticos, como a consulta popular (o referendo e o plebiscito) e a iniciativa popular (elaboração de proposta legislativa feita diretamente pela população), vamos nos ater ao sufrágio universal, exercido através do voto direto e secreto com valor igual para todos (art. 14, caput, CF/88).
O sufrágio se expressa pela capacidade de o cidadão eleger e ser eleito, o que conhecemos pela capacidade eleitoral ativa (direito de votar) e passiva (direito de ser votado). Já o voto é o instrumento por intermédio do qual o exercemos. Logo, os direitos políticos compreendem o direito ao sufrágio universal que, de sua vez, engloba o direito ao voto.
A regra atual é pela obrigatoriedade do comparecimento para votar, o que consiste em impor ao cidadão que vá às urnas no dia das eleições, sob pena de receber sanções, caso não justifique sua ausência. Os maiores de 70 anos e os menores de 18 e maiores de 16 anos formam exceção à regra, porque o voto lhe é facultativo.
Precisamos de uma reforma política que deixe ao eleitor a escolha sobre se quer ou não votar, criando assim novo direito político ou, se preferirmos, nova forma para o exercício da cidadania.
Somos da opinião segundo a qual um povo tem o direito de rever e reformar suas leis, sob pena de eternizar regras, eis que o passado não pode indefinidamente governar o futuro, pois congelaria a vontade humana.
A obrigatoriedade do voto parece ter sido criada para assegurar ampla legitimidade aos governos, dando-se importância para a quantidade. Porém, ao voto devemos agregar valores (qualidades) que não são encontrados na citada obrigação.
É certo que o fim da obrigação de votar não resolverá os problemas que afetam as questões políticas brasileiras, notadamente porque há que se considerar a formação moral dos indivíduos na frente de qualquer aspecto de compulsoriedade.
Por outro modo, há tempos votamos em políticos que empenham suas consciências sem qualquer respeito ao fiador, mas a história mostra que a obrigatoriedade do voto não contribuiu para amenizar esse quadro.
Portanto, percebe-se que o problema não reside no eleitor, mas no eleito, cujas qualidades não são suficientes para fazê-lo entender o caráter sagrado das funções públicas que desempenha.
Se todo o poder emana do povo e em seu nome é exercido, por que não construir um novo direito e criar o voto facultativo?

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ROBERTO DA PAIXÃO JÚNIOR é bacharel em Direito
roberto.jr@orm.com.br

5 comentários:

Anônimo disse...

Concordo com o voto facultativo agora se estivésse valendo para estas eleições, nas quais não se vê alternativa - porque não há um candidato ou candidata que se possa dizer que vá mesmo pôr em prática seu projeto pra cidade - acredito que o índice de comparecimento ao pleito seria bem abaixo da média. Me diga e indique, por favor, um candidato homem ou mulher que tenha chegado aos meios de comunicação e dito de que forma vai resolver, por exemplo, o problema dos transportes públicos em Belém. Quem vai pôr ordem no caos dos chamados alternativos - pra mim ilegais? Qual deles - ou delas - diz como vai resolver o problema dos camelôs e que diga de forma clara e com que recursos? Quem vai nos dizer como pode dar um basta à poluição sonora e visual das quais nossa Belém é vítima?

Nadinha de souza disse...

Paulo,

Sou a favor do voto obrigatório.
Sem muito recheio, penso o seguinte:

O Estado Democrático de Direito é, formalmente, o representante de toda a sociedade, baseado no princípio da soberania popular e vontade geral, manifestados através do sufrágio universal. Aos idosos faculta-se o voto por questões ligadas à saúde: locomoção, eventualidade de doença, cansaço etc. Aos jovens, como estímulo ao exercício da ciadania política, experimentação com o processo eleitoral e aproximação educativa com a democracia.
Se o Estado Democrático de Direito, apesar da formalidade, não opera como representante de toda a sociedade, isso é uma luta também democrática para adequar a realidade à idéia. Não um motivo para se desprezar o Estado, substrato da extrema esquerda e da extrema direita, por exemplo.
Então, concebê-lo como representante de toda a sociedade e buscar fazê-lo operar como tal, implica a reciprocidade da sociedade, obrigada a escolher sua direção, já que esta, corretamente, é orbigada a prestar universalmente seus serviços.
Adiante, não se pode atribuir representação a quem não foi votado para tal. Logo, do ponto de vista teórico, o voto facultativo implica reconhecer duas categorias de cidadãos: uma que vota e, logo, é representada pelo Estado, com quem este é responsável por ser-lhe representante escolhido por ela. Outra que não vota, não escolhe, portanto, seus representantes - a direção do Estado - e com quem este, do ponto de vista teórico, não teria responsabilidade alguma.

Coloquei a questão de modo teórico, porque assim ela está defendida acima. Para mim, nesta seara, não faz qualquer sentido o voto facultativo, a não ser que, soberanamente, parte da sociedade resolvesse viver na "Ilha da Utopia", onde pudessem virar as costas para a sociedade. Mas isso não existe.

Um abraço,

Leopoldo Vieira

Anônimo disse...

Para Luiz Otávio e Leopoldo.

Agradeço as considerações feitas sobre o nosso artigo.

Faço uma retificação: o artigo que publicamos anteriormente, datou de 19/04/2004 e não 2008.

Abraços,

Roberto Paixão Junior.

Anônimo disse...

Leopoldo Vieira escreve como advogado, talvez o seja. Por isso sua opinião muito bem balizada, com boa argumentação teórica.
Agora, o que está subentendido hoje e na sociedade brasileira quando se faz a pergunta "você é a favor do voto facultativo" é essa vergonhoso atuação dos políticos, ou melhor, dos politiqueiros, aquele sujeito que desviartua a atuação parlamentar, que conspurca a democracia, que fere qualquer estado democrático de direito.
São eles que nos afogam na vergonha de ver candidaturas que estão aí somente pra se lucupletar, pra se aproveitar do cargo e das benesses de um vereador, de um deputado, desses salários altíssimos que recebem e, muitas vezes, passam a legislatura inteira sem apresentar projeto em prol da coletividade.
Veja nossas paradas de ônibus. Hoje Belém quase não tem abrigo a quem aguarda coletivo, com este sol, com as chuvas que caem aqui. Diante disso é que surge vez em quando a questão do voto não-obrigatório.

Anônimo disse...

Caro luiz,

Precisamos fazer com que a força do voto não seja perdida depois que o candidato é eleito.

Mesmo na condição de patrão, não conseguimos demiti-lo senão depois dos quatro anos.

É como ter em casa ou na empresa pessoas que não se adequaram às normas estabelecidas sem poder demiti-las por 04 anos.

Nosso sistema político serve para os eleitos e somente bem pouco aos eleitores.

Fortalecer referido sistema para o lado do eleitor é, pois, condição fundamental para melhorar o Brasil.

Abraços,

Roberto.