Por Luiz Egypto, no Observatório da Imprensa
Jornalismo é uma disciplina de verificação. Esta regra de ouro é o que faz do jornalismo profissional com compromisso público algo distinto dos achismos e das verdades verdadeiras que inundam jornais picaretas, blogs ideologizados, sites reducionistas e manifestações eivadas de delírios de toda ordem vocalizadas nas redes sociais com foros de “matéria jornalística”. Nas redações, o exercício do ceticismo responsável sempre implicará checagens, rechecagens, novas verificações e questionamentos até que se chegue à versão mais próxima da verdade que se possa obter a respeito de um fato. Dá trabalho, mas é assim que se faz. Às vezes perde-se o furo, mas se publica uma matéria melhor, mais útil ao leitor.
Jornalismo é uma disciplina de verificação. Esta regra de ouro é o que faz do jornalismo profissional com compromisso público algo distinto dos achismos e das verdades verdadeiras que inundam jornais picaretas, blogs ideologizados, sites reducionistas e manifestações eivadas de delírios de toda ordem vocalizadas nas redes sociais com foros de “matéria jornalística”. Nas redações, o exercício do ceticismo responsável sempre implicará checagens, rechecagens, novas verificações e questionamentos até que se chegue à versão mais próxima da verdade que se possa obter a respeito de um fato. Dá trabalho, mas é assim que se faz. Às vezes perde-se o furo, mas se publica uma matéria melhor, mais útil ao leitor.
Pois um dos jornais mais importantes do mundo derrapou feio na quinta-feira (24/1) ao negligenciar os controles que deveria exercer antes da divulgação de uma notícia. Na madrugada de quinta, o site do diário espanhol El País publicou a foto de um homem entubado, em uma sala de cirurgia, que identificou como o presidente venezuelano Hugo Chávez – que desde o início de dezembro está internado em um hospital de Havana para tratamento de um câncer pélvico. O personagem mostrado pela imagem tem semelhança com Chávez, mas se tratava de outra pessoa.
A foto foi retirada do site do El País depois de meia hora, quando se constatou o engano. Mas o pior estava por vir. Afora o constrangimento suscitado por um erro dessa magnitude, a impressão da edição em papel do jornal precisou ser interrompida – com sérios prejuízos à logística de distribuição – para que a “barriga” fosse eliminada de suas páginas. A malfadada foto estava estampada na primeira página, em quatro colunas (a página padrão do El País é de cinco colunas), com uma chamada de quatro linhas, no alto, à direita: “O segredo da doença de Chávez” (El secreto de la enfermedad de Chávez).
Foi, certamente, uma madrugada terrível para os editores do jornal. No entanto, além dos prejuízos éticos e financeiros, depois do cristal trincado será sempre muito difícil recompô-lo.
Reação dos leitores
Ao publicar a suposta fotografia de Chávez, El País tentou cercar-se de cuidados que logo se mostraram insuficientes. Embora assegurando que a foto fora tirada “há alguns dias”, o jornal ressalvou não ter podido “verificar de forma independente as circunstâncias em que foi obtida a imagem, nem o momento preciso, nem o lugar. As particularidades políticas de Cuba e as restrições informativas que impõe o regime tornaram [a verificação] impossível”.
Quatro horas antes de explodir o escândalo, conforme reportou Francisco Rabini, no diário argentino Clarín– que destacou o assunto na primeira página de quinta-feira (24) –, o diretor do jornal El Mundo(concorrente direto do El País), Pedro J. Ramírez, distribuiu no Twitter a seguinte mensagem: “Ah, por certo, ontem quiseram nos vender uma foto de Chávez entubado. Dissemos não. Quando a vir em outro veículo [você] dirá se acertamos”. E ele acertou. Na mosca.
De todo modo, para prejuízo do El País, será difícil sustentar que não houve tempo para a devida apuração que um tema tão delicado requereria: a agência espanhola de notícias EFE antecipara que o El País publicaria a foto, o alerta do concorrente El Mundo não foi devidamente monitorado. E, pior: com a rápida repercussão nas redes sociais, logo se soube que a imagem polêmica fora retirada de um vídeo postado no Youtube em 6 de agosto de 2008 (ver aqui) – no qual, no ponto de 2 minutos e 34 segundos, está a imagem que ilustrou a edição recolhida do El País e dominou, por meia hora, ilustrando uma longa “reportagem”, a homepage de seu site.
A descoberta da fraude foi atribuída, segundo o Clarín, ao internauta Ernesto G. Aroca (@ErneX), residente em Barcelona. Com o barulho em torno do achado, ainda segundo o jornal argentino, a edição digital do El País começou a receber duros comentários de seus leitores, criticando o jornal pelo erro. A foto e o texto foram, então, retirados do site. E teve início a corrida atrás do prejuízo da edição impressa.
Santo padroeiro
Descoberta a lambança, o site do El País publicou um pedido de desculpas aos seus leitores “pelos prejuízos causados” e anunciou ter aberto “uma investigação para determinar as circunstâncias do ocorrido e dos erros cometidos na verificação [da autenticidade] da fotografia”. Antes, o site havia informado que a tal foto fora fornecida pela agência Gtres Online, “afirmando que se tratava de Hugo Chávez, presidente de Venezuela”.
Para um jornal que em outubro passado enfrentou uma tempestade corporativa por causa da crise econômica, com a demissão de 128 jornalistas e redução de salário dos que permaneceram empregados, 24 de janeiro será para sempre uma data aziaga. Quanto mais não fosse por ser este o dia de São Francisco de Sales, tido como patrono dos jornalistas.
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