quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

A visão de Obama


Barack Obama surpreendeu o mundo esta semana. Apesar de garantir um aumento de verbas para a Nasa nos próximos anos, recusou seguir o programa Constellation, que tentava levar novamente o homem a Lua. O programa espacial americano, desde o período da Guerra Fria tem gasto bilhões de dólares em projetos que, numa perspectiva literalmente astronômica, pouco representa em termos de vida na Terra. Como em quase tudo nos grandes investimentos governamentais, a motivação é acentuadamente política. Na década de 60, foi esse o motor que fez Armstrong aterrissar no satélite natural do planeta. Nos dias de hoje, sem o desafio equivalente ao da pulverizada União Soviética, a corrida espacial americana reduz a marcha.
Para justificar o corte orçamentário, o presidente americano disse que é preciso olhar mais para a Terra. E, neste aspecto, está com a razão. Comparativamente, o volume de recursos lançados para o ar ganha muitas vezes de investimentos importantes carreados ao planeta. Não obstante o valor do conhecimento científico, em termos práticos, pouca coisa mudou para a humanidade com as missões espaciais. A Lua permanece a mesma. Marte e Vênus também. As mudanças aconteceram mesmo na Terra.
A investigação do espaço tem um quê de ciência e de loucura. A ciência parece vir a conta-gota. Os resultados mais populares que temos das viagens tripuladas da Nasa estão dentro da cabine. São, entre outros, estudos sobre o impacto da falta de gravidade na saúde dos astronautas e questões relacionadas à alimentação. Itens secundários, que ganham o mercado consumidor dos terráqueos. São colchões, tecidos, calçados e a miraculosa quinoa, semente andina considerada um alimento completo.
O quê de loucura está na gastança e no pouco resultado prático. Está no pouco caso que a própria nação americana empresta à superfície da Terra. Isso ficou bem claro na recusa em assinar o Protocolo de Kyoto e na recente convenção na Dinamarca. Isto para não falarmos na insana ideia de "terraficar" o planeta Marte ou construir bases militares na própria Lua. Terraficar significa tentar criar atmosfera, floresta e as mínimas condições de habitabilidade humana no Planeta Vermelho. Loucura. A Terra é um paraíso, que os americanos ajudam generosamente o resto do mundo destruir.
Tragédias semelhantes ao que passou o Haiti mostram a face doente da Terra. A floresta Amazônica está morrendo e, com ela, bilhões de criaturas seguirão o mesmo destino. Malária, aids e câncer levam embora todos os dias milhares de pessoas. Hidrelétricas reduzem a cemitérios lacustres milhões de anos construídos pela natureza perfeita. E a gastança continua investigando luz de estrelas já mortas em seu berço. É preciso entender que a vida acontece sobre a litosfera, essa fina camada da superfície do planeta. E acontece graças à atmosfera, que se estende poucos quilômetros acima de nossas cabeças. Abaixo da superfície, está o mundo, único mundo que de fato nos interessa por enquanto. Acima da igual tênue camada gasosa, negra escuridão. Não há nada que possamos tocar para nossa melhoria. Não há oxigênio nem vida. Nem o azul do céu. Apenas trevas e pontos cintilantes a milhões de anos-luz da Casa Branca.
Para vivermos bem como cidadãos, precisamos olhar mais para baixo, pois é sobre a Terra que vivemos, construímos e nos deslocamos. Olhar para cima é uma necessidade mais transcendental, que nos faz glorificar ao Criador e nos sentir parte de sua grande obra. Mesmo quando viajarmos para o reino celeste, o Terceiro Céu, o Universo será apenas uma paisagem em fuga.

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RUI RAIOL é pastor e escritor (www.ruiraiol.com.br)

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