Com 233 páginas e 36 recomendações para serem colocadas em prática pelas diversas esferas de poder e pela sociedade civil, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Assembléia Legislativa, que apurou, durante 12 meses, crimes de abuso sexual contra crianças e adolescentes no Pará, entregou nesta quinta-feira, 25, o relatório final contendo um balanço e as conclusões dos trabalhos; um diagnóstico sobre a situação de violência contra menores no Estado e, ainda, medidas para combater esses crimes, que no Pará já são 100 mil em cinco anos.
A sessão foi aberta pelo presidente da Casa, deputado estadual, Domingos Juvenil (PMDB) e a mesa contou com a participação de representantes do Governo do Estado, Senado Federal, Tribunal de Justiça do Estado, Ministério Público, Polícia Rodoviária Federal, Confederação Nacional dos Bispos do Brasil e Ordem dos Advogados do Brasil.
Coube ao relator da Comissão, deputado Arnaldo Jordy (PPS) à apresentação do documento, que trouxe como principais conclusões a confirmação da existência de uma rede de tráficos de adolescentes no Estado, com as autoridades não investigando com determinação suficiente a maioria dos casos. A CPI também constatou a existência no Pará de uma rede de disseminação de material pornográfico, tendo crianças e adolescentes como protegonistas, na maioria das vezes. Foi constatado ainda que 81% dos casos de abuso sexual contra crianças e adolescentes são praticados no seio familiar e que o Estado, através de suas instituições, ainda não despertou completamente para esse tipo de violência.
Como recomendações, o relatório apresentou 36 propostas baseadas em três linhas: no combate à impunidade, na participação da sociedade no combate aos crimes e no aparelhamento do Estado a fim de assegurar apoio e proteção às vítimas.
Jordy agradeceu o empenho e apoio dos órgãos, entidades e de todos que colaboraram com os trabalhos e disse que a CPI teve como principal mérito trazer à tona e ao debate da sociedade um tema que estava escondido nas profundezas do subterrâneo. Criticou as instituições que não cumprem o seu papel, pedindo desculpas à sociedade por estas terem deixado a situação chegar ao ponto que chegou, mas elogiou o trabalho dos órgãos e entidades que ajudaram nos trabalhos da CPI, classificado por ele, de complexo e difícil.
Em 12 meses de trabalho, a CPI visitou 47 municípios, realizou 64 audiências e 25 diligências. Recebeu 721 denúncias, ouviu 137 depoimentos e investigou 173 acusados. Desses, 52 foram indiciados e seis prisões preventivas foram decretadas. “Em todos os casos investigados, a CPI concluiu pela culpabilidade dos acusados”, disse, voltando a cobrar do poder judiciário mais agilidade na punição dos culpados.
Como exemplo da impunidade, ele citou um caso ocorrido em Itaituba, envolvendo um empresário de casas noturnas, de apelido “Batygirl”, que chegou a ser preso por crime de pedofilia pelo juiz local, mas foi solto pelas Câmaras Reunidas do TJE. “Não estou dizendo que foi isso que ocorreu, mas para a população local, esse empresário comprou o poder judiciário”, ressaltou
Outro exemplo citado foi o de um pai que confessou ter abusado sexualmente da filha de sete anos e nada aconteceu, com ele continuando solto pelas ruas de Marituba. “Para onde vai a nossa angústia e de que adianta a nossa consternação, se nada acontece com esses criminosos”, perguntou.
Mesmo diante dessa realidade, Arnaldo Jordy considera que a CPI produziu resultados positivos, entre eles, da sociedade denunciar mais. No período de 2005/2008, a média de denúncias sobre esses casos era de 337 casos/ano. Com a CPI, essa média aumentou para mais de 900 denúncias. Além disso, levou à renúncia um deputado estadual e ouviu acusados de todas as profissões e classes sociais, com mais de 20 deles com pedido de prisão preventiva.
TJE alega falta de estrutura
A desembargadora Vânia Silveira, representante do Tribunal de Justiça do Estado, elogiou os trabalhos da CPI e disse que o TJE vem cumprindo o seu papel no combate à impunidade e que, se mais não acontece é por falta de estrutura e de funcionários. “O Estado tem as suas deficiências, mas agradecemos quando somos cobrados”, disse.
No caso “Batygirl”, ela explicou que ele solto porque as Câmaras Reunidas se basearam no princípio da presunção de inocência, a partir de entendimento jurisprudencial de que todos têm direito de recorrer em liberdade até a última instância. “A lei não é feita por nos, apenas temos que cumpri-la”, explicou.
O bispo do Marajó, Dom Luiz Azcona, autor das primeiras denúncias de abuso sexual contra menores, também fez cobranças ao judiciário, lamentando o baixo número de processos formalizados nos crimes contra crianças e adolescentes.
Como foram registradas 25 mil denúncias em cinco anos no Pará, ele questionou sobre quem vai fazer justiça a todos esses casos, pedindo que seja feita alguma coisa para que esses casos não fiquem impunes. “Essas pessoas têm que ser reconhecidas como cidadãos que precisam de justiça’, ressaltou, perguntando quem vai fazer justiça no caso do ex-deputado Seffer e de João Carlos Carepa (irmão da governadora), ambos acusados de abuso sexual contra menores.
Dom Azcona pediu que esses casos envolvendo crianças e adolescentes não fiquem como um apêndice do judiciário, mas que tenham um tratamento especial por se tratar de um problema muito grave, lembrando a situação de abandono do Marajó, onde há carência de políticas públicas nessa área.
O governo do Estado foi representado pelo secretário adjunto de justiça, José Sales.
Fonte: Assessoria de Imprensa
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