terça-feira, 4 de março de 2008

“Pelo visto, vale a pena ser bandido nesta polícia”

“Quem quer trabalhar para a população? Somente aqueles que por um aborto da sorte não conseguiram um ‘padrinho forte’ capaz de os proteger e os indicar para esse trabalho ilegal, mas bem remunerado. Essa esdrúxula situação provoca um inusitado resultado: policiais [militares] que se esforçam para não trabalhar como policiais, pois no Estado do Pará é mais negócio carregar a mala de algum procurador ou desembargador, ou até mesmo de um secretário de Estado. Este estado de coisas vem ocorrendo há anos na PMPA, e no Governo de V. Exa. se repete impunemente.”
O trecho é de um dos expedientes encaminhados pelo presidente da Associação em Defesa dos Direitos do Militares do Pará (ADDMPA), major Walber Wolgrand Menezes Marques, à governadora Ana Júlia Carepa. O documento contém fortes críticas a todo o sistema de segurança pública do Pará, menciona casos de desvio de função que desfalcam a polícia de homens para a ação ostensiva nas ruas, em defesa da população, sustenta que a polícia está cada vez mais sendo privatizada e menciona casos como os que envolveram os coronéis Coelho e Margalho para demonstrar o desregramento moral que, conforme o major, é a marca de vários oficiais que têm – ou tinham – a confiança do atual comandante-geral da PM, coronel Luiz Cláudio Ruffeil.
Wolgrand tem sido um calo para a cúpula da Polícia Militar desde o governo tucano de Simão Jatene, sobretudo quando o coronel João Paulo Vieira era comandante-geral da PM. Tanto fez críticas que ele acabou submetido a um conselho de justificação, que, no âmbito militar, é chamado sempre a apreciar fatos supostamente desabonadores à conduta moral de um oficial. Wolgrand, como punição, passou para a reserva, onde se encontra até hoje. Ele já mandou dois ofícios circunstanciados à governadora Ana Júlia Carepa, um em agosto e outro em dezembro do ano passado. Em ambos, a linguagem é direta, sem rodeios e contundente.

A polícia dos pobres e dos poderosos
“Por que os governos anteriores falharam na administração da Segurança Pública no Estado? E o atual comandante-geral da PM, Cel. PM Luiz (Cláudio Ruffeil), nomeado por V.Exa. para o cargo, está aprumado com uma política diferente para a Segurança Pública, proposta por um governo diferente como o vosso?”, indaga o major num dos expedientes.
Ele destaca que, no âmbito da segurança pública, “existe a polícia que atende aos menos abastados e a que atende aos que detêm o poder econômico e político do Estado de forma personalizada, aos moldes de uma polícia privada, com a diferença de que em ambos os casos é a mesma polícia que realiza os dois serviços: a Polícia Estatal. Como e por que isso ocorre? Esse fenômeno ocorre de forma institucionalizada e de forma clandestina ou velada”, denuncia o major.
Wolgrand menciona que PM efetua um policiamento privado e preventivo para diversas autoridades e órgãos, “sem que ninguém, nem mesmo o Ministério Público do Estado, tome qualquer providência, num ato explicito de conivência com uma ilegalidade que vem se arrastando por décadas em nosso pobre Estado – pobre para alguns”, conforme destaca o major.
Ele cita os órgãos que, nesse aspecto, “estão em desacordo com as Constituições Federal e Estadual e outras leis que regem a Polícia Militar”. Diz que talvez milhares de policiais trabalham irregularmente, exercendo funções de natureza civil na Casa Militar da Governadoria, Assembléia Legislativa, Tribunal de Justiça, Justiça Militar, Ministério Público do Estado e da União, Tribunais de Contas dos Municípios e do Estado, Secretaria de Segurança Pública, Ouvidoria do Sistema de Segurança Pública, IESP, Ciop, Susipe, Seju, outras tantas Secretarias do Estado, Prefeituras Municipais, Clube dos Oficiai da Polícia Militar do Estado, Associações de Classe, Terminal Rodoviário, Shopings Centers e Estação das Docas.

“Briga de foice e puxa-saquismo”
“O mais interessante é que os policiais militares se engalfinham, numa verdadeira briga de foice e puxa-saquismo, para ficar à disposição desses órgãos em razão das generosas gratificações pecuniárias com as quais são facilmente seduzidos em face dos pífios salários que recebem, mesmo que tais gratificações pagas em forma de DAS ou FGs constituam acumulação ilícita de cargos/funções públicas, nos termos da Constituição Federal”, acrescenta o major.
Wolgrand faz duras críticas ao coronel José Osmar da Rocha Neto, foi chefe do Estado Maior Estratégico da PM até junho de 2007. “Como principal qualidade está o seu largo conhecimento nos serviços de segurança privada, inclusive utilizando policiais militares”, ironiza o major. “Em 2003, com sua equipe privada de trabalho, tentou fazer uma desastrosa reintegração de posse de um imóvel localizado na Rodovia Augusto Montenegro. Foi denunciado por este signatário ao atual comandante-geral juntamente com os coronéis Cunha e Lameira. No entanto, até o presente momento [agosto de 2007], o comandante-geral, Cel. Luiz, não instaurou o processo solicitado, nem justificou a sua flagrante omissão. Por que será?”, questiona Wolgrand.
O documento endereçado à governadora menciona ainda o coronel Henrique Coelho de Souza Araújo, que foi chefe da Casa Militar da Governadoria e, segundo o Ministério Público de Marabá, “também foi chefe do grupo de oficiais que utilizava policiais em serviço de natureza privada beneficiando empresários marabaenses”. Segundo Wolgrand, Coelho “deu prosseguimento a uma prática na PMPA tão comum como dizer que os atos daqueles que são desafetos ferem a honra, o pundonor PM e o decoro da classe. Mas, nesse caso, o que fez o comandante-geral da PM, Cel. Luís: não instaurou, sem solicitou a V. Exa. a instauração de Processo Administrativo Disciplinar ou Conselho de Justificação contra o Cel Coelho e o seu comparsa, Cel Margalho.”
Ao contrário, diz Wolgrand, eles foram prestigiados e Margalho mantido no cargo de comandante do Comando de Policiamento da Região Metropolitana, enquanto Coelho, depois que foi exonerado do cargo de Chefe da Casa Militar, passou a ser chefe do Estado Maior Estratégico da PM. “Em outras palavras, o Cel. Coelho praticou atos considerados ilegais pelo MP, foi afastado do cargo por V. Exa., mas para o comandante da PM ele é um ‘santo’, a ponto de lhe nomear para o terceiro cargo mais importante da PM. Pelo visto, vale a pena ser bandido nesta polícia”, diz Wolgrand.

Protect Service e Falcon
O major refere-se ainda ao coronel Evandro Cunha dos Santos, que inicialmente, diz Wolgrand, o comandante-geral pretendia nomear para comandar o Comando de Missões Especiais (CME), mas não o fez porque foi “contra-indicado” por alguém do governo. “Por que será [a contra-indicação]? Será que é porque o CME, dentre outras missões, realiza reintegrações de posse contemplando empresários e autoridades que tem interesse nessas questões? Será que é porque todo mundo sabe que o Cel. Cunha gerenciava a empresa de segurança privada Protect Service? Será que somente o comandante-geral da PM não sabe do envolvimento desse oficial com esses serviços ilegais no campo da segurança privada? Será que o comandante-geral sabe que o Cel. Cunha atualmente trabalha na empresa de segurança privada denominada Falcon?”, questiona Wolgrand.
O major sustenta que a governadora Ana Júlia foi induzia a erro ao assinar, em 30 de julho do ano passado, decreto que fez retroagir de abril de 2006 para a abril de 2005 a promoção do major Luís Fernando. “Ocorre que o aludido oficial plagiou a monografia que apresentou por ocasião do Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais (CAO), em 2003, conforme homologação de IPM de Portaria nº. 013/2006-IPM/CorCME, de 28 de março de 2007. Como a monografia é requisito para a conclusão do CAO, e este é requisito para a promoção ao posto de major PM, o Major Luis Fernando deveria ser despromovido em razão da fraude praticada”, protesta Wolgrand.
Conclui o major: “Toda e qualquer melhoria anunciada no campo da segurança pública não passará de falácia ou quimera, enquanto as verdadeiras causas da ineficiência dos órgãos responsáveis por essa tarefa não forem atacadas e as pessoas não comprometidas com esse fim, afastadas.”

4 comentários:

Anônimo disse...

Realmente, algo de muito podre está acontecendo na PM.
Será que, após essa avalanche de denúncias gravíssimas por escrito, a governadora "da mudança" ainda vai continuar fazendo cara de paisagem para o assunto?

Poster disse...

Anônimo,
O major dá nomes. Basta que os que têm competência e autoridade para investigar procedam às investigações.
Abs.

Anônimo disse...

Creio que precisa mais do que isso POSTER.
veja o caso desse grupo de extermínio. Eles já haviam sido "investigados" anos atrás e o resultado sempre dava em nada.
Dizem que a ex-secretária teve que "chamar" a investigação pra ela, e ai está o resultado.

Poster disse...

Exato, Anônimo.
Nada, neste País, acontece por acaso. Quando se quer fazer, a coisa é feita. Quando não se quer, fica aí para as calendas.
Abs.