segunda-feira, 22 de novembro de 2010

O exemplo helênico

Num tempo longínquo para nós, mas bastante recente se considerarmos o amplo espectro da história, em 561 a.C., Pisístrato, apoiado pelo partido popular tornou-se o primeiro tirano de Atenas. Fez um governo empreendedor. Seus sucessores, entretanto, não conseguiram dar continuidade à sua política, e em 506 a.C. a escolha de Clístenes como arconte (oligarca nobre) marcou o fim do governo dos tiranos. As reformas político-administrativas de Clístenes instituíram a democracia ateniense, que florescia no século V a.C – o século de ouro de Atenas, também conhecido como século de Péricles.
Durante o governo de Péricles (461 a 429 a.C), a democracia ateniense atingiu sua plenitude por meio do estabelecimento dos princípios da isonomia, igualdade de todos perante a lei; da isegoria, igualdade de direito ao acesso à palavra na Assembleia, e da isocracia, igualdade de participação no poder. Tratava-se de uma democracia direta, enquanto hoje, nas sociedades ocidentais, vigora a democracia representativa.
No tempo de Péricles, o comparecimento à Assembleia soberana era aberto a todo cidadão. A Assembleia era um comício ao ar livre que reunia centenas de atenienses do sexo masculino, com idade superior a 18 anos. Todos os que compareciam tinham o direito de fazer o uso da palavra como bem entendessem. As decisões da Assembleia representavam a palavra final na guerra e na paz, nos tratados, nas finanças, na legislação, nas obras públicas, no julgamento dos casos mais importantes, na eleição dos administradores, enfim, na totalidade das atividades governamentais.
Contudo, 26 séculos depois, a democracia deveria atrair democracia. Democratas deveriam sintonizar-se apenas com princípios democratas. Mas existem, infelizmente, cidadãos nos dias de hoje, seguindo estradas e caminhos tortuosos que os conduzem a entroncamentos perigosos. Olhando por cima do muro, há quem queira derrubar nosso edifício democrático.
A liberdade expressão e a liberdade de imprensa pode de fato ser ameaçada pelos governos, ela corre riscos também com o poder dos monopólios privados de comunicação. A campanha eleitoral de 2010 foi marcada por um intenso debate entre o governo federal e alguns dos maiores meios de comunicação brasileiros. De um lado, o presidente Luiz Inácio se queixou de que certos veículos agiram como partidos políticos; de outro, o chefe de Estado, seu governo e seu partido foram acusados de atentar contra a liberdade de imprensa. Engana-se, porém, quem acha que essa é uma situação inédita em nossa história republicana.
O embate entre alguns órgãos de Imprensa e o governo federal é um tema recorrente no ambiente democrático, que tem mais repercussão nos períodos eleitorais, sobretudo quando um governo com alto índice de aceitação na opinião popular pretende dar continuidade aos seus projetos. Os governos de Getúlio Vargas (1951-54), de João Goulart (1961-64) e agora o do Nosso Guia são exemplos desse tipo de conflito, no qual a Imprensa de natureza privada questiona a legitimidade de decisões políticas que podem favorecer os interesses populares (o clientelismo e o assistencialismo).
Deve-se cultivar a liberdade, e não o vetusto Estado autoritário. Isso explica a distância entre o que a sociedade deseja e o que lhe falta. Observe as palavras de Péricles: “Nossa constituição é chamada democracia porque o poder está nas mãos não de uma minoria, mas de todo o povo”.

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SERGIO BARRA é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com

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