quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Bicho de casco


Essa era uma expressão muito comum na cidade onde passei uma infância feliz. Foi “cunhada” pelo “seu” Juvenal, emérito contador de “causos” de seus tempos de seringueiro, junto com meu pai, nas brenhas do rio Eiru.
Próspero comerciante, era pessoa muito respeitada em Eirunepé (AM). Tinha, porém, uma “fraqueza”: a tentação pela carne de quelônios, sobretudo tartarugas e tracajás. Promovia “regabofes” memoráveis para comemorar aniversários de familiares e amigos.
Um dia, ouviu no rádio que “fiscais do governo” estavam “subindo” o rio Juruá para coibir o abate e a venda de animais ameaçados de extinção, como as tartarugas e os tracajás.
Juvenal reuniu seu “estado-maior” para pedir que espalhassem a notícia, com a prudente recomendação: “a partir de hoje, não se fala mais em bicho de casco na cidade, entendidos?” Todos entenderam. A expressão, então, foi adotada pelos usos e costumes da cidade como sinônimo de assunto proibido ou controverso.
Nas eleições/2010, temos também o nosso "bicho de casco". É o tema da redivisão do Pará. Os candidatos a governador, senador e deputados fogem do assunto como o diabo da cruz. Com essa atitude furtiva, perdem a chance de defender sua tese, sobretudo os que são a favor e, assim, talvez, convencer os eleitores da “oportunidade” dessa medida.
Único candidato a abordar o tema proscrito, Zenaldo Coutinho assume ser contra o "esquartejamento" do Estado, declinando suas razões. Matreiramente, os separatistas escondem suas reais intenções, na esperança de que o povo paraense possa embarcar nessa empreitada sem dispor de informações mínimas necessárias para tomar posição em eventual plebiscito.
Plebiscito que os separatistas desejam restringir às regiões interessadas, contrariando a própria Constituição, que estabelece consulta a toda a população do Estado. Os separatistas fogem do debate do tema porque não desejam ser questionados pelo eleitor sobre as “vantagens” da divisão do Pará.
Não querem admitir sua ambição pela partilha de novos cargos de governadores, senadores, deputados federais e estaduais, além de nababescas mordomias nos Tribunais de Justiça e de Contas, DAS em profusão para empregar parentes e aderentes.
Preferem manter 7,3 milhões de paraenses ignorando a origem dos recursos públicos que serão aplicados na constituição de cada nova unidade federativa, ao custo estimado de R$ 3 bilhões. Recursos que dariam para recuperar hospitais, escolas e toda a malha viária do Estado, além de aperfeiçoar o atual sistema de (in)segurança pública.
Chega a ser vergonhosa essa campanha de esconder do povo paraense as reais intenções do projeto separatista. É tempo de despertar da letargia.
Vamos ressuscitar nossos brios cabanos e dizer aos senhores candidatos: "chega de subterfúgios”! Vamos reagir, com a arma letal do voto a esse vil atentado a nossas melhores tradições culturais.
A cordialidade do povo paraense não deve ser confundida com a bovina resignação do rebanho de políticos fazendeiros separatistas, que ambicionam amealhar e concentrar novas riquezas, ficando com a melhor fatia do bolo, deixando as migalhas para o povo paraense.
Assim, caro eleitor, aos que pedem seu voto, procure conhecer sua posição sobre a divisão do Pará. Pergunte-lhes se querem bem ao Pará ou apenas se “dar bem”. E, de preferência, vote naqueles que querem unir, e não dividir o Pará. Não se estimula a prosperidade socializando a escassez.

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FRANCISCO SIDOU é jornalista
chicosidou@bol.com.br

Um comentário:

Anônimo disse...

Geovane Queiroz faz campanha no sul do Pará, oferendo como plataforma de governo, a separação do Estado. Isso é legal ? Constitucional ? Alguém pode fazer campanha falando sobre hipóteses ? Depois como iriam cobrar do candidado algo que tem que aprovado ? É assim que esses políticos que vêm de fora, elegem-se pelo Pará, cuspindo no prato que comem.