sexta-feira, 12 de julho de 2013

Não à importação de médicos


A proposta presidencial de importar médicos deve ser esquadrinhada. Não se convoca mão de obra estrangeira em massa para uma nação sem que este assunto passe pelo crivo da crítica. Esse tipo de medida tem alcances significativos, indo bem além de alguma necessidade imediata.
Em plano internacional, a importação de médicos equivale à confissão de autofalência estatal. Na ausência de estados de calamidade, esse tipo de medida faz o Brasil parecer uma republiqueta, onde o saber científico nacional perde seu devido status. Não estamos em guerra. Não há epidemia, exceto da doença moral corruptível que parece ter contaminado todos os membros deste corpo pátrio. Então, a importação de médicos empobrece o Brasil perante seus pares. O Brasil passa a ser visto como um país sem planejamento, pois a implantação do curso de Medicina no País data de 1808.
Embora saibamos que há déficit de médicos no Brasil, é preciso questionar por que isso se deve. Depois de duzentos e cinco anos desde que D.João VI autorizou o curso médico, não há justificativa que se sustente em condições normais. O governo deve ser demandado a repensar sua conduta, respeitando essa categoria profissional bicentenária.
Depois, por que alguns médicos rejeitariam ir para o interior? Seria capricho, estrelismo? Não creio. Embora se apregoe que o salário desses profissionais poderia chegar a R$ 8.000,00, isso deve ser estudado mais amplamente. Não sou médico, mas enxergo outras vertentes. Ainda que um médico tenha um salário desse nível, é preciso pesar os prós e os contras. Indo para o interior, o médico terá de viver uma exclusividade, pois quem o contratará além? Apesar de ter uma jornada de algumas horas, terá de ficar em parte ocioso, longe dos centros de formação e com muitas despesas.
Essa realidade médica é bem diferente, por exemplo, do que acontece com a magistratura e com o Ministério Público. Ambos têm um plano de carreira e o mínimo de estrutura para trabalhar fora dos grandes centros. No Amapá, o Ministério Público do Estado padronizou todas as residências oficiais dos promotores. O imóvel é idêntico do Oiapoque ao Jari. A casa tem a mesma mobília, os mesmos utensílios de cozinha, a mesma roupa de cama etc. Em qualquer comarca, o promotor amapaense sente-se “em casa”. Dependendo da área de trabalho, tem ainda carro, motorista, lancha, e assim vai. E os médicos preteridos pelo governo, o que têm?
Sabemos da realidade médica brasileira sem precisarmos pôr o pé fora da cidade. Vá agora mesmo ao posto de saúde de sua comunidade e veja como as coisas estão? Faltam leitos, medicamentos, instrumentais. Falta vergonha na cara de alguns administradores, içados pelo cabide político, muitas vezes sem o mínimo conhecimento da área. Sem o mínimo amor à atividade mais importante para todos nós.
Sabemos que o Planalto já desistiu de importar médicos cubanos. Eles viriam para cá em contêineres da família Castro. Seria um negócio entre estados, um tipo de compra moderna de escravos, onde o governo comunista ficaria com uma grande fatia do comércio. Todavia, Dilma insiste em contratar espanhóis e portugueses. Insiste em recebê-los sem validação de diploma, muito embora os nossos profissionais sofram para trabalhar naqueles países. Coisa absurda. Intragável. Anátema.
Para mim, a importação de médicos ressuscita o velho exército de reserva marxista. É coisa do capitalismo. Depois de remunerar mal e não implementar boas condições de trabalho, o Estado ameaça o acuado exército interno. Não devemos aceitar esse tipo de coisas. O governo tem de conversar com a sociedade. Sem essa de ameaça de substituição. Sem essa de que os nacionais terão preferência. Os brasileiros são capazes de gerir sua própria nação. Deem-se-lhe condições, e o nosso povo – conhecido em todo o mundo pela sua hospitalidade e calor humano – responderá positivamente, indo aos rincões mais longínquos. Os promotores vão. Os juízes vão. Por que médicos não iriam? Irão, sim, pois eles igualmente buscam valorização profissional.
É impressionante que o governo busque o caminho da transculturação. Importar médicos – nestas circunstâncias – é uma medida preconceituosa e etnocêntrica. Faz o estrangeiro parecer mais brasileiro que os profissionais que o País forma há dois séculos. Vamos ampliar os laboratórios das faculdades públicas e privadas. Vamos investir nos cursos de medicina e dobrar o número de vagas. Vamos remunerar melhor  os professores e médicos e aparelhar postos e hospitais: um mutirão pela saúde pública. Em poucos anos, a realidade mudará.

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RUI RAIOL é escritor
www.ruiraiol.com.br

Um comentário:

Anônimo disse...

O Pará poderia sair na vanguarda. Preparar o plano de cargos e salários do setor de saúde.Tem médico do estado que precisa ter sete empregos para comprar só o feijão com arroz, pois o açaí tá o mesmo preço do filé,pode?