sexta-feira, 21 de agosto de 2009

A dignidade profissional é que conta

Ana Diniz, jornalista da universidade de Cláudio de Sá Leal, nosso saudoso mestre, não se conforma que coleguinhas percam o bonde dos fatos.
E muitas vezes, perder o bonde dos fatos significa perder o bonde da História, perder o vagão no qual o jornalismo se pendura para redigir a crônica dos tempos.
É o caso de coleguinhas superapressados, com pautas mil para cumprir, que vão para uma delegacia de polícia onde um figurão está depondo e, quando menos se espera, viram as costas para voltar à redação ou seguir adiante.
E fazem isso, os coleguinhas, sem considerarem a possibilidade de que o momento em que estão saindo dali, para cumprir a outra pauta – ou por preguiça mesmo, ou por falta de faro mesmo -, é justamente o momento em que deveriam ficar, porque dali é que sairá a notícia que pode até ganhar a manchete do outro dia.
A propósito, leiam essa história que a Ana conta:

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No tempo da ditadura, eu era repórter da Província e fui cobrir a inauguração do porto de Itaqui pelo Medici (Jurássico, né?) O Carlos Weick era o fotógrafo, pela "Manchete". Os jornais estavam censurados, era o auge da repressão, mas as ordens do Sá Leal eram duras também: faz o serviço; se publica ou não, é outra história. Botaram a gente num chiqueirinho (como no filme Heroe, nós não podíamos chegar a menos de cem passos do ditador de plantão).
Bem, eu e o Weick fizemos o nosso serviço. Voltamos com os braços roxos: os seguranças nos pegavam no beliscão e nos arrrastavam de volta. Mas pegamos a notícia mais importante: o porto de Itaqui foi inaugurado sem o pontilhão, de forma que os graneleiros não podiam atracar; botaram um navio meio encalhado, lá, para fazer a imagem de funcionamento. Era uma fraude. Fosse hoje, seria um escândalo. Weick fotografou, eu fiz a notícia. Nada foi publicado, mas toda a Imprensa do Brasil soube, e isso era muito importante para que a gente pudesse resistir à lavagem cerebral daquela época.
Sabes, a dignidade profissional é importante. Com ditadores, juízes ou polícia federal, é preciso encarar "o arbítrio e a prepotência", como costumava dizer Brizola.

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Ah, tem um detalhe que a Ana não esquece – e nem poderia.
O Sarney – vocês conhecem? - também estava lá, coladinho no presidente Médici.
Oh, tempora...

3 comentários:

J.BOSCO disse...

A professora de jornalismo Ana Diniz ensinou muita coisa pro JB.Trabalhei muito tempo com a Ana, diagramando o AQUI BELÉM, um suplemento semanal de O LIBERAL, que ela editava com muita maestria.Depois começou escrever suas crônicas para o caderno dois na qual eu ilustrei por muito tempo.
saudades...
bjs

Mica .vai.la disse...

olá!
tenho um blog de biologia e queria saber se aceita parceria - http://mhp-bio.blogspot.com/ da uma olhada ve o que acha!

Bruno_Philósopho disse...

Mano,

Todos os dias perdemos milhares de bondes, seja pelo dinheiro público que se esvai - e ninguém reclama, mesmo sabendo dos fatos e não estando em nenhuma "ditadura" -, seja pela falta de coragem em publicar matérias de assuntos variados. Sabe, toda vez que penso no jornalismo como forma de se saber das coisas (afinal, para que servem mesmo os jornais?), me vem na cabeça aquela máxima da bíblia encontrada em João, 8:32 "conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará". Se não estão lá para cobrirem os fatos e noticiarem tudo o que vêem, na verdade estão gastando tempo precioso de suas vidas. E do devido veículo que promovem com seus textos.

Tem horas que eu penso que faz tempo que os jornalistas não querem ver o seu texto publicado. Veja que a maioria das linhas escritas no jornal contém algum erro gramatical ou de português básico. Se são pagos para escreverem, precisam estar com o português em dia! Senão estão fazendo desaprender ops mais novos - e mais uma vez, repito, estão perdendo tempo precioso de suas vidas e dos veículos que representam.

Sempre que um veículo deixa de imprimir alguma informação relevante, faz deixar de valer a pena lê-lo. NO outro dia, quando sabemos a verdade dos fatos e que não foi apurada pelo repórter no dia anterior, é como se tivéssemos sido enganados ao ler determinada matéria. Leia o livro do Gay Talese sobre a história do NY Times que verá bem o que estou dizendo. "No início, o Times de New York publicava qualquer detalhe que passasse ao largo das demais publicações e isso fez ele ser o que é". O prestígio dos jornais dos EUA se dividem entre NY Times e Washington Post. AI que um deles publique uma inverdade...

Mas a vida é assim mesmo. As pessoas só vão conhecer o real valor da verdade quando elas mesmas forem comparadas. Quando elas mesmas necessitarem da verdade libertadora. Quando elas verem que tudo o que produziram até hoje não significa mais nada diante do novo. Ou então no dia em que, precisando de um novo emprego, tiverem que pedir abrigo em outra publicação que privilegie a qualidade - coisa esta que eles não terão.

OU SEJA, é como diz o ditado: Se conselho fosse bom, não se dava. Se vendia! Eu adoro um conselho, embora nem sempre tenha dinheiro para pagar...