quarta-feira, 13 de março de 2019

Se Bolsonaro e seus milicianos estão irresignados, é sinal que a Imprensa cumpre seu papel



O jornal O Estado de S.Paulo publicou, em sua edição de terça-feira (12), editorial que simboliza, emblematicamente, o papel da Imprensa livre numa sociedade democrático e que, presumivelmente, deve preservar a liberdade de opinião.
O editorial aborda a fake news, difundida com o vigor dos fanáticos, por ninguém menos que o presidente da República, Jair Bolsonaro, atribuindo a uma repórter declaração que supostamente demonstraria a intenção de derrubar o governo.
"O comportamento do presidente da República, sr. Jair Bolsonaro, que não se vexa de usar até mesmo informações falsas para atacar jornalistas que considera inimigos, mostra o quão frágil é o regime democrático e reforça a necessidade da vigilância redobrada contra a sedução do arbítrio. É nessa difícil conjuntura, em que a hostilidade à imprensa profissional é estimulada pelo próprio presidente da República, que o trabalho dos jornalistas do Estado torna-se ainda mais relevante. Tendo como norte a objetividade e atenção exclusiva aos fatos, os repórteres desta casa sabem muito bem como enfrentar a ferocidade dos que se consideram inatacáveis", diz o editorial, intitulado "A missão do 'Estado'".
Leia, abaixo, a íntegra.

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Os jornalistas do Estado se pautam pelo compromisso inarredável com os valores democráticos e com o regime da lei, que estão na essência da identidade do jornal desde sua fundação, em 1875. A defesa da liberdade contra todo tipo de tirania, a começar por aquelas que se creem chanceladas pelas urnas, marca a atuação desta publicação e de seus profissionais ao longo de 144 anos de história.
Esse compromisso se encontra mais vivo do que nunca, em especial diante de ameaças que partem do próprio presidente da República, o sr. Jair Bolsonaro. Esses arreganhos só fazem confirmar a relevância do exercício do jornalismo livre, que tem no Estado um centenário patrono.
Este jornal se comprometeu, desde seu primeiro número, a ser totalmente apartidário e independente, infenso às injunções do poder. A imparcialidade necessária para o exercício dessa liberdade não significa, contudo, que o jornal silencie ou deixe de defender o que acredita ser o certo diante do malfeito e do arbítrio. É papel desta publicação funcionar como a consciência crítica de seu tempo.
Foi com esse espírito que o Estado defendeu o fim da escravidão e o advento da República, que consagra a liberdade - e a responsabilidade - do indivíduo. Essa é a razão pela qual este jornal se tornou atuante tribuna dos defensores da democracia, quando esta palavra expressava apenas um desejo da sociedade. É assim há tanto tempo que tal característica se tornou a própria natureza do Estado perante seus leitores e a sociedade.
Em respeito a essa missão, o Estado posiciona-se radicalmente contra qualquer forma de populismo e extremismo. Governantes que pretendem consolidar seu poder por meio do desprezo pelas instituições democráticas e republicanas e pelo apelo direto às ruas em geral sentem-se desconfortáveis com a atuação deste jornal na defesa do exercício responsável do governo.
Essa é provavelmente a razão de fundo do inaceitável ataque do presidente da República, sr. Jair Bolsonaro, a este jornal e a uma de suas jornalistas, a repórter Constança Rezende. O sr. Jair Bolsonaro decerto não se conforma que haja quem dele discorde ou, então, que ouse investigar os malfeitos a ele relacionados. Julga-se imune a críticas e a dúvidas sobre seus atos por ter sido eleito por dezenas de milhões de eleitores, como se o voto na urna o colocasse acima do bem e do mal.
Mas este jornal não se deixa intimidar por quem quer que seja o inquilino na Presidência, a começar por aqueles que se julgam em missão messiânica de salvação do País. O Estadoesteve ao lado dos democratas nas principais lutas políticas brasileiras desde a Proclamação da República, servindo-lhes de porta-voz. Foi assim, por exemplo, que o Estado enfrentou a truculência de Getúlio Vargas, ao reivindicar o regime da lei que aquele caudilho prometeu e afinal não respeitou. Foi assim, também que este jornal se insurgiu contra a ditadura militar, sofrendo, em razão disso, uma feroz censura. Nem isso fez o Estado vergar-se: no lugar das muitas notícias censuradas, o jornal publicou poemas de Camões com sugestivas estrofes para comunicar aos leitores a violência a que estava sendo submetido. Assim, o Estado foi protagonista da luta que por fim restabeleceu a democracia no País.
O comportamento do presidente da República, sr. Jair Bolsonaro, que não se vexa de usar até mesmo informações falsas para atacar jornalistas que considera inimigos, mostra o quão frágil é o regime democrático e reforça a necessidade da vigilância redobrada contra a sedução do arbítrio. É nessa difícil conjuntura, em que a hostilidade à imprensa profissional é estimulada pelo próprio presidente da República, que o trabalho dos jornalistas do Estado torna-se ainda mais relevante. Tendo como norte a objetividade e atenção exclusiva aos fatos, os repórteres desta casa sabem muito bem como enfrentar a ferocidade dos que se consideram inatacáveis.
As ameaças do sr. Jair Bolsonaro e de suas hostes de milicianos virtuais indicam que o Estado e seus jornalistas estão cumprindo seu dever, zelando pela tradição deste jornal de defender a liberdade e a democracia em qualquer circunstância.

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