segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

A propina e o ciclo vicioso, viciador

Acadêmico de Ciências Sociais, com ênfase em Ciência Política pela Universidade Federal do Pará, bolsista no Programa Erasmus Mundus pela Universidade do Minho, em Portugal, Luã Gabriel também é blogueiro.
É sua a postagem abaixo, que ele resume como uma "uma crônica sobre trânsito, corrupção e mediocridade".
Refere-se ao vídeo que mostra um guarda supostamente recebendo propina.
O título da crônica é O ciclo vicioso, viciador...
Leiam abaixo.

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Manhã de sábado, o cidadão bebe calmamente seu copo de cerveja com o grupo de três amigos. Eles iniciaram a reunião cedo, por isso já estão na 15ª garrafa. Veem uma notícia na televisão do bar sobre mais um escândalo em Brasília, então inicia o comentário:
- Rapaz, esses políticos são todos uns ladrões
- Pois é, estão lá apenas para roubar nosso dinheiro
- Pagamos impostos pra esses corruptos continuarem roubando. Alguma coisa precisa mudar!
- Falta ética neste nosso Brasil!
De repente, o cidadão olha o relógio e percebe que está na hora de ir pra casa, afinal de contas são 11h e prometeu chegar antes das 13h para o almoço em família e, além do mais, já está um pouco ‘alto’. Despede-se calorosamente dos amigos, bebe o resto de cerveja que ainda tinha em seu copo e sai em direção ao seu carro calmamente.
No carro, dá a partida e segue pelas calmas ruas da cidade em direção à sua casa. Vai ouvindo uma boa música, quando de repente, ao aproximar-se do sinal de trânsito percebe que o sinal está amarelo, então acelera mais para atravessar.
Ele atravessa no sinal vermelho, quando os carros do outro sinal já estavam de partida, mas conseguiu passar sem maiores problemas, até que escuta aquele longo silvo. Olha pelo retrovisor e percebe que ali, naquela esquina, há um guarda com um enorme bloco nas mãos anotando, provavelmente sua placa. Imediatamente em sua cabeça vem àquele sentimento de que fez coisa errada. Por isso resolve encostar o carro.
Vai em direção ao guarda de trânsito, calmamente e com um sorriso amarelo no rosto. O guarda está numa postura séria, uniformizado com o emblema da corporação bordado em seu peito. Então o Cidadão de aproxima e fala calmamente:
- Então Seu Guarda, bom dia!
- Bom dia, Cidadão.
- Eu percebi que o Senhor apitou assim que atravessei este cruzamento, por isso vim até o Senhor para conversarmos um pouco.
- Pois é, Cidadão, o Senhor atravessou quando o sinal já havia fechado, colocando em risco sua vida, assim como de outras pessoas.
O cidadão gagueja um pouco, talvez pelo consumo de álcool, mas mesmo assim conclui:
- É verdade, Seu Guarda… Acontece que estou com um pouquinho de pressa, pois minha mulher me espera em casa, está com um problema de saúde e vou precisar levá-la ao hospital. Não haveria a possibilidade do Senhor me liberar desta vez, por conta deste problema?
- Olhe bem, Cidadão, eu até posso, mas o Senhor sabe como é… Todos os dias são as mesmas desculpas e eu não quero dizer que o Senhor está mentindo, mas fica complicado agir em benefício de sua pessoa, assim, sem um motivo especial… Nem lhe conheço, não sei se o Senhor diz a verdade… Pode me prejudicar deste jeito…
- Mas eu lhe asseguro que digo a verdade, Seu Guarda. Isto nunca aconteceu antes comigo, pode checar minha ficha. Sou um homem de bem, advogado, pai de família, cristão… Estou apenas desesperado com a situação em que encontra-se minha esposa neste momento. Me ajude por favor…
- Tudo bem, já entendi, nobre Cidadão, mas para eu lhe ajudar o senhor também vai ter que me ajudar… Entende? Deixar pelo menos o do lanche… Sabe como é…
O Seu Guarda, então folheia as páginas do bloco até encontrar as anotações da placa do Cidadão.
- Ahhh… Tudo bem Seu Guarda, entendi. Só um minuto…
Então o Cidadão timidamente leva sua mão até a carteira, quando o Seu Guarda o adverte:
- Não faça isto aqui, Cidadão… O Senhor quer me prejudicar, por acaso? Vá até ali, naquela lanchonete, retire, ponha em suas mãos e em seguida retorne até aqui e me repasse num aperto de mãos. Entendido?
Então o Cidadão, após ouvir atentamente as orientações do Seu Guarda, assim procede. Retirou uma quantia de R$ 50,00 e ainda pensou: “isto aqui deve ser suficiente para o lanche”. Fechou a nota nas mãos, seguiu em direção ao Seu Guarda e numa atitude não suspeita, em simulação a uma falsa amizade entre ambos, o Cidadão apertou as mãos do Seu Guarda e ali depositou a quantia que havia retirado da carteira. O Seu Guarda sorriu, bateu nos ombros do sujeito e lhe informou que àquela ocorrência havia sido apagada da memória do bloco.
Assim, o Cidadão voltou ao seu carro sorridente e aliviado por ter evitado uma multa de trânsito superior àquele valor que acabara de deixar com o Seu Guarda, além de ter perdido pontos em sua carteira de habilitação. Deu a partida no carro e seguiu, mais uma vez, em direção a sua casa, calmo e feliz.

Clique aqui para o ler o restante da crônica.

3 comentários:

Anônimo disse...

Ainda na crônica da cidade.
Da cidade sujae seus sujismundos.

Tv. D. Romualdo de Seixas, no lixão da calçada da Beneficente Portuguesa, 11:30 de hoje.
Um sujismundo-profissional estaciona o carro de mão.
Despeja vários sacos com entulhos de obra, que farão companhia ao monte de lixo de todos os dias.
E sai tranquilamente sob os olhares dos passantes.
Certamente é um sujismundo "fretista" emporcalhando mais ainda a Belém sem lei e sem prefeito.

Anônimo disse...

Parabens ao academico que transformou o tragico cotidiano em cronica. Infelizmente esta é uma situação corriqueira no Brasil

Anônimo disse...

A crônica resume tudo: só existe os corruptos porque há os corruptores.