quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Devemos estar em dia com ladrões que nos roubam?

Anônimo passa por aqui.
Apresenta-se para discutir a questão - candente, polêmica - da inadimplência da secretária de Finanças, Sueli Azevedo, que já prometeu, por escrito e publicamente, a saldar seus débitos perante a Fazenda pública municipal, que ela agora comanda.
Sobre postagem feita no Espaço Aberto, intitulada, O contribuinte pode dar calote. A titular da Sefin, não., diz o leitor Anônimo:

Perdoe-me, caro poster, mas discordo. Se o contribuinte pode fazê-lo, estará se igualando à inadimplente. Nosso dever é pagar sim, mesmo que a secretária não sirva de exemplo. Devemos ser probos e honrados, ainda que os outros não o sejam. O detalhe é que o Prefeito é bacharel em Direito e deveria saber que a questão do aluguel é irrelevante para a relação jurídica tributária. Assim, se ele não demitir a secretária, demonstrará desconhecimento da lei, o que é inadmissível para um gestor público, particularmente quando detém formação jurídica.

Perdoe-me, caro leitor Anônimo, mas discordo de você.
Divirjo de você.
Sim, é claro: "Devemos ser probos e honrados, ainda que os outros não o sejam."
Legalmente, é certo, devemos nós, contribuintes, obedecer à lei.
A lei nos manda, nos ordena, nos compele a contribuir, a pagar tributos, taxas e impostos.
A lei nos obriga a pagar obrigatoriamente o IPTU.
Devemos pagá-lo, sim.
Mas assim o será ainda que sejamos espoliados, lesados, enganados, roubados?
Ainda que nós, munícipes, fiquemos reféns de administrações ineptas, inoperantes, corruptas?
Ainda que nós, cidadãos, não possamos desfrutar, minimamente que seja, de serviços básicos, essenciais?
Devemos bancar administrações criminosas, que privam os pobres de serviços de saúde que lhes garantam, pelo menos, ter direito a socorros médicos adequados, em vez de serem tratados como escórias, atirados, esquecidos, desprezados pelos cantos e pelos corredores de pronto-socorros imundos?
Devemos estar adimplentes com a municipalidade ainda que a municipalidade permaneça inadimplente conosco?
Devemos encher os cofres do Poder Público de dinheiro, pagando impostos com o suor de nosso rosto, enquanto os ditos guardiões do nosso dinheiro o dilapidam, empalmando-o em proveito próprio, para viabilizar esquemas pessoais criminosos, mafiosos, nojentos, dignos de bandidos da pior espécie - se é que existem bandidos de boa espécie?
Devemos forrar as burras de ladrões engravatados que, diante de atribuições legais para viabilizar políticas públicas que revertem, evidentemente, em benefício de toda a coletividade, apropriam-se do nosso dinheiro para enriquecer e, na condição de supostos guardiões das burras do Tesouro, nos tratam como se burros fôssemos, como se aparvalhados, inermes e inertes estivéssemos diante de roubalheiras escancaradas?
Você, caro Anônimo, quando vai a um restaurante, como reagirá se lhe servirem um filezinho estragado? Vai comê-lo até o fim? Ou exigirá outro em perfeito estado, sem que seja obrigado a pagar em dobro?
Você, Anônimo, quando compra um televisor, como reagirá se o aparelho não funcionar? Vai ficar com este ou vai exigir um outro?
Se você for, Anônimo, a um cinema e se a projeção do filme, lá pela metade, pifar de vez, você sairá tranquilamente da sala de sessão ou passará na bilheteria, para pegar seu dinheiro de volta?
Anônimo, legalmente, devemos, sim, adimplir com nossas obrigações tributárias.
Legitimamente, porém, não deveríamos pagar se o Poder Público não nos dá a obrigatória contraprestação.
Moralmente, porém, não deveríamos pagar se o Poder Público está inadimplente conosco.
Se pagamentos em qualquer situação, caro Anônimo, é porque, você sabe, nós brasileiros precisamos, como já disse o blog, aprender com os egípcios.
Precisamos criar a nossa Praça Tahir para nos levantarmos, civicamente, contra governos - em qualquer nível, de quaisquer partidos - que nos esfolam os bolsos.
Mas não faremos isso, Anônimo.
Somos brasileiros.
Somos bonzinhos.
Somos boa gente.
Somos passíveis.
Brasileiros, bonzinhos, boa gente e passíveis, cumprimos nossa obrigação de ficar adimplentes até mesmo em relação aos que se mantêm inadimplentes conosco.
O que fazer, né Anônimo?
O que fazer?

8 comentários:

Anônimo disse...

Poster,

Inicialmente, acerca do comentário anterior feito na matéria relativa ao não-recolhimento do IPTU pela Secretária, a pressa levou-me a omitir a previsão do art. 123 do CTN, no sentido de que, salvo disposições de lei em contrário, as convenções particulares, relativas à responsabilidade pelo pagamento de tributos, não podem ser opostas à Fazenda Pública, para modificar a definição legal do sujeito passivo das obrigações tributárias correspondentes.

Quanto à sua vontade de não pagar IPTU, veja-se que nos termos do art. 16 do Código Tributário Nacional, o imposto é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte.

Portanto, temos de pagá-lo e não esperar por qualquer atividade estatal específica.

Diferentemente ocorre com os demais tributos, como, por exemplo, as taxas e as contribuições sociais, em que há vinculação de suas receitas às despesas.

Já o art. 126 do CTN dispõe que, salvo disposição de lei em contrário, a responsabilidade por infrações da legislação tributária independe da intenção do agente ou do responsável e da efetividade, natureza e extensão dos efeitos do ato.

É a famosa responsabilidade objetiva, cuja constitucionalidade, apesar de duvidosa, é sempre reafirmada pelos tribunais superiores.

Até quem está preso, poster, tem que pagar tributos se incorrer em algum fato gerador, conforme o art. 126 do CTN: A capacidade tributária passiva independe: I - da capacidade civil das pessoas naturais; II - de achar-se a pessoa natural sujeita a medidas que importem privação ou limitação do exercício de atividades civis, comerciais ou profissionais, ou da administração direta de seus bens ou negócios; e III - de estar a pessoa jurídica regularmente constituída, bastando que configure uma unidade econômica ou profissional.




Anônimo disse...

Treplica: o Tesouro , ou seja, nos mesmos, estaremos sendo boicotados, nao as autoridades, portanto a sua premissa esta equivocada. Exemplo: um governante e corrupto. Devemos se-lo tambem? Ressalte-se que quem os elege somos todos nos, mesmo eu que sempre voto nulo ou em branco.

Anônimo disse...

Não pagar significa que o Poder Público ficará ainda mais inadimplente.
Para evitar que o dinheiro público saia pelo ralo do assalto, temos a ação popular, civil pública e outras espécies de controles, inclusive o penal.
A sua opinião é personalíssima, mas se a moda pega certamente o caos reinará na sociedade.
Sou manifestamente contra!

Anônimo disse...

Oxalá , Paulo, você tivesse razão quando fala em criarmos a nossa Praça Tahir. Mas isto não acontecerá. Infelizmente.

Brasileiro é como boi no pasto. Vive naquela mansidão bovina eterna. Alienação no mais puro grau de pureza e inocência.

Protestos? Só pelo Facebook, e isso quando houver tempo disponível, já que o mais importante é o envio daquelas milhares de mensagens babacas, que os caras acham as mais engraçadas do planeta.

É só ver a quantidade de kkkkkkkkkkkkkkkkkkkk ou de ahuahuaahua ou rsrsrsrsrsrsrsr nas postagens. O brasileiro realmente é um povo muito engraçadinho, alegre, ufanista e alienado. E bonzinho, claro.

Desobediência civil, como você fez, nem pensar. Boicotar empresas vagabundas como as teles, também nem pensar. Boicotar políticos vagabundos, também nem pensar(basta ver o índice de reeleição deles)

As pessoas se acham o máximo com apenas um click, os defensores da sociedade, os paladinos. Acham que somente com um click conseguem mudar o destino da humanidade, mudando políticas economicas ou interferindo em resultados de eleições. Ou ainda condenando ou absolvendo réus, como no caso do mensalão.

Alguns até que conseguem elaborar algum material consistente, mas a quase absoluta maioria se limita a - em um click - "curtir" ou "não curtir" o proposto, achando que com isso deram uma imensa contribuição ao avanço da sociedade brasileira.

Quem não possui um Facebook certamente está à margem da vida cotidiana de seus amigos e familiares.

O mesmo se pode dizer dos celulares. Sua funcionalidade não deve ser contestada, por óbvio, se é que existam coisas tão importantes que não possam aguardar 15 minutos para serem comunicadas. As pessoas ficam dedilhando mensagens com a mesma urgência que os náufragos se agarram a uma bóia.

Estamos nos tornando verdadeiras marionetes.É um surto psicótico acreditar que a vida é assim tão apolítica e fácil.

Kenneth Fleming







Anônimo disse...

O poster mora em bairro nobre que:
1. tem coleta de lixo diária;
2. tem ruas asfaltadas;
3. tem iluminação pública farta;
4. tem calçadas cimentadas;
5. não tem alagamentos;
6. tem policiamento constante.
Você deve pagar o IPTU, sem chiar!
Veja bem, se você acha que o poder público está inadimplente conosco, então não pague o IPVA (porque pagar, se não temos contraprestação de serviços), não pague o imposto de renda (porque pagar se a infraestrutura social e econômica do país está uma merda?).
Quando o seu carro for apreendido e você for intimado pelo imposto de renda, faça uma postagem no seu blog dizendo que você foi violado nos seus direitos de cidadão e blá, blá, blá.
Presume-se, então, que você está equivocado, meu chapa.

Yúdice Andrade disse...

A questão da desobediência civil é uma tema relevantíssimo para o direito, desde pelo menos o século XIX. O célebre manifesto de Thoreau foi motivado, justamente, por ter passado uma noite preso devido a impostos atrasados, relativos a um período em que ele vivia como ermitão, sozinho nas montanhas.
É uma questão complexa, porque envolve desde a autoridade do direito ou de um governo (um aspecto mais positivista), quanto direitos humanos variados, tais como à educação, moradia, dignidade - um aspecto mais jusnaturalista, digamos assim.
Ambas as vertentes são direito. Eu me inclino mais à segunda.

Anônimo disse...

Apenas um ponto de vista: a população está perdendo a capacidade de indignação com toda a podridão que aí está.
E isso é o mais grave; passamos a ser bovinamente mansos e aceitamos toda a sacanagem com a expressão de "é assim mesmo, sempre foi assim".
Tristes tempos da nova moral, da nova ética.
Estamos ficando "acostumados".

p.s.: viva os blogs que ainda gritam.

Anônimo disse...

O problema é que muita gente está acostumada a exigir direitos e não cumprir suas obrigações!