quarta-feira, 13 de outubro de 2010

"Regeneração" pelas urnas


A eleição de domingo (3) teve seu desfecho, já entrou para a história. Expostos diariamente em entrevistas, sabatinas, debates, comícios e no horário eleitoral, os candidatos trocaram acusações, comentaram escândalos e temas polêmicos, ironizaram os rivais e cometeram diversas gafes. Todas juntas, as frases dão um retrato em cor âmbar, saboroso e emblemático do momento político pelo qual passa o Brasil.
Eram favas contadas que Dilma Rousseff levaria com certa folga, a situação, à vitória ainda no primeiro turno. Mas o episódio dos filhos de Erenice Guerra, ex-ministra-chefe da Casa civil, não resistiu à série de denúncias de lobby e tráfico de influência contra seus familiares e foi obrigada a pedir demissão. Foi o tiro de misericórdia. Saiu atirando que era vítima de uma "campanha de desqualificação" e reclama de "toda sorte de afirmações, ilações e mentiras"`. A ex-ministra cometeu um grave erro funcional e um equívoco político desastroso, com conseqüências graves para a candidata do PT, de quem foi "braço direito". Esse factóide fez com que Dilma começasse a cair nas pesquisas.
O outro fato foi o fator Marina. A candidata do PV saiu-se muito bem no crescimento da reta final até a conquista de quase 20 milhões de votos. Esse grupo que votou com Marina, com sua diversidade, vai decidir a eleição. Mais é muito cedo para colocá-la como uma "nova força política". Olhando-se por cima do muro do ambiente eleitoral, vai uma distância quilométrica a percorrer antes de chegar ao pódio.
Hoje, quem se der ao exercício de contemplar o semblante nacional vai defrontar com imensos contrastes. Há uma região insular de excelência no meio de territórios feudais; há avanços de tecnologia de ponta ao lado de muros do passado; na própria seara da administração pública, uma burocracia altamente profissionalizada convive com largas fatias do mandonismo político, a denotar o esforço de uns para olhar adiante sob o solavanco de outros que teimam em olhar para trás.
Ademais, se há uma reforma que pode ser chamada de mãe de todas as outras, antes mesmo da área política, como normalmente se propaga aos quatro ventos, é a reforma do modelo de operação do Estado. Redimensionar a estrutura do Estado, conferindo-lhe dimensão adequada para a obtenção de eficácia, significa mudar comportamentos tradicionais, racionalizar a estrutura da autoridade, reformular métodos e, ainda, substituir critérios subjetivos e ancorados no fisiologismo por sistemas de desempenho.
As eleições oxigenam. Nosso País precisa de importantes reformas. Os gastos públicos são excessivos (e pedem reforma do Estado), centralizados em demasia (reforma fiscal), financiados por impostos abusivos e disfuncionais (reforma tributária), a legislação salarial é obsoleta (reforma trabalhista) e os encargos sociais, proibitivos (reforma da Previdência). Mas nada disso foi discutido durante a batalha eleitoral. A eleição se reduziu a uma feroz disputa pelo comando da máquina pública.
A degeneração da política e a desmoralização dos partidos são consequências não intencionais. A inapetência por reformas é uma demonstração de insensatez, verdade. Enquanto persistir a busca da governabilidade por práticas político-administrativas inaceitáveis, estaremos expostos a crises institucionais.
Sempre que o grupo no poder perde a decência, as democracias maduras experimentam episódios de "regeneração" pelas urnas.

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SERGIO BARRA é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com

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