segunda-feira, 13 de dezembro de 2010
Roupas íntimas no varal
Constrangido pelas revelações contidas em milhares de documentos secretos divulgados pelo site WikiLeaks, o governo dos Estados Unidos deve começar em breve a remanejar funcionários diplomáticos, militares e agentes da inteligência que perderam credibilidade ou enfrentam riscos depois do vazamento. “Vamos ter de retirar alguns de nossos melhores funcionários porque se atreveram a relatar a verdade sobre os países nos quais trabalham” – lamentou uma autoridade americana de alto escalão.
As roupas íntimas dos americanos estão expostas no varal. Por quê? Porque o vazamento do WikiLeaks não revela grandes segredos: apenas a fragilidade da inteligência dos EUA. O que fazer com mais de 251 mil memorandos diplomáticos? Uma leitura, análise e interpretação razoavelmente aprofundadas seriam um trabalho hercúleo para anos, capaz de gerar milhares de artigos, dissertações e teses acadêmicas em história, relações internacionais e ciências políticas.
Os “donos do mundo” chegaram a uma conclusão inevitável: o Departamento de Estado de fato põe diplomatas a serviço da espionagem, inclusive de seus aliados – e pode ter perdido parte da confiança destes, vista a facilidade com que seus segredos são vazados. Outra é que os EUA têm pouca capacidade de interpretação das informações que reúne. As opiniões desabridas de diplomatas de Washington e de seus amigos e informantes sobre líderes mundiais são por vezes divertidas, mas raramente acrescentam algo novo. Suas análises e especulações revelam poucos segredos e também pouca capacidade de ir além do senso comum.
Ainda há muito sobre os bastidores da diplomacia – inclusive sobre o Brasil – nas mãos do site WikiLeaks. Apesar das declarações do governo de que não há terrorismo no Brasil, as autoridades monitoram há três anos um grupo de aproximadamente 20 brasileiros suspeitos de ter recebido financiamento e instruções de organizações islâmicas para desenvolver atividades extremistas no país. Porque esse tipo de notícia assombra governos de todo o mundo. O termo inglês que melhor define o site WikiLeaks é whistle-blower. Na tradução literal, digamos assim, seria o soprador de apito, aquele que chama a atenção.
Desta vez, a grande “façanha coube ao soprador de apito Julian Assange (na foto), australiano de 39 anos que fundou o WikiLeaks, foi escancarar as desavenças nas relações entre os EUA e os demais países, inclusive os considerados “amigos”, para os quais há um discurso público de cooperação. E Assange afirma: “Nosso objetivo é conseguir filtrações de alta qualidade que nos deem informações sobre como funciona de verdade o mundo e colocá-las à disposição do público”. Que tal?
Assange – que estaria escondido na Grã-Bretanha – era procurado e já foi capturado pela polícia e a desculpa para prendê-lo é que foi acusado de não usar camisinha quando mantinha relações sexuais, o que pelas leis da Suécia e considerado estupro e abuso sexual. Na Austrália, porém, a investigação é para verificar se ele infringiu alguma lei do país.
Tentar inviabilizar o WikiLeaks é tolice. O site consegue se manter no ar com provedores em vários países e a prisão de Assange não comprometerá sua continuidade, devido à imensa popularidade obtida depois dos vazamentos. Quem perdeu a pose foi Hillary Clinton que, enfurecida faz uma viagem pela Ásia, que no fundo, vai servir como um tour de desculpas aos vários líderes internacionais atingidos.
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SERGIO BARRA é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com
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