domingo, 21 de setembro de 2008

Recessão à vista


SERGIO BARRA

Não sou do ramo, mas vou me atrever a dar uns pitacos sobre a crise que está aí à nossa frente. Pelas imagens dos pesadelos, pelas dimensões de certa gravidade que apresenta, principalmente quando a "grita" vem da ainda maior economia do planeta. Temos a sensação de impotência, de que estamos fora de cena. O que dizer, afinal? É que sei que a mídia não elogiava o comportamento atual das vozes dissidentes de Wall Street.
Examine-se a gravidade do momento, sem fazer o beiçola de dúvida. Mais uma vez, quem nos dá o grito de alerta que os Estados Unidos estão em crise é o ex-chefão do Federal Reserve (FED), Alan Greenspan, que durante 19 anos - até 2006 - trabalhou à frente do banco central americano. A atual conjuntura perigosa - financeira - americana é considerada a maior dos últimos 50 anos e provavelmente do último século.
Vamos projetar desde o passado à trajetória galopante da economia mundial. A Primeira Grande Guerra Mundial submeteu alguns países a um castigo severo. Alguns escaparam ilesos e vários melhoraram suas posições. Os Estados Unidos foram os grandes beneficiados entre 1914 e 1919, quando o centro das finanças mundiais transferiu-se para aquele país. Os EUA tornavam-se a maior nação credora do mundo, até o final da década de 1920.
No final dos anos 1920, os Estados Unidos estavam em plena euforia econômica. Tanto a agricultura quanto as indústrias funcionavam a todo vapor, transformando pessoas comuns, como as da classe média, em consumidores compulsivos. Economias de uma vida inteira foram confiadas às firmas de Wall Street e investidas na Bolsa de Nova York. Todos confiavam que a prosperidade jamais terminaria. Mas o colapso de Wall Street cortou o expansionismo econômico e as ilusões.
Os Estados Unidos voltam a ficar assustados com o risco iminente de uma nova grande crise. O que aconteceu neste fim de semana foi a chegada do olho do tornado a Wall Street. Todos à beira de um ataque de nervos nas imediações ao prédio do FED em Nova York. O pavor de que a maior economia do globo entre em recessão e os reflexos afetem as economias globais tem derrubado os principais mercados ao redor do mundo. Isso nos remete a lembrar os fins de semana atormentados que vivemos no Brasil, na era dos planos econômicos e da crise bancária. Só com uma diferença: desta vez era lá, no mais poderoso centro financeiro do mundo.
Nosso Guia que tem algumas obsessões em matéria de economia. Uma delas é evitar a qualquer custo a "inflação". O Brasil não pode ficar achando que o País é invulnerável à crise. Nenhum país é. Nem precisa ter o pânico do contágio de primeiro grau, como os que já tivemos no passado. Nossa situação é melhor, mas as conexões da economia no mundo globalizado são inevitáveis.
A crise ameaça se espalhar para outros países. A recessão já bate à porta dos europeus. Os ministros das Finanças da zona euro, reunidos na última sexta-feira, 12, passada, em Nice, sul da França, descartaram a possibilidade de adotar um plano de reativação da economia européia ameaçada pela crise, em oposição ao decidido por Estados Unidos e Japão. O Eurogrupo acredita que a zona euro não enfrenta risco de recessão generalizada, mas uma recessão de caráter técnico, definida por dois trimestres consecutivos de recuo do PIB.
O crédito ficará mais curto, a aversão ao risco maior, as commodities sem gás para continuar com preços altos, as bolsas continuarão instáveis. Um dos efeitos pode ser o déficit dos fundos de pensão, que têm um terço de seus ativos em bolsa - os grandes têm mais. Empresas que investiriam nos países emergentes podem ter dificuldade de se financiar para tocar os investimentos.
Com a crise, as bolsas mundiais desabam, e o temor de um risco sistêmico com o pedido de concordata do Lehman Brothers e a venda do Merrill Lynch para o Bank of America. Além disso, os problemas da quebra enfrentados pela maior seguradora do mundo a American Internacional Group (AIG) - o governo injetou US$ 85 bilhões para evitar o efeito cascata e a empresa se reestruturar e poder respirar - promoveram uma fuga do risco nos mercados globais.
Greenspan prognosticou que mais instituições financeiras irão enfrentar crises financeiras no futuro e que o governo dos Estados Unidos não deveria usar o dinheiro público para salvar bancos em dificuldades. A turbulência decorrente do estouro de mais essa bolha ainda não teve suas conseqüências totalmente dimensionadas.

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SERGIO BARRA é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com

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