quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Acabou o gás!


Ouvi essa frase segunda-feira mais uma vez. Como sempre, gás acaba em fim de semana ou feriado. Acaba quando o bolo está no forno e o feijão só escaldado. Aos 46 anos, devo ter escutado esse anúncio algumas dezenas de vezes. Até a juventude, por muita necessidade. Hoje, pela correria da vida, que nos faz esquecer de coisas consideradas essenciais.
Não bastasse a falta de gás, enquanto me preparava para comprar o produto, recebi outra mensagem da cozinha: "Rui, acabou a água!". Pronto. Agora minha esposa e eu tínhamos um bom programa para a manhã do Dia de Finados. E saímos em busca do que reputamos indispensáveis. É sobre isso que vamos conversar hoje.
À medida que o dito progresso vem chegando, nossa vida vai ficando cada vez mais cheia de quinquilharias. Fico pasmo com tantos itens nos grandes supermercados. A comida dividiu-se em milhares de formas. A bebida multiplicou-se em cores e sabores. Se você quiser comprar açúcar, terá de escolher entre refinado, triturado, cristalizado, integral... Sem falar na classificação em orgânico e transgênico e aqueles que vêm acompanhados do prefixo extra. A cena me faz lembrar de Sócrates. Conta-se que o filósofo, ao ouvir os apelos de vendedores de uma feira que visitava, respondia: "Não... não... não quero. Só estou olhando o que não preciso para ser feliz!"
O que é realmente indispensável? O que é mesmo essencial neste mundo capitalista, fábrica de necessidades? Lembro-me agora que certa manhã um conhecido entrou aqui nesta sala onde escrevo para me oferecer colchões. Embora sem precisar do objeto, parei para ouvi-lo. Ele pôs-se a falar das inúmeras vantagens do produto. O leito milagroso era capaz de revitalizar velhos, tirar dores, curar certas moléstias e até garantir longevidade. Mas logo assustou-me com o preço: custava em torno de cinco mil reais. Enquanto o vendedor finalizava a exposição, esforçando-se para me convencer da necessidade que eu tinha daquela invenção, eu lembrava como Deus houvera me curado de graça há 11 anos. O que é mesmo necessário?
Disse acima que fui um jovem muito carente. Quando consegui um emprego aos vinte anos na extinta Sucam, a realidade não mudou muito. Recebendo um salário mínimo, construí um quarto numa invasão em Macapá. Não havia água nem luz porque esses serviços não passavam na rua, digo, no caminho de casa. Esse luxo vinha de um vizinho, a quem eu pagava uma "taxa". Nossa família vivia uma fase pré-anúncios de corte.
Mais tarde, mudando para um lugar melhor, novas mensagens começaram a ecoar: "Cortaram a água!" "Cortaram a luz!" Antes, só convivia com o botijão vazio de gás, que costumava durar muito sob as poucas panelas do quarto-cozinha. Foi nesse tempo que Deus começou a tratar comigo sobre o que é realmente importante. Ali, aprendi a lidar com a terrível ansiedade, doença deste século.
Minha lição mais importante aconteceu num dia daqueles. Daqueles que a Bíblia classifica como dia mau. Nessa manhã, os maus anúncios chegaram de uma vez: "Rui, acabou o gás, cortaram a água e cortaram a luz!" O que fiz? Fui falar com Deus. Orando, Ele me mostrou que as desgraças anunciadas não eram verdadeiras.
Refeito, voltei ao arauto, e perguntei: "Que gás? Cortaram o oxigênio? Não vou mais respirar?" "Não." - foi a resposta tímida. "E a água? - indaguei - não vou mais ter água para beber? Nunca mais?" "Não." "E a luz? Cortaram a luz do Sol?" "Não. Não é isso...". Ora, então não temos problemas!" - afirmei, sereno, e voltei a orar. Logo Deus supriu essas necessidades.

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RUI RAIOL é pastor e escritor
Mais artigos: www.ruiraiol.com.br

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