terça-feira, 22 de maio de 2018

Um elefante branco da Esplanada



SERGIO BARRA

Os descaminhos da política brasileira, de enigmático desfecho, encontram análises díspares. Especialistas sustentam que haveria uma luz no fim do túnel para o governo nesses tempos de crise. É, pode ser. Descontados os que sabem perfeitamente que sofismam, sobram os otimistas e os esquecidos a compartilhar dessa visão. Mas, é fato que, o elegante Palácio da Justiça, projetado por Oscar Niemeyer para abrigar o Ministério da Justiça, tradicionalmente uma das pastas mais importantes do governo federal, está se transformando num castelo de areia, ou melhor, no mais vistoso ministério que desapareceu e, no momento, vive o maior desprestígio político de sua longa história.
O esgotamento do Ministério da Justiça já vinha dando sinais de decadência e já vinha perdendo relevância nos últimos anos. E mais se acentuou depois que o presidente Michel Temer criou, em fevereiro, o Ministério Extraordinário da Segurança Pública. A nova pasta levou a Polícia Federal (PF), a Polícia Rodoviária Federal, a Secretaria Nacional de Segurança Pública e o Departamento Penitenciário Nacional (Depen), que eram a antiga espinha dorsal do antigo ministério. É bom lembrar que, a PF forma, com a Receita Federal e o Banco Central, a Santíssima Trindade dos órgãos do Estado que está na base do exercício do poder pelo Executivo federal.
Criado no Império de Dom Pedro I, em 3 de julho de 1822, com o nome de Secretaria de Estado dos Negócios da Justiça. De lá para cá se tornou uma área central da administração, não só do imperador, mas de todos os presidentes desde o nascimento da República. É bom destacar que, pelo ministério, passaram personagens relevantes como Ruy Barbosa, Oswaldo Aranha e Tancredo Neves. Na história recente, a pasta foi chefiada por Saulo Ramos, Paulo Brossard, Oscar Dias Corrêa, Nelson Jobim e Márcio Thomaz Bastos, personagens que tiveram papel fundamental na definição dos rumos políticos dos governos a que estavam vinculados e, por tabela, no destino do país.
O enfraquecimento do ministério começou com a quebra da tradição que, pela importância, o ministro da Justiça deve ter cadeira cativa ao lado direito do presidente da República em reuniões ministeriais. O costume só foi rompido quando, no início do primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o então Chefe da Casa Civil, José Dirceu – que gostava de mandar e aparecer –, exigiu o lugar, para demarcar poder. O cargo, não resta a menor dúvida, sempre foi muito cobiçado porque cabia ao titular da pasta duas tarefas nobres: a articulação política com o Congresso Nacional e, de quebra, a interlocução do governo federal com os tribunais. Ou seja, o ministro da Justiça podia discutir as grandes questões nacionais com o privilégio de, aparentemente, estar acima de disputas menores.
O abandono político a que foi submetido o Ministério da Justiça vem se agravando dia a dia. Em grande parte, culpa do próprio ministro Torquato Jardim, que tomou posse em maio passado, num momento em que o ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot se preparava para fazer a primeira denúncia contra Michel Temer. Em seguida, criticou as investigações contra Temer e, deixou claro, que poderia trocar o diretor da PF. Disse também que o seu conhecimento de segurança pública se resumia ao relato de uma tia vítima de um assalto. Foi a senha para que, semanas depois, Raul Jungmann entrasse em cena para falar sobre combate à violência no Rio de Janeiro e sobre um plano de segurança pública para o país – e ganhasse, no colo, o Ministério da Segurança Pública –, até então seara exclusiva do titular da Justiça.
Na verdade, o Ministério da Justiça está esvaziado porque deixou de ser, na prática, um ministério de Estado e se tornou, em seu sentido decadente, um ministério político de governo.

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SERGIO BARRA é médico e professor

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