ISMAEL
MORAES – advogado socioambiental
@ismaeladvogado
Dentro de 23 dias fará aniversário de 1 ano do
flagrante do gigantesco despejo de rejeitos industriais pela Norsk Hydro
Alunorte em nascentes de diversos rios e igarapés de Barcarena onde vivem
centenas de comunidades.
A tragédia em Brumadinho (MG) apresenta
semelhanças com o que ocorre aqui em Barcarena. O presidente da Vale afirmou
que esse “acidente” (assim classificam os seus crimes) é muito estranho, porque
em setembro/2018 houve a aprovação da barragem por uma “auditoria independente”
que as autoridades autorizaram a Vale contratar.
Pois saibam, paraenses desavisados, todas as
correções das atividades da Norsk Hydro Alunorte em Barcarena estão sendo
feitas por “auditoria independente” contratada pela Norsk Hydro Alunorte...
Há mais de uma década o Laboratório de Química
Analítica da UFPA e o Instituto Evandro Chagas estudam o meio-ambiente e o
organismo das pessoas que vivem no entorno da Norsk Hydro Alunorte e concluem:
os níveis de contaminação por mercúrio, cromo, chumbo e alumínio constituem um
grave escândalo de saúde pública. Não à toa, em Barcarena há o mais alto índice
de leucemia infantil do Brasil – e isso é apenas um exemplo. Até então, todas
as ações dos MPs acerca das contaminações em Barcarena foram lastreadas nas
pesquisas dessas instituições científicas – inclusive os flagrantes dos terríveis
crimes da Norsk Hydro Alunorte em fevereiro de 2018.
Sou advogado da Cainquiama, associação que
congrega e representa mais de 100 comunidades, de Barcarena e de Abaetetuba,
dependentes e banhadas por microbacias hidrográficas diretamente atingidas pelas
atividades da Norsk Hydro Alunorte. Após 30 anos de sofrimento e humilhações,
com o conluio historicamente criminoso das autoridades do Estado do Pará, as
comunidades estão bastante organizadas nessa entidade, e agem por meio de ações
judiciais independentemente do tratamento concedido pelo Ministério Público às
indústrias de Barcarena.
Nessa condição, fiquei surpreso quando soube que
o Ministério Público (federal e estadual) assinou um TAC com a Norsk Hydro
Alunorte onde, na cláusula 3.1 entrega todo o poder de avaliação para a
reativação das atividades flagradas a uma “auditoria independente”, a ser
contratada pela empresa (a partir de seleção pública). Meu susto, compartilhado com pesquisadores e
por técnicos dedicados ao assunto, foi porque os MPs afastaram da avaliação e
da aprovação dos órgãos federais que pesquisam e estudam a poluição em
Barcarena há mais de 10 anos, permitindo que empresas que visam exclusivamente
o lucro contratem outras com idêntico fim para cuidar de vidas humanas e do
meio ambiente de uma região criticamente afetada por atividades industriais e
minerárias.
Nos últimos dias do governo Jatene, a Secretaria
de Meio Ambiente do Estado (Semas) concedeu licença ambiental para a Norsk
Hydro Alunorte retornar em 100% suas atividades. Essa Secretaria não possui
corpo técnico-científico capaz de avaliar os feitos da mineração e nem o
processo industrial da transformação da bauxita em alumínio (não há os
elementares estudos de Geoquímica, Hidrologia e de Química Ambiental para
embasar a licença) e adotou um estudo de empresa contratada pela Norsk Hydro
Alunorte para embasar a autorização ambiental da atividade. Registre-se que a Semas
emitiu durante décadas relatórios e pareceres favoráveis à atividade da
Alunorte, como inexistindo irregularidades, onde foram flagrados canais e
drenos clandestinos despejando efluentes no meio-ambiente.
Até hoje não apenas ninguém foi preso, como os
MPs sequer processam esses servidores autores de fraudes nocivas às vidas das
pessoas dessas comunidades. A impunidade é ainda mais gritante com os
executivos da Norsk Hydro Alunorte: além de impunes, vivem plantando inverdades
diárias na imprensa, inclusive deturpando o que o trabalho do MP, que se vê
obrigado a emitir notas desmentindo.
De fevereiro de 2018 até hoje pode-se afirmar
que Barcarena está cada vez mais perto de Mariana ou de Brumadinho em MG, e
cada vez mais longe de Oslo, para onde vão as riquezas pagas pela vida e pela
saúde das comunidades consumidas pela contaminação diária.
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