segunda-feira, 11 de julho de 2022

Bolsonarista fanático comete um crime hediondo. Mas você está com pena dele ou da vítima?

Marcelo Arruda, o petista morto na própria festa de aniversário por um bolsonarista:
ninguém esqueça que ele é a vítima. E vítima de um crime hediondo.
Não é de hoje.
Todas as vezes em que me deparo com um crime hediondo - e crimes hediondos, vocês sabem, acontecem todos os dias -, proponho-me recorrentemente algumas questões.
Por exemplo: se eu conseguisse dominar esse criminoso, logo após o crime, o que eu faria com ele? Eu o imobilizaria, faria com que se sentasse num sofá, oferecia-lhe água na quantidade que quisesse beber e diria para que ficasse aguardando a puliça chegar, ao som da Quinta Sinfonia de Beethoven? Ou então eu, simplesmente, iria até a cozinha, pegaria uma faca e cravaria 400 mil vezes na cara dele, até matá-lo?
Quando me proponho essas questões, também formulo uma ocorrência hipotética (mas antes sempre bato na madeira 300 vezes - toc, toc, toc, toc, toc...).
A ocorrência seria a seguinte: e se eu chegasse em casa e me deparasse com uma filha minha, com minha mulher, com minha mãe sendo molestada sexualmente por um selvagem e conseguisse dominar de alguma forma o bárbaro, o que eu faria com ele?
Devo confessar a vocês que, diante dessa questão, tenho sempre um certeza e uma dúvida: 1. A certeza: eu jamais lhe daria um copo d'água enquanto aguardasse a chegada da polícia e muito menos o deixaria ouvindo Beethoven; 2. A dúvida: já que não tenho arma, como pregam os bolsonaristas fanáticos, não sei se iria à cozinha da minha casa e pegaria uma faca para aplicar-lhe 400 mil facadas, mas certamente, no auge da minha indignação contra um crime hediondo, não hesitaria em fazer o criminoso sentir na pele, literalmente, alguma forma de dor física que eu mesmo julgasse compatível com a hediondez que ele cometeu.
O que você faria? - Então, você aí, se fosse filha, filho, primo, irmão ou amigo de Marcelo Arruda, o tesoureiro do PT que barbaramente, selvagemente, cruelmente, hediondamente foi morto a tiros por um fanático bolsonarista, o que você faria com o assassino, mesmo já imobilizado por cinco tiros da vítima, que ainda conseguiu reagir para evitar que o criminoso completasse o seu ato hediondo e matasse outras pessoas?
Estou propondo esse questionamento porque, ainda nem transcorridas as 48 horas do cometimento do crime hediondo que ceifou a vida do militante petista, vejo as redes sociais derramando lágrimas a rodo.
As lágrimas são vertidas por bolsonaristas compungidos porque o assassino hediondo, identificado como Jorge Guaranho, um bolsonarista maluco - que se anunciou na festa de aniversário do petista como bolsonarista, mas não como maluco -, aparece nas imagens caído, após ter levado cinco tiros, ao mesmo tempo em sua cabeça era alvo de pontapés e novos disparos à queima-roupa desferidos por alguém ligado a Marcelo, que àquela altura, segundo se acredita, já estava morto.
O que dizem os bolsonaristas e outros, nem tanto, que vão buscar no fundo de seus mais nobres repositórios morais forças suficientes para proclamar sua revolta contra o assassinato do petista e a forma, igualmente brutal, com que o assassino foi tratado logo após cometer o crime?
Os bolsonaristas, e outros nem tanto assim, lançam mão das velhas máximas tipo "nada justifica a violência", ou "violência não se paga com violência" ou ainda "um ato bárbaro não apaga outro ato bárbaro".
Pois é.
Hediondez atrai hediondez - Um assassino, caído e exaurido de forças, por ter levado cinco tiros, foi alvo de um ato bárbaro por também ter sido chutado na cabeça várias vezes e ter levado mais tiros?
Sim. Ele foi.
Guernica: Foi você quem fez? - perguntou um nazista a Picasso.
"Não, você fez", respondeu o pintor.
Foi alvo de uma violência selvagem?
Sim. Ele foi.
Foi alvo de uma crueldade?
Sim. Ele foi.
Foi alvo de extravasamentos que nenhuma lei (escrita, vale dizer) acolhe?
Sim. Ele foi.
Tudo isso é verdade.
Mas também é verdade que o assassino selvagem foi vítima da própria selvageria que ele primeiramente provocou.
Também é verdade que o assassino cruel foi vítima da própria crueldade que ele anteriormente acabara de provocar.
Também é verdade que o assassino bárbaro foi vítima da própria bárbarie que ele anteriormente acabara de cometer.
Também é verdade que o assassino hediondo foi vítima de sua própria hediondez.
Hediondez se paga com hediondez?
Não. Eu, como busco todo dia a salvação eterna, digo que não.
Mas convém que você aí - sobressaltado e indignado porque um assassino hediondo foi alvo de uma hediondez logo em seguida ao crime hediondo que cometeu - não esqueça que ele, o assassino hediondo, foi vítima de sua própria hediondez.
"Você fez!" -Aliás, essa história me lembra uma outra.
No início dos anos 1940, em Paris, bateram às portas do estúdio de Pablo Picasso.
Eram militares alemães, que foram lá bisbilhotar sobre a vida e o trabalho do gênio catalão, que ousara demonstrar o morticínio perpetrado por franquistas, com a ajuda de nazistas, na cidade basca de Guernica, retratando o massacre na então já famosa tela Guernica.
À saída, Picasso ofereceu aos visitantes um cartão-postal de Guernica.
Um dos alemães perguntou ao pintor:
- Você fez isso?
E Picasso:
- Não, você fez!
Mais ou menos o que ocorre agora, com essa brutamontes bolsonarista.
Não é que os outros lhe fizeram uma hediondez.
Foi ele mesmo quem fez.

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