O furo está na edição de hoje do Diário do Pará, jornal da família do governador Helder Barbalho.
Como todo bom e velho furo, deveria ser a manchete do jornal, mas não foi.
Uma nota - singela e solitária, muito embora posicionada na abertura do Repórter Diário, a coluna mais importante no jornal - informa que o governo Helder Barbalho prepara a privatização de um trecho de 525 quilômetros do completo que envolve a PA-150 e o Complexo da Alça Viária, começando em Morada Nova, distrito do município de Marabá, e terminando no Porto de Vila do Conde, em Barcarena (veja o trajeto na imagem ao lado).
A impressão que se tem é de que a nota foi divulgada, tipo assim, para que todos possamos sentir o clima da ideia. E não é uma ideia qualquer - muito pelo contrário. Será a primeira vez em que um trecho de uma rodovia estadual paraense (e talvez de uma rodovia estadual em toda a Região Amazônica) poderá passar para as mãos da iniciativa privada. Se tal acontecer, o estado, conforme indicado na nota, prevê arrecadar cerca de R$ 4 bilhões, com a promessa de geração de 2.500 empregos.
O valor da privatização, se mantido o que está na nota, equivale quase ao dobro do arrecadado com a venda da Celpa, que em 1998, ainda no primeiro governo Almir Gabriel (PSDB), passou para a iniciativa privada por US$ 450 milhões, sob repulsas inflamadas que até hoje ecoam não apenas entre segmentos da centro-esquerda, mas do próprio MDB do governador Helder Barbalho. Na cotação de hoje, a estrada a ser privada vale cerca de US$ 790 milhões.
Aliás, se o próprio jornal não aprofundou o assunto, se inexiste qualquer menção à iniciativa na Agência Pará, é evidente que isso deve-se ao fato de que o projeto de privatização, até mesmo por seu ineditismo em território paraense, ainda está sendo, como se diz, desenhado tecnicamente.
Uma vez definido e anunciado formalmente - e certamente o será, porque a fonte é o jornal do próprio governador -, só então é que o projeto poderá passar pelo escrutínio da sociedade, que poderá aferir com melhor precisão as condições em que se concretizará a primeira privatização de um trecho de rodovia paraense.
R$ 75 milhões? Por quê? - Mas ainda que os debates não estejam abertos, vale anteciparmos algumas questões. Uma delas diz respeito aos R$ 75 milhões que o governo do estado está gastando desde maio do ano passado, para restaurar, para reformar, para melhorar apenas e tão somente 40 quilômetros da PA-150.
A notícia da restauração, oficialíssima, foi publicada na Agência Pará exatamente no dia 16 de maio de 2020. Pergunta-se: por que esse gasto vultoso, se o governo tinha em mente privatizar a rodovia? Não se acredita que a intenção de privatizar a estrada nasceu de ontem para hoje, nem de seis ou sete meses para cá. É mais do que razoável imaginar-se que há mais de um ano, no mínimo, o estado já considerava a ideia de privatizar a rodovia. Por que, então, gastar R$ 75 milhões para reconstruir um trecho de apenas 40 quilômetros?
Há outra questão que salta aos olhos: a PA-150 liga a Região Metropolitana de Belém (RMB) ao sul e sudeste do Estado, interligando oito municípios do nordeste paraense, indo de Moju a Tailândia, Breu Branco até Ipixuna do Pará, de Goianésia a Jacundá, e Nova Ipixuna até Morada Nova, distrito de Marabá.
Privatizada a rodovia, teremos a cobrança de pedágio em vários pontos. Será o mesmo tanto para os grandes produtores da região, que usam a rodovia para escoar seus produtos, como para os pequenos, para não dizer pequeníssimos, produtores de municípios pequenos do sul e sudeste do Pará servidos diretamente pela PA-150 ou que se encontram em sua zona de influência?
Essas e tantas outras questões precisarão ser dirimidas, à exaustão, quando o projeto de privatização for, enfim, formalmente anunciado. E quando, óbvio, só então deverá virar manchete. Mas aí as manchetes já estarão, como diríamos, esvaziadas pelo furo de hoje.
Que não virou manchete.
Um comentário:
A PA 150 está cada vez mais perigosa, quando vc escapa dos buracos crateras em alguns trechos, vc cai na mão de assaltantes. É como viralizou um deputado, eleito pelo povo do sudeste do Pará, sobre o descaso do governo e dobochando do slogan sobre asfalto falando que é 'assalto por todo o Pará'. Mas sobre a privatização, com certeza os motoristas vão usar as Brs 222 e 316, para driblar 90 por cento dos pedágios. E só quem será penalizado será o povo paraense
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