Peça de defesa ajuizada pelo segundo colocado na eleição para reitor da Uepa contém link para mostrar que o atual pro-reitor também é professor visitante numa universidade particular do Rio. E acusa o atual reitor Fernando Palácios.
A temperatura do confronto entre os professores Sílvio Gusmão e Bira Rodrigues, que ultrapassou os 40 graus na disputa travada na eleição para reitor da Universidade do Estado do Pará (Uepa) e esquentou um pouco mais na esfera política – desde que atribuída à governadora Ana Júlia Carepa a tarefa de escolher o novo dirigente da instituição -, promete chegar perto dos 100 graus, promete ferver, enfim, no atual estágio em que se encontra: o Poder Judiciário.
A defesa apresentada por Bira Rodrigues - segundo colocado na disputa para reitor da Uepa –, ao contestar judicialmente a ação proposta perante a 1ª Vara da Fazenda da Capital, e com a qual o professor Sílvio Gusmão pleiteia a
anulação do resultado da eleição em que ele mesmo foi o primeiro colocado, contém informações que, segundo apurou o blog, era desconhecida até mesmo de algumas pessoas próximas a Bira. Quem assina a ação declaratória de nulidade (clique
aqui e procure o processo nº 200810104501) são os advogados Jorge Borba e Kelly Garcia Salgado, patronos de Gusmão.
A peça de defesa, assinada pela advogada Mary Cohen, não faz volteios verbais. Acusa Sílvio Gusmão, atualmente pro-reitor da Uepa, de acumular o cargo de professor visitante de uma instituição de ensino superior particular, a
Universidade Castelo Branco (UCB), com sede no Rio de Janeiro (RJ). Além disso, considera um despropósito que Gusmão tenha pedido apenas a anulação do resultado da eleição, e não do processo eleitoral por inteiro, já que se alegam vícios desde o seu início. E apresenta trechos de manifestação remetida por Gusmão à presidente da comissão eleitoral da Uepa, em que ele próprio se desculpa pela utilização de termos deselegantes utilizados por seus advogados. Também sobram acusações ao atual reitor, Fernando Palácios, acusado de utilizar a máquina universitária para fazer campanha em favor de Gusmão.
“Diferentemente do que pretendem os autores [da ação declaratória de nulidade], quem está irregular e não tem moral para assumir o cargo de reitor é o sr. Sílvio Gusmão. Ele acumula o cargo de professor de uma faculdade particular com a de pro-reitor da Uepa. Veja como o mesmo é desmascarado”, afirma a peça de defesa de Bira Rodrigues.
Bira, através de sua advogada, destaca na peça de defesa o link
http://lattes.cnpq.br/5965559391455423, que conduz ao currículo de Sílvio Gusmão. Aí é que se encontra a menção de que ele é professor visitante da Universidade Castelo Branco, atua como professor orientador, com carga horária de 20 horas, e “desempenha no Programa de Mestrado em Motricidade Humana as funções de professor/orientador e membro efetivo do respectivo colegiado”.
“O Regimento Interno da Uepa estatui que o cargo de pró-reitor é em regime de dedicação exclusiva, o que significa dizer que não pode ser exercido concomitantemente com outra atividade extra. Todavia, o sr. Sílvio acumula, trabalhando para uma faculdade particular situada no Rio de Janeiro. É essa a moralidade que tal pessoa alardeia?”, questiona Bira Rodrigues.
Verba pública na campanha eleitoralGusmão é acusado na peça contestatória de ter utilizado “verba pública, da própria universidade que administra juntamente com o atual reitor Fernando Antonio Colares Palácios, para viajar fazendo campanha política”. Para demonstrar tal afirmação, Bira juntou à defesa cópias extraídas do Diário Oficial do Estado.
Bira Rodrigues menciona dispositivo do Regimento Eleitoral da Uepa que recomenda o seguinte: “Aos candidatos a reitor e vice-reitor que ocupam funções comissionadas ou gratificadas na Uepa, é recomendado o seu afastamento das respectivas funções, a partir da homologação da inscrição pela comissão eleitoral até a homologação dos resultados pelo conselho universitário.”
Mostra o professor Bira Rodrigues que tal recomendação tem um alcance: evitar que o candidato utilize a máquina e o próprio cargo para se promover. “Pois bem, foi exatamente isso que fez o autor Sílvio Romero. Na condição de pró-reitor, não somente utilizou a máquina universitária, como viajou em campanha eleitoral, conforme comprovam as diárias e viagens cuja comprovação junta nesta oportunidade. Tudo com o beneplácito do atual reitor da Uepa, o mesmo que o nomeou como pessoa de sua mais expressiva confiança.”
Aí é que Bira sustenta seu argumento de que a ação declaratória proposta por Sílvio Gusmão incorre em contradição ao pedir apenas a nulidade do resultado da eleição, que apontou Gusmão em primeiro, Bira em segundo e a professora Ana Cláudia Hage em terceiro – os três nomes homologados pelo Conselho Superior Universitário e remetido à governadora Ana Júlia Carepa, até aqui de mãos atadas por causa guerra judicial em que se transformou a disputa.
“Se há uma nulidade, ela atinge a tudo e a todos. Portanto, o pleito se encontra totalmente viciado, o que impõe a nulidade total e não apenas naquilo que interessa ao candidato da situação, o candidato do continuísmo político”, ataca o professor Bira Rodrigues. “Aí reside a real intenção dos autores. Pretendem, maliciosamente, fazer o Juízo incorrer em erro, unicamente para atender aos seus interesses. Não estão, nem de longe, preocupados com a comunidade acadêmica, muito menos com a moralidade pública como preconizam”, complementa.
Portarias de diárias foram canceladasEm relação às diárias que recebeu quando já não havia sido editada portaria que revogou sua cessão à Secretaria Estadual de Educação em 13 de setembro de 2007, antes de ser aberto o processo eleitoral na Uepa, Bira Rodrigues reitera argumento já exposto em
agravo de instrumento impetrado pela Procuradoria-Geral do Estado e que não teve prosseguimento porque a relatora detectou a falta de documento indispensável para sua tramitação normal.
Bira defende o argumento de que poderia permanecer vinculado ao Estado, na qualidade de secretário-adjunto de Ensino, sem prejuízo do exercício de suas atividades como professor, eis que o vínculo com a Uepa “é o de tempo integral, porém, sem dedicação exclusiva, situação que lhe permite exercer outra atividade, respeitada, apenas, a compatibilidade de horário”, conforme os termos da peça de defesa.
Diz ainda o professor que as portarias publicadas com datas posteriores ao término de sua cessão ao governo do Estado “foram, na quase totalidade, canceladas, conforme documentos anexos, muito embora, como acima dito, não houvesse qualquer irregularidade no exercício simultâneo das duas atividades.”
Bira Rodrigues inclui na peça assinada pela advogada Mary Cohen vários trechos de informações prestadas ao Ministério Público. No início de janeiro passado, o promotor de Direitos Constitucionais e Patrimônio Público, Alexandre Couto, instaurou procedimento – uma apuração preliminar, para que se possa aferir a viabilidade da propositura ou não de ação judicial – para apurar denúncias contidas em
representação formulada por Sílvio Gusmão, de que houve fraudes no processo que habilitou Bira Rodrigues a concorrer à eleição na Uepa. Gusmão, conforme informou o Espaço Aberto, já recebeu
esclarecimentos e explicações da reitoria da Uepa e da comissão eleitoral. Esses documentos é que ajudam a balizar boa parte da peça de defesa de Bira Rodrigues.
“Queremos apresentar nossas desculpas”O professor também faz referência em carta encaminhada por Gusmão à professora Maria Josevett Almeida Miranda, presidente da Comissão Eleitoral da Uepa. Lá pelas tantas, diz Gusmão faz reparos à linguagem que seus advogados utilizaram. Afirma um trecho da carta: “Queremos apresentar as nossas desculpas pessoais pela forma como foram realizadas as exposições de motivo para a interposição de recursos impetrados junto ao Consun, sobre o referido pleito eleitoral. Não concordamos com os termos usados e muito menos com a forma deselegante e áspera da interlocução.”
Prossegue Gusmão, na carta à professora Maria Josevett Miranda: “Longe de querer usar como desculpas, mas a senhora, como profissional que é, inclusive com bacharelado no ramo do Direito, sabe que por muitas vezes o causídico carrega nas tintas, na expectativa de que suas investidas pareçam mais contundentes e promovam assertivas aos olhos sobretudo de leigos na área, como nós. Naturalmente que o interesse é, que com o uso de uma linguagem rebuscada e contundente se possa conseguir (ingenuamente) intimidar personalidades pétreas como a sua.”
O processo eleitoral está paralisado desde janeiro, quando o juiz Charles Menezes Barros concedeu
liminar em medida cautela ajuizada por Sílvio Gusmão. Desde então, já foram frustradas três tentativas de derrubar a liminar de primeira instância (veja
aqui,
aqui e
aqui). A ação declaratória de nulidade do resultado da eleição – no âmbito da qual Bira Rodrigues agora apresentou sua defesa – é a principal da medida cautela ajuizada.
A defesa apresentada pelo professor Bira Rodrigues ainda é uma etapa inicial na instrução de todo o processo iniciado com o ajuizamento da ação declaratória. Até o julgamento do mérito, que será proferido por sentença, muita água ainda vai correr por baixo da ponte.
Água fervente, pelo visto.