domingo, 20 de janeiro de 2008

Era uma vez um instrumento cortante...



... Que em vários países recebeu o nome de navalha. Aliás, não precisaria repetir que, no Brasil, esse instrumento cortante que consta de uma lâmina articulada a um cabo, com fenestração para resguardar o fio de sua extremidade quando se fecha, tinha várias utilidades. Seu uso se fazia dependendo da ocasião. O que sempre soube é que esse instrumento, utilizado por prostitutas, rufiões e freqüentadores de zonas de meretrício, onde se localizavam as casas de tolerância, era manuseado com destreza, cujos cortes abriam verdadeiras feridas na epiderme dos cidadãos, deixando em suas vítimas cicatrizes deformantes e perenes. Sua outra utilidade era nos salões, onde era manuseado com competência pelos barbeiros.
Recentemente, a navalha vem sendo usada para movimentações suspeitas em fraudes que sangram o erário em mais de R$ 170 milhões. Essa navalhada é um corte moral profundo e está se transformando em uma epidemia do Estado de Direito. Em 2007, as confissões públicas de um vereador de Novo Repartimento (município paraense), mostrado por imagens de TV, confessando da tribuna da Câmara Municipal que recebera alguma “vantagem do Poder Executivo”, em 17 de maio de 2007. Coincidentemente, no mesmo dia em que o comentário foi publicado o país deparou-se com novo escândalo. Uma operação, a “Navalha”, desencadeada pela Polícia Federal em nove Estados e no Distrito Federal. Prendeu 46 integrantes de uma quadrilha especializada em desviar dinheiro público por meio de fraudes em licitações de obras do governo.
À época, foram presos entre outros um deputado distrital, um ex-governador do Maranhão, dois sobrinhos do atual governador do Maranhão (prato cheio para o insaciável Sarney), filho do ex-governador de Sergipe, dois prefeitos, assessor especial do Ministério de Minas e Energia, secretários de três Estados, autoridades federais e empresários. O governador maranhense só não foi preso porque a ministra do Superior Tribunal de Justiça, que ordenou as detenções e diligências para apreender documentos, não encontrou elementos que justificassem a prisão em flagrante, conforme dispositivo da Constituição do vizinho Estado. Mas as gravações em poder da Polícia Federal implicam o governador.
O objetivo da Operação Navalha, segundo a Polícia Federal, era desmontar uma quadrilha que fraudava licitações de obras públicas. As investigações começaram em novembro de 2006. Os presos foram acusados por fraudes em licitações, corrupção, tráfico de influência, superfaturamento de obras e desvio de dinheiro público. O empresário Zuleido Soares Veras, dono da Construtora Gautama, é apontado como o “chefe da organização criminosa”, e figura há anos como executor de obras feitas com recursos do governo federal.
Nosso país está condenado a viver à beira do abismo eterno. Ao fundo do poço da fisiologia a Sarney. Sobrevieram vários fundos do poço: do Collorgate, dos anões do orçamento, da compra de votos para reeleição, desvalijar a Sudam, a violação do painel do Senado, o mensalão, da quebra de sigilo do caseiro, sobrepujado pelo dossiegate, da compra de sentenças judiciais, o propinoduto da Gautama e até lobista de empreiteira que bancava as despesas de um affair extraconjugal do ex-presidente do Senado.
Pergunta-se: a quantas anda a Operação Navalha? No esquecimento? Espero que não. Oxalá a Polícia Federal não caia no desânimo e leve até as últimas conseqüências, uma vez que tem se mostrado uma entidade séria neste país. João Ubaldo Ribeiro, sobre essa operação, disse: “Bem, pode ser que estejamos fundando a primeira sociedade ladronista da História”.

Sergio Barra é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com

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