segunda-feira, 24 de janeiro de 2022

Governo do estado e Prefeitura de Belém administram o caos na ponte. E precisam explicar claramente por que o pilar desabou.

Desde o início da manhã de 17 de janeiro passado, quando um pilar da ponte de Outeiro veio abaixo, o governo do estado e a Prefeitura de Belém estão administrando o caos, a desorientação, a bagunça e a confusão. É preciso que se diga isso claramente, para evitar que declarações - sejam de autoridades, sejam de cidadãos anônimos -, pinçadas aqui e ali, transmitam a impressão de que, apesar dos pesares, tudo vai bem no reino da Dinamarca. Não. Não vai.

Ressalte-se logo que o caos, a desorientação, bagunça e confusão que sobrevieram ao desabamento do pilar e à consequente interdição da ponte seriam, em quaisquer circunstâncias, absolutamente previsíveis. Até porque, nem a Prefeitura de Belém, nem o governo do Pará, nem o governo da Suíça seriam capazes de, num átimo, num abrir e piscar d'olhos, estabelecer providências imunes a críticas para reorientar as rotinas de estimadas 80 mil pessoas, como as que residem na Ilha de Caratateua e têm na ponte um equipamento público essencial para se locomover.

Portanto, repita-se, o caos era plenamente prevísivel e cabe aos poderes públicos resolvê-los, cada um no âmbito de suas responsabilidades. O que se apresenta como inadmissível é a tentativa de criar-se um cenário enganoso, ilusório, fantasioso que poderia transmitir a impressão de que, mesmo sem ponte, milhares de pessoas já estão indo e vindo felizes da vida - em lanchas, ferry boats, canoas, transatlânticos e sabe-se lá o que mais.

Afinal, por que o pilar desabou? - À tentativa de produzirem-se cenários enganosos, acrescente-se o fundamental: faz-se necessário que o governo do estado venha a público para divulgar clara e enfaticamente os resultados do laudo pericial que indicará se, afinal de contas, o pilar foi atingido por uma balsa ou se simplesmente ruiu.

Essa questão não é, como se diz, de somenos. Não é uma questão menor. Não é uma questão lateral, secundária. E por que não é?

No dia 19 de janeiro passado, uma quarta-feira, na postagem intitulada Nem balsa, nem ônibus, mas o carro do pipoqueiro é que derrubou o pilar da Ponte de Outeiro. É isso?, o Espaço Aberto observou que, se for confirmado que não houve colisão alguma, isso será indício de que o desmoronamento sinaliza que a ponte pode estar seriamente comprometida. "Com isso, será necessária uma prospecção 40 vezes mais apurada, para se avaliar se, em vez de apenas repor um pilar, não será necessário reforçar a estrutura da ponte inteira, que tem 360 metros e exerce uma inegável importância social, eis que liga a Ilha de Outeiro a Belém, no continente", escreveu o blog.

Sem colisão - Neste domingo (24), em seu portal Ver-o-Fato, o jornalista Carlos Mendes assina matéria (leiam aqui a íntegra) informando, com base em fontes confiáveis, que não houve colisão alguma. "A pergunta, afinal, é a seguinte: se a balsa investigada não bateu na ponte, no último dia 17, por qual motivo o pilar caiu e foi tragado pelo rio Maguari? O pilar caiu sozinho? Uma autoridade no assunto, cujo nome o Ver-o-Fato não revelará para evitar perseguições e ameaças, explica que o problema todo originou-se nos 'blocos de coroamento' da ponte", afirma a matéria. Blocos de coroamento são aquelas peças de concreto que fazem ligação entre as estacas que estão cravadas no subsolo e os pilares.

Nos últimos oito anos, lembra Carlos Mendes, "pelo menos cinco abalroamentos, alguns extremamente violentos, atingiram os pilares da ponte. E sempre durante a madrugada ou começo da manhã, quando a fiscalização não existe, a exemplo do restante do dia. Como não houve nenhum reparo, durante todo esse tempo, o nível de saturação a choques nos blocos de coroamento chegou ao limite."

As dúvidas que pairam sobre se houve ou não uma colisão foram confirmadas pelo próprio delegado Daniel Castro, da Polícia Civil, conforme declarações que constam de matéria divulgada na Agência Pará (leia aqui) informou na coletiva que prosseguem as investigações para localizar os responsáveis  pelo sinistro. "Pode (o sinistro) ser um  empurrador específico ou sucessivos choques de várias embarcações. Estamos fazendo perícias e em breve vamos divulgar a dinâmica: se foi uma embarcação que provocou a queda ou sucessivos choques de diversas embarcações", informou Castro, conforme a Agência Pará.

Viram aí? Sucessivos choques de várias embarcações é uma expressão do delegado que corrobora a apuração do portal Ver-o-Fato, de que os vários abalroamentos ocorridos nos últimos anos podem ter concorrido, juntamente com a falta de manutenção adequada, para que os pilares estejam ficando naturalmente fragilizados e propensos a desabar, sem que para isso tenha sido alvos de uma colisão.

Quanto ao anúncio do governo do estado, de que vai reconstruir a ponte em sete meses, convém evitar que a urgência exigida pela restauração completa de uma estrutura de imprescindível e inegável valor social, como a ponte de Outeiro, leve à eventual inobservância de procedimentos legais inafastáveis. Daí ter sido acertada a convocação tanto do Ministério Público como do Tribunal de Contas do Estado, para acompanharem todo o processo de contratação da empresa que realizará as obras na ponte.

É que gato escaldado, vocês sabem, tem um pavor de água fria.

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