A Justiça do Pará julgará nesta sexta-feira (18/10) o destino de um empreendimento localizado no bairro do Ibirapuera, área nobre de São Paulo. Trata-se de uma disputa de herdeiros pelo patrimônio de Eugenio Soares, morto em 1962.
O caso está em Belém do Pará por causa de um inventário aberto em 1993 pelos herdeiros, especificamente para a partilha de 30 Títulos do Instituto Ofir Loiola, da capital paraense. No meio do processo, os herdeiros Jorge (então inventariante) e Armando acrescentaram à partilha as ações da Indústria Soares, fundada em 1957 por Eugenio e um dos seus filhos filhos, Barnabé Teixeira Soares. Estabelecida na avenida Ibirapuera, em São Paulo, o local hoje abriga um complexo com flats, apartamentos residenciais e escritórios avaliado em R$ 21 milhões. As unidades em disputa judicial são propriedade da Ohio Holding Participações Ltda, controlada também por herdeiros de Barnabé.
Em decisão de julho do ano passado, a juíza Elena Farag, da 9ª Vara Cível de Belém, determinou a partilha dos imóveis, construídos pela Ohio. A Juíza considerou que, quando Eugenio morreu, ele detinha 30% das ações da Indústria Soares, o que implicaria na partilha dos imóveis construídos onde ficava a empresa. O espólio de Barnabé contesta a sentença, afirmando que na data de sua morte, Eugenio já não mais detinha os papeis, e que os imóveis em litígio nunca fizeram parte nem do patrimônio da Industria Soares e nem do acervo patrimonial do Espólio, o que impediria hoje a divisão dos apartamentos. Desde 2009, porém, Armando e o espólio de Jorge, representado por seu filho Gerson Soares, administram 70 apartamentos do empreendimento por meio de uma Medida Cautelar na Ação de Inventário.
A cargo dos escritórios Leite, Tosto e Barros Advogados e Hesketh & Hesketh Advogados, a defesa do espólio de Barnabé e da Ohio diz que, antes de morrer, Eugenio doou suas ações da Indústria Soares aos filhos Armando, Angélica e Eugeny, fazendo com que todos os seus sete filhos figurassem no quadro societário da empresa, acabando, desta forma, com sua participação acionária na sociedade. Ainda afirmam os advogados que o espólio de Barnabé comprovou nos autos do Inventário as transações de trocas entre os herdeiros referentes às Ações da Industria Soares sediada em São Paulo com as ações da Empresa Soares sediada em Belém do Pará, que também pertenceu a Eugenio Soares.
Na década de 70, Barnabé decidiu montar a Ohio Holding, trazendo a Indústria Soares como sócia e integralizando o capital com o terreno localizado no Ibirapuera. Nesta época, Barnabé já havia comprado as ações de seus irmãos, constando então, dos herdeiros, apenas ele como sócio da Indústria Soares.
No entendimento da juíza, porém, mesmo que a doação de Eugenio a seus filhos tenha realmente ocorrido, o ato deve ser considerado nulo, pois o Código Civil veta a doação de 100% do patrimônio.
“Se poucos meses antes de seu falecimento, o inventariado doou 100% do que possuía, preterindo todos os demais herdeiros, inclusive o embargante e até meeira não precisamos fazer maiores rodeios de que efetivamente a doação é nula”, disse Elena. Segundo a legislação, 50% do patrimônio deve ser transmitido aos herdeiros necessários (filhos, por exemplo), enquanto os outros 50% são livres para doação.
Caso a decisão seja mantida, os herdeiros de Barnabé dizem que a herança será distribuída de maneira desigual e que Armando, Angélica e Eugeny receberão três vezes a mesma parcela do patrimônio: a primeira vez quando o pai deles lhes deu as ações da Industria Soares; a segunda quando venderam para Barnabé a parcela que detinham na empresa e uma terceira agora com a partilha dos imóveis.
“Absurdamente, após 30 anos do falecimento, vêm em juízo os herdeiros Jorge, Armando, Angélica e Eugeny e pleiteiam que as ações da Indústria Soares devem integrar o patrimônio do Espólio de Eugenio Soares, sendo que três deles receberam as referidas ações por meio de doações em vida de seu pai”, diz a advogada Camila Rodrigues Carnier de Almeida, do Leite, Tosto e Barros, representante do espólio de Barnabé.
Ela afirma que os demais herdeiros validaram as doações quando participaram da Assembleia de dezembro de 1962 e que contou com a presença dos sete filhos. O documento está registrado na Junta Comercial de São Paulo. “Não podem, após trinta anos, vir em Juízo manifestarem contrariamente a um ato pretérito, ferindo de pronto o instituto da boa fé objetiva — venire contra facto proprio —curiosamente na mesma época em que seu irmão Barnabé começa a prosperar em seu novo ramo, fazendo lançamento imobiliário em região nobre de São Paulo”, acrescentou Camila.
Pontos questionadosA advogada diz ainda que há outros pontos questionáveis na sentença. O primeiro deles, diz, é que a decisão não observou a realidade patrimonial do espólio de Eugenio Soares. A advogada diz que deveria ser listado todo o seu patrimônio como: ações da Empresa Soares, o saldo da venda de dois prédios, um terreno, um título do clube Remo e os títulos do Instituto Ofir Loiola, todos localizados de Belém (PA), conforme consta das primeiras declarações feitas no inventário aberto na Comarca do Rio de Janeiro em 1963. Afirma ainda que o pedido para a partilha dos bens prescreveu em 1982, já que o Código Civil dá 20 anos para o ingresso de Ação de Petição de Herança.
Em segundo lugar, alega que a sentença não atenta à coisa julgada, pois a Justiça de São Paulo, considerou válida a transação que resultou na transferência por meio da integralização dos terrenos da Indústria Soares para a Ohio Holding. A decisão do TJ-SP foi dada em Ação Pauliana proposta pelos herdeiros Jorge, Armando, Angélica e Espólio de Eugenio Soares, que buscavam anulação do negócio e a partilha das ações da Industria Soares. “Além de ter ocorrido a prescrição, a negociação é válida porque foi feita por maiores e capazes, observando-se o efetivo pagamento de Ohio Holding para as Industrias Soares, no ato de sua retirada da sociedade”, disse Camila.
Ela alega também que parte da renda dos 70 apartamentos bloqueados vai direto para as contas pessoais dos herdeiros Armando e Gerson, representante do espólio de Jorge Teixeira, sem a devida prestação de contas. Os advogados defendem que o dinheiro, cerca de R$ 70 mil mensais, seja depositado em uma conta judicial.
A defesa diz também ter estranhado a forma de ressarcimento definida pela sentença tanto em relação ao arbitramento de honorários ao advogado Roberto Xerfan Junior como em relação às despesas alegadas pelo herdeiro Gerson. O advogado recebeu 12 imóveis em litígio e a juíza determinou a expedição de alvará de dois apartamentos que dois anos antes da sentença Gerson havia cedido por procuração pública a um advogado que o representa em uma ação criminal em Belém.
Para finalizar, contestam o sequestro de 17 unidades que caberiam ao Espólio de Barnabé Soares. A decisão foi dada na própria sentença do inventário por meio do instituto de sonegados. Segundo os advogados, isso deveria ter sido feito em ação própria.
A revista eltrônica Consultor Jurídico tentou contato com o advogado Roberto Xerfan, mas não obteve resposta até o fechamento desta reportagem.
Clique aqui para ler a sentença.
Clique aqui para ler a Ação Pauliana.
Nenhum comentário:
Postar um comentário