Todos nós sabemos que a corrupção pública é um câncer social em nosso país. Sozinho, esse monstro devora grande parte das nossas riquezas. A expectativa de nossa iminente ascensão à quinta economia do mundo, superando a França, não transformará o PIB brasileiro em pão, escola e saúde. Enquanto o setor privado se aperfeiçoa, produz e cresce, o que é tocado pela mão do governo vira patrimônio de poucos. A percentagem de devolução é mínima. Estamos sempre no vermelho. Devemos. Devemos. Devemos.
Mas hoje quero discutir o custo 2 da corrupção brasileira. Esse custo indireto tem a ver com uma série de prejuízos que nos advêm desse estado danoso. Comecemos pelo Poder Judiciário.
O custo processual comum no Brasil é elevado. Não tenho a pesquisa, mas, convivendo com a vida forense há duas décadas, posso falar um pouco. Para que a máquina judiciária de uma nação funcione a contento, muito se deve investir. Hierarquizada, tendo o juiz de primeiro grau na base de sua pirâmide, o Judiciário brasileiro tem no STF sua alta corte. Então, a corrupção pode tramitar até o juízo máximo. Isso é muito caro.
Qual o custo 2 da corrupção que se torna ré no Supremo? Muito dinheiro. Nós pagamos as verdadeiras custas. Instalações. Salários. Logística. Pagamos tudo, inclusive defensores públicos. A corrupção que nos roubou a vida inteira continua nos saqueando através desses atos oficiais necessários. O custo 2 da corrupção se chama custo processual.
Entrementes, enquanto a alta corte de Justiça gasta horrores para julgar situações pontuais, o País se ressente de julgamentos em sua base. Enquanto a ciência jurídica se torna a ciência da justificação dolosa na corte máxima, aqui em baixo o povo segue clamando por água e pão. Estrangulada, a máquina judiciária não consegue dar uma resposta rápida e satisfatória à população. Faltam juízes. Salários dignos. Servidores. Instalações. Mas não é só.
De repente, o Brasil se torna uma plateia forense. A Nação para diante da TV. Discursos otimistas tentam nos convencer de que é chegado o tempo da verdade. Um novo tempo. Um novo Brasil. Finalmente, a corrupção será banida. Então, enquanto os bate-bocas prosseguem na corte, o corrupcionômetro dispara: o custo 2 está ainda maior. Agora, estamos sendo corrompidos também quanto ao nosso tempo e imaginário. Deixamos de fazer uma série de coisas úteis à medida que, esperançosos, assistimos a julgamentos da corrupção. O custo 2 da corrupção se chama perda de tempo. Perda de vida.
A notícia do julgamento da corrupção é uma das mais caras do Brasil. Tecnologia de ponta. Milhares de páginas impressas (incluo esta). Revistas. Internet veloz. Um exército incontável de profissionais trabalha para nos dizer que o mal deixará de ser mal. Dinheiro. Muito dinheiro. Importantes projetos jornalísticos podem ser paralisados. O mundo parece caber dentro do Plenário do Supremo. Agora, o custo 2 da corrupção se chama menos informação para o povo.
Por fim, o custo 2 da corrupção atinge em cheio a nossa formação de cidadania. Crianças, jovens e adultos passam a ver que as coisas se resolvem por um julgamento ocasional. Perdemos a noção de povo e território. Desvia-se o foco da educação enquanto caminho de mudança. Não somos nós quem podemos mudar realidades. De repente, outros decidem a nossa vida. Cento e noventa milhões de pessoas parecem valer menos do que onze ministros. O custo 2 da corrupção alcança seu auge. Agora é um estado de falta de consciência política. Exatamente o combustível para eternizar o que não presta.
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RUI RAIOL é escritor
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