terça-feira, 24 de agosto de 2010

A mordaça também é azul. E tem bico. Bico de tucano.

A mordaça não é só vermelha.
A mordaça não é apenas imposta por alegados deveres impessoais, rotineiros.
Não.
A mordaça também é azul.
A mordaça também tem bico.
Tem bico de tucano.
Tem bico de PSDB.
Em seu blog, a jornalista Franssinete Florezano informa que, por determinação de liminar deferida por juíza auxiliar do Tribunal Regional Eleitoral (TRE), foi obrigada a excluir postagem que em que fazia comentários sobre sondagem interna do PT, informando que Simão Jatene (PSDB), candidato da Coligação Juntos com o Povo ao governo do Estado, estava em primeiro lugar na pesquisa feita para consumo interno do próprio PT, com dois pontos percentuais à frente da segundo colocada.
Na postagem, a jornalista deixava claro – claríssimo – que não se tratava de pesquisa oficial.
Quem ajuizou a representação?
A Coligação Juntos com o Povo, é claro.
Quem ajuizou a representação?
A coligação Juntos com o Povo, encabeçada pelo PSDB.
Quem ajuizou a representação?
A Coligação Juntos com o Povo, encabeçada pelo PSDB do ex-governador e aspirante a voltar ao cargo Simão Jatene.
Não satisfeita em pedir a exclusão das postagens, a coligação ainda pediu que seja aplicada à jornalista multa de R$ 106.410,00, o valor máximo previsto na lei eleitoral.
Céus!
R$ 106.410,00
De multa.
Multa à editora de um blog.
Doutor Jatene sabe que fizeram isso em nome dele?
Sabe que cercearam um blog para preservar a, digamos, densidade eleitoral dele?
Sabe que censuraram?
Sabe que preferiram a mordaça ao esclarecimento?
Doutor Jatene sabe que preferiram a mordaça ao bom-senso, à ponderação?
Sabe que poderiam ter pedido primeiramente um direito de resposta à jornalista, em vez de terem escolhido a via judicial para forçá-la a fazer o que certamente faria de bom grado, se lhe fosse solicitado um espaço para uma ponderação de qualquer natureza?
Doutor Jatene seria, sinceramente, capaz de negar que, se a sondagem publicada pela jornalista lhe fosse amplamente favorável, sua coligação não a acionaria judicialmente, ainda que publicação de pesquisa não registrada contrarie a lei?
Doutor Jatene, o professor universitário, portanto acostumado, supõe-se, à contraposição de idéias tão comum nas academias, ele sabe, o doutor, que uma censura assim contraria absoluta e frontalmente a imagem que todos fazemos de um professor com o seu perfil e, ainda por cima, de um político de longa trajetória na vida pública?
Doutor Jatene, cujo discurso no horário eleitoral tenta convencer o distinto público de que pretende voltar ao governo para consertar tudo de errado, de equivocado, de autoritário, de omisso que “aí está”, ele sabe, o doutor Jatene, que essa censura o coloca exatamente ao lado, exatamente em concordância com tudo de errado, de equivocado, de autoritário, de omisso que “aí está”?
Doutor Jatene, por seus assessores, poderá alegar que não tem nada a ver com isso.
Poderá alegar que isso, como se diz, “é com o Jurídico”.
Mas, se vier a apresentação tal alegação, convém lembrá-lo que “o Jurídico” é de sua campanha.
Está sob seu comando.
Está sob sua tutela.
Está sob sua batuta.
Ou não?
O professor já foi governador.
Conhece muito bem tudo sobre hierarquia.
Sabe, inclusive, que o difícil, como se diz, não é um secretário cumprir uma ordem do governador.
O difícil é fazer a ordem chegar ao guarda do quarteirão.
Pois é.
Doutor Jatene precisa logo descobrir quem é o guarda de quarteirão de sua campanha, sentar com ele, passar a mão na viola, tocar uma duas ou três e depois, maviosamente, combinar com o guarda algumas ações.
Maviosamente, Jatene precisa concertar – com “c” mesmo, não esqueçam – algumas jogadas eleitorais. No melhor sentido do termo “jogadas”, é claro.
Convém conversar com o guarda do quarteirão, com o Jurídico, com os marqueteiros, enfim, com todo mundo, para avaliar se a propositura de uma representação como essa justifica o enorme desgaste político-eleitoral dele corrente.
Porque a verdade é uma só: princípios não devem ter cor.
Não devem ter ideologia.
Nem preferência partidária.
Nem sexo.
Nem crença.
Nada.
Princípios devem ser apenas isto: princípios.
Pronto.
O princípio que nos manda respeitar a vida tem cor?
Tem ideologia?
Tem sexo? Haverá algum princípio propondo que se respeite apenas a vida de uma mulher ou apenas a vida de um homem?
Claro que não.
Assim com o princípio da liberdade de expressão, da liberdade de informação.
Devemos lutar por ele, independentemente de vermelhos, de azuis, de petistas e tucanos.
Independentemente da governadora Ana Júlia, cuja coligação foi à Justiça contra a Rádio Tabajara, independentemente da Coligação Juntos com o Povo, que apoia o tucano Simão Jatene e agora investe contra o blog da jornalista Franssinete Florenzano.
Fora de brincadeira.
De toda brincadeira.
Mas dá vontade de ir pra Pasárgada.
Lá, pelo menos, somos amigos do rei.
Ah, sim.
E se o rei de Pasárgada for paraense?
E se for um tucano paraense?
Ou um petista paraense?
Hein?

8 comentários:

  1. Pelo amor de Deus! Pra quê tanto lero-lero para defender uma ilegalidade? A Franssinete sabe, os blogueiros sabem, todo mundo sabe que é proibido divulgar pesquisas fajutas sem que estejam registradas no TRE. Então, é justa a punição e a multa aplicada.

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  2. Bemerguy, bemerguy,

    Por que gastar tanta digitação pra defender uma "sondagem" pra lá de suspeita num blog de uma editora de um jornal que é bancado por um único anúncio de página inteira: o do governo do estado. Por essas e outras que... deixa pra lá

    André Ribeiro

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  3. É vedado publicar pesquisa eleitoral não registrada.

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  4. Escrevem o que querem e depois acham que não estão sujeitos às leis.

    Não existem direitos absolutos.

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  5. Muito obrigada, Paulo. Enquanto a imprensa é amordaçada, os marqueteiros sem ética manipulam dados à vontade, criam um mundo paralelo ao gosto do patrão. E isso a lei eleitoral permite, não é?

    Tive o zelo e o cuidado de explicar aos leitores que não se tratava de pesquisa oficial, que fora encomendada pelo PT para consumo interno, e publiquei 18 comentários de militantes jatenistas apregoando, no mesmo post, percentuais altíssimos para ele.

    Onde está a ilegalidade? Cadê o prejuízo eleitoral?

    Não podemos permitir que as liberdades democráticas sejam suprimidas ao sabor dos interesses políticos.

    A Rádio Tabajara também sofre censura odiosa. Precisamos nos unir e lutar contra isso.

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  6. o descumprimento da Lei tem um preço

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  7. Caríssimo Paulo,

    Daqui de Pasárgada, Marituba, cujo rei não é tucano ou petista, mas plebeu e paraense, oriundo do Xingu, não podia deixar de solidarizar-me com a Franssinete.

    Tinha que ser um texto no mínimo inteligente.

    Não deu.

    O que escreveste foi brilhante. Definitivo.

    Nessas horas nos socorremos de aforismos. Frases feitas por outros, quase sempre eivadas de meias-verdades.

    Neste caso, de tucanos e petistas, por puro cacoete só consegui lembrar-me de Marx:

    “Estes são meus princípios, mas se quiser, tenho outros”.

    Em tempo: este Marx é o Groucho.

    andré costa nunes

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  8. Ninguém se escusa cumprir a lei, argumentado que não a conhece.

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