segunda-feira, 1 de setembro de 2008

A Justiça Federal nos 20 anos de Constituição



No próximo mês de outubro, a Constituição Federal de 1988 completa 20 anos de idade. A data merece comemoração, em face de Texto Constitucional que, não obstante as críticas concernentes, entre outros aspectos, ao número de emendas sofridas, remanesce obra de perfil predominantemente democrático, social e humanitário.
O aniversário, além de ensejar referida comemoração, traz à baila reflexão acerca do relevante papel exercido pela Justiça Federal do Brasil na consolidação e efetivação do Texto Magno, ao longo dessas duas décadas de vigência.
Na análise histórica dos debates constituintes de 1988, é possível notar a existência de cogitação acerca extinção da Justiça Federal. Diziam os defensores de tal idéia que não teria sentido a sua manutenção em um regime democrático, fazendo alusão e vinculação da referida tese ao período de ressurgimento do Judiciário Federal, ocorrido em 1967, no início do regime militar. No entanto, ao invés de acolher a proposta de extinção do Poder Judiciário Federal, o Constituinte Originário de 1988 optou, oportunamente, por adotar caminho oposto, fortalecendo a Justiça Federal, ampliando a sua competência e dando-lhe uma melhor estrutura.
A partir de então, a Justiça Federal brasileira consolidou sua posição de destaque dentro do quadro institucional pátrio, situação possibilitada pela revogação de medidas de exceção que reduziam a independência da magistratura e proibiam os juízes de se pronunciarem sobre os assuntos políticos sociais mais delicados. Além disso, foi dada uma maior autonomia financeiro-orçamentária ao Judiciário, o que fortaleceu a sua independência.
Com as garantias restabelecidas e com a sua competência ampliada, a Justiça Federal pôde ratificar e consolidar sua vocação de independência e corresponder às melhores expectativas dos que acreditavam que o caráter técnico do Judiciário Federal se sobreporia às previsões daqueles que haviam artificialmente atrelado a sua existência a uma origem no regime de exceção, passando a sua história, ao revés, a se confundir com a história das lutas dos cidadãos diante dos arbítrios cometidos pelo poder público federal e contra a violação de direitos fundamentais, mostrando o acerto da opção realizada pelo Constituinte de 1988.
De fato, ao longo desses 20 anos, a Justiça Federal brasileira foi capaz de consolidar o seu papel de instância de controle da legalidade dos atos da administração pública federal, dando, na prática, concretude à arquitetura abstrata do princípio de freios e contrapesos, check and balance, conceito teórico fundamental que se encontra na base da teoria da tripartição funcional do Estado, consistente, basicamente, "no Poder contendo o Poder."
É nos desdobramentos do exercício desse papel que os juízes federais, espraiados por todo o território nacional, exercem protagonismo elevado, atuando, inclusive, na concretização de políticas públicas ligadas à realização de direitos fundamentais.
Tal atuação, não obstante as resistências que suscite, longe de configurar intromissão indevida de um poder em outro, resulta, justamente, da harmonia e independência que entre eles se deve preservar, daí decorrendo que uns e outros não devem se afastar, exigindo-se, ao contrário, um certo coeficiente de atrito salutar, capaz de, democraticamente, explorar diferentes visões de mundo, expressar a contradição que há entre projetos e concepções acerca do Estado e da sociedade.
Os atritos gerados por esse ativismo judicial, portanto, longe de representarem uma anomalia, uma falha na democracia, são prova da vitalidade do regime democrático, para cuja manutenção o Poder Judiciário Federal tem exercido papel de sumo destaque.
A Justiça Federal, ademais, representa derivação e instrumento de manutenção de uma das cláusulas pétreas da nossa Constituição, prevista no art. 60, § 4º, que é a forma federativa de Estado, pedra de toque do sistema constitucional posto, garantindo a existência de dualidade de jurisdições dentro de uma unicidade do Poder Judiciário nacional.
Desse modo, na celebração dos 20 anos da Constituição Federal de 1988, se insere, de forma destacada, o reconhecimento do papel de relevo exercido pelo Poder Judiciário Federal, traduzido, entre outros aspectos, na sua contribuição para efetivação de direitos fundamentais, na preservação do desiderato constitucional de manutenção de equilíbrio e harmonia entre os poderes e no exercício da função de instrumento de preservação da forma federativa de Estado, todos princípios basilares do Estado Democrático de Direito, abraçados pelo Texto Constitucional de 1988 que ora se celebra.

Arthur Pinheiro Chaves é juiz federal substituto da 1ª Vara da Seção Judiciária do Pará

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