segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

O resto podre da Mangueira não é qualquer resto

Artistas de um modo geral deveriam pensar muito antes de emitir certas opiniões. Porque eles também são formadores de opinião. E muito do que dizem, pensam e fazem pode servir de bússola para orientar os desavisados, que por serem desavisados podem muito bem virar seu leme para portos inseguros.
A cantora Alcione, por exemplo, tirou por menos, tirou por quase nada o fato de a Mangueira, uma das atrações do primeiro dia de desfiles da Sapucaí, na madrugada desta segunda-feira, no Rio, estar enfrentando um de seus mais turbulentos carnavais.
Primeiro, a agremiação foi muito criticada por não escolher um enredo homenageando o compositor Cartola, que faria 100 anos em 2008. Depois, vieram as notícias relacionando a escola ao tráfico de drogas no Morro da Mangueira.
A presidente da escola de samba Mangueira, Chininha, e o ex-diretor de bateria, Ivo Meirelles, chegaram a ser intimados a prestar depoimento no dia 16 na 17ª DP, para explicar uma suposta passagem secreta na quadra da escola que seria utilizada por traficantes de drogas na região. E o mesmo Meirelles, além disso, é alvo de um processo por difamação aberto contra ele por Viviane Araújo, ex do cantor Belo, que teria sido chamada pelo carnavalesco de “garota de programa”.
Além disso, ganhou repercussão a notícia de que o traficante Fernandinho Beira-Mar tem relações estreitas com o ex-presidente da Mangueira, Percival Pires, um dos convidados da festa de casamento do criminoso.
O que diz Alcione de tudo isso? Diz assim: “A Mangueira está acima do bem e do mal. O que importa é o samba. O resto é o resto.”
Mas o problema é que o resto não é qualquer resto. Envolve suspeitas de crimes bem mais pesados do que aqueles que escancaradamente sempre envolveram as escolas de samba com o jogo do bicho no Rio.
Está certo que Alcione pretendeu distinguir a instituição Mangueira dos homens que a dirigem. Mas a instituição não é sobrenatural. Não tem vida própria, desvinculada das contingências terrenas. É formada por gente de carne-e-osso. A Mangueira é reflexo também daqueles que a dirigem (vejam, na versão paroara, o exemplo de Remo e Paysandu). E são esses dirigentes que produzem o “resto” a que se referiu a cantora.

Um resto podre, vale dizer. Tão podre que renderia, quem sabe, até um samba.

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