quarta-feira, 26 de dezembro de 2007

O Poder Público não deve ajudar Remo e Paysandu

A Prefeitura de Belém desembolsou R$ 100 mil para que Remo e Paysandu se enfrentasem no último domingo, no Mangueirão, numa programação que se denominou de "Ama Belém". Cada um dos clubes levou R$ 50 mil.
Fez mal a prefeitura. Fez muito mal.
Em seu site, o governo municipal explica que o objetivo da programação esportiva, que envolveu outras agremiações, foi "proporcionar um Natal mais digno e feliz para as crianças carentes que participam dos projetos sociais da Prefeitura de Belém". Está lá uma declaração do prefeito Duciomar Costa: "Queremos despertar o sentimento de solidariedade e fazer com que torcedores mais carentes tenham a oportunidade de ver uma partida de futebol, principalmente um clássico entre Remo e Paysandu. Com o Torneio Ama Belém, além do gesto de solidariedade com os mais carentes, a prefeitura prestigia os clubes da capital", afirmou.
Depois de ler o prefeito é que se deve repetir com mais ênfase ainda: fez mal a prefeitura. Fez muito mal.
É preciso dizer com todas as letras o que a Imprensa esportiva do Pará - não toda, mas boa parte - se recusa a dizer: não se deve despender dinheiro público para ajudar clubes em petição de miséria, como Remo e Paysandu. Aliás, muitos jornalistas não apenas se recusam a dizer isso como, ao contrário, ainda estimulam essa balela, essa idiotice de que os dois clubes devem receber ajuda em dinheiro do Poder Público. Não devem. É claro que não.
Não se deve usar dinheiro público para premiar a incompetência de administrações que levaram Remo e Paysando ao estágio em que se encontram.
Não se deve usar dinheiro público para minimizar os efeitos deletérios, perniciosos, letais de práticas amadoristas - para dizer o mínimo - na direção dos dois grandes clubes de futebol do Pará.
Não se deve usar recursos públicos para socorrer agremiações que sempre tiveram conselhos deliberativo e fiscal omissos, ausentes, incapazes de exercer controles que lhes são claramente atribuídos no regramento interno dos clubes.
Não se deve deve usar dinheiro público para ajudar dois clubes que chegaram à Terceira Divisão por (de)méritos próprios. E por méritos próprios devem soerguer-se sozinhos, não com a bengala de governos quaisquer que sejam.
Não tem graça a população pobre de Belém padecer nos postos de saúde do município - onde este ano, aliás, já morreu uma criança -, enquanto Remo e Paysandu recebem de mão beijada R$ 50 mil cada um. Para fazerem o quê com esse dinheiro? Para fazerem o quê, se os dois devem milhões de reais e uma semana sim, outra também estão com seus bens penhorados?
Bem recentemente, há cerca de dois meses, se tanto, o presidente do Remo, Raimundo Ribeiro, deu uma entrevista, num domingo, ao programa "Bola na Área", de José Maria Trindade, na Liberal AM. Lá pelas tantas, Ribeiro disse mais ou menos isto, não exatamente com estas palavras, mas com este sentido: "Agora, ficam a cobrar dos dirigentes que devem fazer planejamento. Mas como planejar, se não há dinheiro?" Se o repórter da emissora guarda as gravações que faz, poderá recuperar facilmente as declarações de Ribeiro para comprovar o que aqui se afirma.
Sim, presidente. Justamente porque não há dinheiro é que Remo x Paysandu devem se planejar. Justamente porque vivem à míngua, fazendo contratações esdrúxulas e assumindo obrigações que não podem assumir, é que precisam racionalizar seus gastos. Justamente porque não conseguem sobreviver sem a renda das bilheterias, sempre minguantes, é que precisam gerir com racionalidade e inteligência suas receitas e suas despesas.
Mas concepções como essas esboçadas pelo presidente do Remo acabam distinguidas inadmissivelmente por iniciativas como essa da prefeitura e com uma forcinha de alguns jornalistas que, deploravelmente, embarcam nessa conversa fiada de dirigentes cheios de amor pelos clubes que dirigem, mas faltos de iniciativas consistentes para devolver Remo e Paysandu ao patamar em que merecem ficar.
É preciso acabar com essa benemerência fajuta. Remo e Paysandu sabem perfeitamente o caminho que fizeram para chegar ao poço em que se encontram. É justo imaginar, portanto, que saibam o caminho de volta: é só fazer o contrário de tudo o que foi feito até agora.
E a Prefeitura de Belém, certamente, saberá encontrar muitas outras formas de fazer a alegria de crianças carentes. E deverá encontrar razões mais justificáveis - que não faltam, aliás - para usar o dinheiro público. Que por ser público não é dela, prefeitura. É nosso.
Aliás, no último domingo, estima-se que 10 mil pessoas - um pouco mais, um pouco menos - estiveram no Mangueirão para fazer os dois clubes de maior torcidade do Estado.
É a prova de que esse tipo de benemerência sai caro, muito caro. Inclusive politicamente.

Um comentário:

  1. Corretíssima a análise do blog. O poder público tem mais o que fazer do que ficar jogando dinheiro, que é do povo, no bolso desses dirigentes irresponsáveis que acabam com as finanças dos clubes, esculhambam os esportes em todos os sentidos, principalmente o futebol, e deixam o pobre do torcedor sem, ao menos, uma alegria que alivia, e muito, os probelmas que a grande maioria enfrenta no seu dia-a-dia.

    Antonio Fernando

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