Helder, o vencido, entre líderes dos professores e dos indígenas, os vencedores. Isso é a política! (Foto: Marco Santos / Agência Pará) |
Em seis anos de mandato, o governador Helder Barbalho chega ao fim da primeira e única grande crise política de sua gestão, que acabou por apontar um, e apenas um, perdedor: o governador Helder Barbalho.
Helder perdeu a queda de braço com indígenas de várias etnias - há 24 dias ocupando pacificamente as instalações da Secretaria de Estado de Educação (Seduc) - e professores estaduais - em greve desde o dia 23 de janeiro passado - ao ser forçado a fazer exatamente o que os indígenas, primeiro eles, e depois os docentes exigiam: a revogação, simplesmente a revogação, da Lei nº 10.820/2024, votada no apagar das luzes do ano passado e aprovada, sem tugir nem mugir, praticamente à unanimidade, por uma Assembleia Legislativa dócil, submissa, subjugada e reverente ao Executivo.
Deputados: de submissos a heróis
O mais curioso, para não dizer quase surreal, é que vários deputados, agora saudados em vários nichos, com todas as letras, com todos os adjetivos, como hábeis e empoderados articuladores que tiveram participação ativa na construção - como mudernamente se tem dito - de um acordo que deve encerrar as manifestações, pois esses deputados são os mesmos que, dóceis, submissos, subjugados e reverentes, solenemente curvaram o espinhaço e disseram, "sim, senhor", quando aprovaram a mencionada lei sob o aconchego e o conforto do ambiente parlamentar. Isso tudo enquanto, do lado de fora, professores estaduais, até então sem o apoio de lideranças indígenas, enfrentavam policiais militares que usavam spray de pimenta à farta, numa batalha campal travada nas imediações da Alepa.
Mas tudo é política, não tenhamos dúvida. E a política, também sem quaisquer dúvidas, funciona à perfeição para moldar linguagens que, mais do que esconderem, subvertem (em algumas situações, pervertem e degradam) a realidade.
Por isso é que, antes mesmo de construir-se o acordo - pelo qual o governo Helder Barbalho enviará mensagem à Alepa propondo nova lei, que revogará a 10.820/2024 -, tanto já estavam falando por aí que, pelo bem de todos, da felicidade geral da Nação, dos povos indígenas e dos professores estaduais, não haveria vencedores nem vencidos nessa contenda política que, presume-se, vai se encaminhando para um final felicíssimo.
Balela! Mas é evidente, e ponham evidente nisso, que há vencedores, os indígenas e os professores, e vencido, o governo Helder Barbalho. Helder perdeu para si mesmo.
Perdeu para a certeza de que, se conseguiu domar em alto estilo o establishment paraense, aí incluídos, por óbvio, vários segmentos institucionais de poder, poderia domar os indígenas que ocupam a Seduc há quase um mês.
Perdeu para sua inabilidade política de não se dispor a construir uma solução quando os ânimos dos manifestantes ainda não estavam tão acirrados.
Perdeu para sua imprudência de apostar que uma irresignação, digamos assim, paroquial ficaria cinscunscrita aos quadrantes paroquais do Pará.
Perdeu para sua demora em perceber que a demora em encontrar uma solução para as demandas de indígenas e professores naturalmente faria a crise extrapolar para além das divisas do Estado.
Perdeu porque não previu que os indígenas, com talento e habilidade, seriam capazes de usar redes sociais para vincular seus protestos à COP30 que vem por aí, com isso alavancando engajamentos midiáticos em todo o País, e assim deixando nas cordas o próprio Helder, que, sem dúvidas, utiliza muito bem as redes sociais.
Cadê Rossieli?
Os mais renitentes em render-se às evidências de que o governo Helder Barbalho perdeu, e perdeu clamorosamente, haverão de dizer que, se o "revoga, revoga, revoga" foi atendido, por outro lado não foi atendida - ainda não, vale dizer - a outra palavra de ordem de indígenas e professores, o "fora, Rossieli", menção ao exigido afastamento do secretário de Educação, Rossieli Soares.
A exoneração do secretário, formalmente, não faz parte do acordo, porque não mencionada no termo de compromisso assinado nesta quarta-feira (05). Mas, na prática, Rossieli, daqui para a frente, é uma figura impalpável, imperceptível, indistinguível pela visão, pelo tato ou pelo olfato. Ninguém sabe onde ele está, o que faz, como faz e quando faz.
Em vez de "fora, Rossieli", indígenas e professores poderiam, de forma pertinente, perguntar por aí: "cadê Rossieli?". Porque ninguém sabe onde Rossieli está. Desde que, de corpo presente, levou um ralho em regra de indígenas durante uma reunião na Seduc, Rossieli não aparece mais. Sumiu, literalmente. Se não foi exonerado de suas funções, foi demitido, foi ejetado dos espaços públicos. A impressão é de que não põe a cara na janela nem pra ver se vem chuva. E como, neste período, chove em Belém o dia todo e todo dia, o doutor tem que ficar mesmo recluso, mesmo que não saibamos onde está sendo sua reclusão.
E agora? Agora é hora de vencedores e vencidos aprenderem a lição de que, neste mundo fluido, pantanoso, implausível, imprevisível, enganoso e tortuoso da política, vencedores e vencidos nunca podem dormir em berço esplêndido, porque os vencedores de hoje podem ser os vencidos de amanhã. E vice-versa.
É a política, gente. Isso é a política!
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