quinta-feira, 14 de julho de 2022

O psicopata é aquele cara "normal". Que pode estar bem ao seu lado.

Giovanni Bezerra: o monstro que muitos viam como "normal"

A literatura sobre a II Guerra - que eu particulamente aprecio - é vasta em obras que fornecem impressões, depoimentos, testemunhos e percepções de pessoas que privaram da intimidade de oficiais que integraram o topo da hierarquia nazista.
Esses relatos são tão impressionantes quanto inacreditáveis, porque mostram a candura, a delicadeza, a educação, a civilidade e outros nobres atributos de homens que, como capatazes diretos de Hitler, foram direta e pessoalmente responsáveis por atrocidades inimagináveis.
Li em vários livros, por exemplo, relatos em que comandantes dos campos de concentração, residindo perto, bem perto, dos galpões em que milhares de judeus eram mortos por asfixia, terminavam seu expediente de matança e iam para a casa, onde dedicavam-se a hobbies como cultivar jardins bem floridos e extasiavam-se, depois do jantar, em ouvir músicas clássicas, antes de recolherem-se ao leito para sonhar com lindas paragens. Isso tudo, repita-se, depois de comandarem a matança de milhares de seres humanos.
Um desses livros, cuja leitura eu recomendo, é Até o Fim. Nele, Traudl Junge, ninguém menos que secretária pessoal de Hitler, mostra o Führer como um homem sensível, terno, educado, atencioso. Um Hitler inacessível ao imaginário que o tem como o arquiteto, entre outras coisas, do holocausto que matou 6 milhões de judeus.
A prisão desse monstro travestido de médico, Giovanni Bezerra, flagrado em filmagens estuprando mulheres logo após darem à luz em partos cesareanos, é desses casos que nos levam facilmente, mas também aterrorizadamente, a concluir que o psicopata, muitas vezes, é aquela pessoa "normal", que pode estar bem ao seu lado - na academia, no apartamento vizinho ao seu, no bar que você frequenta, na arquibancada do estádio etc.
Matéria publicada em O Globo desta quarta-feira (13) mostra, por exemplo, que Bezerra é filho de pais separados - ele, inclusive, também um médico com 41 anos de carreira e dono de uma clínica de ginecologia -, reside em confortável apartamento num condomínio da Barra, no Rio, e frequentava regularmente a academia, acompanhado de um personal.
- Todos ficaram chocados. A gente via o Giovanni diariamente. É bem estranho pensar no que ele fez aquilo. Ele parecia normal - diz uma das pessoas que o conheciam na academia.
- Ele era rico, tinha condição boa e uma namorada linda. Ele tinha tudo, não dá para entender - comentou outra pessoa ouvida pelo jornal.
Pois é.
O psicopata é sempre aquele cara "normal".
Que pode estar ao seu lado.

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