sexta-feira, 18 de fevereiro de 2022

A história é uma farsa. E aos olhos da pós-verdade, cada um constrói sua própria versão da história.


Leio no Portal Uruá-Tapera artigo assinado por jovem estudante do Colégio CEI, que se diz apaixonado por literatura, cinema e política.
Chama-se João Paulo Duarte Marques da Cruz.
No artigo, intitulado A história é uma farsa, sustenta o autor que vivenciamos um contexto em que as verdades, os fatos, as evidências são o que menos importam; ou melhor, que nada disso importa. Importa mesmo o que "é conveniente aos olhos" de cada um.
Em outras palavras, é a tal da pós-verdade, não é? A pós-verdade que eu sempre traduzo assim: A verdade não existe; a minha verdade, essa sim, existe. E ninguém mexa com ela.
Reproduzo aqui no blog a abordagem de João Paulo por duas razões.
Primeiro, porque o tema abordado é extremamente atual, neste cenário em que muitos jovens, como esse energúmeno Monark e milhares de outros, nutrem-se da mais tenebrosa alienação e vão para as redes sociais externar suas verdades imutáveis e intocáveis, que incluem, por exemplo, negar o holocausto, pregar o negacionismo, defender o terraplanismo ou escolher entre ditaduras do bem e ditaduras do mal.
Segundo, porque é muito alentador vermos um jovem interessar-se por esses temas e externar suas opiniões de forma serena, ponderada e fundamentada, sem que tais opiniões, evidentemente, sejam defintivas. Porque nenhuma opinião é. A não ser para os aderentes à pós-verdade.
Abaixo, a íntegra do artigo de João Paulo.

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“Se a gente matar um monte de judeu e se apropriar do poder econômico dos judeus, o Brasil enriquece. Foi isso que aconteceu com a Alemanha pós-guerra!”, atalha o jornalista José Carlos Bernardi na Jovem Pan, em face da notícia de que o ex-presidente Lula fora aplaudido após discurso a Parlamentares Europeus. Allan dos Santos, blogueiro bolsonarista e entusiasta antivacina, disse que “omitir o uso da cloroquina é o mesmo que deixar judeus na dúvida entre chuveiro e câmara de gás”.

Para o atual Deputado Federal e filho do atual Presidente da República, Eduardo Bolsonaro, ações que vieram a tirar o então Presidente da República, João Goulart, do poder ocorreram por conta do Congresso e, ademais, com o amplo apoio popular; não caracterizando, então, um golpe. Segundo o ex-presidente da república, Luiz Inácio Lula da Silva, o ditador Daniel Ortega é comparável à chanceler alemã Angela Merkel; afinal, “por que que a Angela Merkel pode ficar 16 anos no poder e Daniel Ortega não?”. E a lista continua.

Trinta e sete anos após a Ditadura Militar – símbolo, em tese, de repressão, perseguição, histórica e cultural, e de censura -, no instante presente, grande parte do que hoje compreendemos como Ocidente vivencia a leviandade dos fatos que ocorreram; não apenas no Brasil, é claro; todo o Ocidente, contudo, vivencia a leviandade de quaisquer verdades em troca do que é conveniente aos olhos.

Diz o senso comum de que o que os olhos não veem, o coração não sente. Mas será mesmo? A prisão, em escala, de presos políticos nas respectivas ditaduras citadas, além de outras minorias, foi afastada do debate político e público pelos dois pólos majoritários do Brasil. Em suas práticas e técnicas, o mal está nos outros, não tendo espaço, portanto, para o reconhecimentos de seus próprios erros. Em suas práticas e técnicas, o inferno são os outros.

Derek Thompson, autor de “Hitmakers: Como nascem as tendências“, explicou os termos “neofílicos” e “neofóbicos”. Para o escritor, somos, mutuamente, neofílicos e neofóbicos; ou seja, gostamos do que é novidade, novo; mas precisamos também daquilo que é familiar. As ideologias polarizantes do Brasil parecem ter estudado sobre isso quando o assunto trata-se de “fake news histórica“. Em dado momento, pensa-se que todos já conhecem o tão comentado termo “fake news“; entretanto, o que hoje se experimenta é um método ainda mais eficaz utilizado pelos negacionistas históricos. Perceba a estrutura: leva-se até o debate um fato que todos conhecem, – e que, na maioria das vezes, é verídico -, que seja, o Holocausto; e, após todos de imediato já entenderem do que se trata, puxa-se para a conversa um fato não tão conhecido assim, como a situacao economica alemã no pos-guerra, por exemplo; desse jeito, de pouquinho em pouquinho, pode-se falar o que bem entender-se, por mais ridículo ou até criminoso que seja, sobre o segundo fato que ainda será visto como certeiro; em casos extremos, genial.

Ainda sobre livros, George Orwell abrange, mais uma vez, em seu livro “1984“, o grande tema das distopias: a liberdade. O protagonista é um homem chamado Winston Smith, o qual trabalha em um ministério do governo, onde este edita reportagens de jornais antigos, alterando os fatos para que o passado esteja de acordo com as convicções do governo. Toca, portanto, Orwell em uma grande ferida da sociedade: Ainda há de se ter liberdade se a verdade histórica nos é privada?

Trinta e sete anos depois, ainda há quem veja o golpe militar como uma resposta do povo e uma resistência ao comunismo. Trinta e sete anos depois, ainda há quem veja, ignorando também todas as ditaduras precedentes, equivalência possível entre um ditador que prende opositores políticos e uma defensora ferrenha da democracia. A eles, deve-se pôr no braço a vacina da verdade; a eles, deve-se lembrar que a história nunca será reescrita.

Um comentário:

  1. Pois muito bem. Parabéns ao jovem redator. Fico feliz em ler um texto de jovem estudante, haja vista que são poucos que o fazem. Todos "brigam" para ter acesso à internet, mas o que veem lá? Sites com boas informações? Um bom jornal ou revista? Ou se conectam somente em suas redes de WhatsApp, Facebook, ou Instagram e ficam jogando conversa fora, lendo as fake news diárias e as fofocas dos BBBs?

    Infelizmente a última hipótese é a realidade. Não vemos mais os jovens lendo bons livros(no geral não leem nenhum). É só o celular apitar, e lá estão todos(jovens e adultos) espiando a última fofoca da Jojô Achocolatada, se o ex-BBB 17 transou com a ex-BBB 11, etc, etc.

    Numa rápida incursão ao Google, pesquei alguns personagens e seus seguidores : Tirulipa - 11 milhões, Natasha Orana - 700 mil seguidores(não sabe quem é ela? ex-bailarina do Faustão); Ronaldo Gaúcho(o que foi preso no Paraguai) - 51 milhões de seguidores, GKay - 11 milhões.....e por aí vamos.

    Não há como impedir o emburrecimento da nossa população , quando vemos os milhares de seguidores que pessoas burras, sem preparo, mal intencionadas e estúpidas tem.

    As(os) tais de "influencers digitais" são uma verdadeira piada. Tem uma que até peido engarrafado vende. Vejam quantos seguidores ela tem. É dose !!!

    Assim, o que precisa mesmo ser estudado, é o porque imbecis e estúpidos feito o Monark se tornaram vozes influentes, sem nenhum preparo intelectual e com milhares de seguidores.

    E encerro aqui com parte da linda musiquinha "Caneta Azul, Azul Caneta", que fez enorme sucesso há alguns anos, "quebrando a internet" como os influencers gostam de falar :

    Caneta azul, azul caneta
    Caneta azul tá marcada com minha letra
    Caneta azul, azul caneta
    Caneta azul tá marcada com minha letra

    Todo dia eu viajo pra o colégio
    Com uma caneta azul e uma caneta amarela
    Eu perdi minha caneta e eu peço, por favor
    Quem encontrou, me entrega ela



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